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Wladmir Pinheiro
Publicado em 4 de dezembro de 2013 às 07:50
- Atualizado há 2 anos
Na pequena região da Múrcia, na Espanha, a chuva costuma dar mais trabalho de cair do que em todo Sertão baiano. Apesar disso, a região de solo seco e água salgada é conhecida como a horta da Europa. Graças a um eficiente sistema de gestão hídrica, Múrcia é referência em uso sustentável de água e na agricultura intensiva. A região produz 20% de todas as hortaliças e frutas exportadas pela Espanha.>
A produção é realmente fértil. A província produz 1,8% de tudo o que é exportado em alimentos no mundo todo, o equivalente a três vezes o que o Brasil exporta de frutas e hortaliças. O lucro da província espanhola em 2012 foi de 3,5 bilhões de euros. Tanta fartura em uma área que é metade do tamanho de Sergipe.>
“Venho de uma região que tem um problema grave de escassez de água, assim como no Semiárido brasileiro. Mas estamos em um momento chave da produção de alimentos, em que a estimativa é que o consumo aumente 60% até 2050, mas as áreas cultivadas não vão aumentar mais para acompanhar esse ritmo. Como deixar nossa produção mais eficiente?”, questionou Antonio Alarcón, consultor internacional em Tecnologia Agrícola e Manejo Intensivo, durante a abertura da última edição do Fórum Agenda Bahia, que discutiu soluções para o desenvolvimento do Semiárido baiano. Alarcón, especialista em tecnologia agrícola, apresenta o caso da região de Múrcia, que produz mais frutas e hortaliças do que o Brasil inteiro Engenharia A solução que Múrcia encontrou há quase 50 anos não caiu do céu na forma de chuva. Em vez disso, uma grande obra de engenharia hídrica perfurou o solo e transpôs águas do Rio Tajo (que em Portugal se chama Rio Tejo), a cerca de 290 quilômetros da Múrcia, em mais de 2,5 milhões de quilômetros de tubulações.>
A transposição Tajo-Segura permitiu que o governo cobrasse pela água desviada do rio e levado em modernos sistemas de gotejamento, irrigação e tornasse a Múrcia um grande exportador de tecnologia em agricultura. O valor do metro cúbico de água é de 0,25 euros - quase R$ 1.>
“As pessoas que moram na cidade estão acostumadas a pagar pela água que consomem. Mas quem vive no campo é diferente. Porém, essa tecnologia não é só para grandes obras de infraestrutura, mas também para desenvolver os pequenos agricultores. Acho que é um momento das sociedades decidirem se implementarão soluções tecnológicas e assumirão o controle ou perderão esse trem que já está passando”, diz Alarcón.>
Cadastro Pelo sistema de distribuição de água da Múrcia, cada agricultor é cadastrado e tem sua produção avaliada para que seja decidido o tamanho da cota de água que poderá ter acesso. Mesmo pagando, há um limite estabelecido por uma equipe composta de engenheiros e técnicos para a quantidade de água.>
“É um sistema muito grande e por isso complexo. A água não está à disposição para qualquer uso. O agricultor não pode utilizar uma bomba para desviar a água que está sendo comercializada, senão ele pode ser preso. Cada metro cúbico de água só sai de acordo com a superfície e o tipo de produção”, explica Alarcón, que também é coordenador do Mestrado Internacional em Tecnologia de Cultivos de Alta Performance na Universidade Politécnica de Cartagena, na Espanha.>
Um grande centro de controle coordena o destino de cada gota de água que sai pelas tubulações do Tajo-Segura. O monitoramento Big Brother é defendido com orgulho pelo consultor que defende a eficiência na gestão hídrica como responsável pelo aumento da produtividade da região.>
Proveito “Com o planejamento, conseguimos tirar o máximo proveito dos recursos naturais, evitamos contaminações exageradas, já que é possível controlar até a distribuição de fertilizantes e controle de pragas, graças a uma rede interligada. Também ficamos menos reféns das chuvas. O clima é imprevisível no mundo todo, mas com esse sistema de irrigação não precisamos da chuva para ter uma boa produção”, diz Alarcón.>
Depois de controlar o regime de águas, Múrcia passou a lucrar exportando tecnologia. “A gestão eficiente envolve reconhecer isso como um modelo de negócio, é preciso investir em tecnologia já existente, além disso entender e adaptar as soluções às realidades econômicas de cada região”, explica Alarcón.>