Rituais em São Roque: fiéis celebram com missas e banhos de pipoca

Celebrações aconteceram dentro e fora da Igreja

  • Foto do(a) author(a) Luana Lisboa
  • Luana Lisboa

Publicado em 17 de agosto de 2021 às 07:00

- Atualizado há um ano

"Se tu queres ser perfeito, vá, vende tudo que tens e terá um tesouro no céu". O versículo bíblico foi um dos proferidos pelo bispo Dom Dorival Souza na Missa Solene da Igreja São Roque e São Lázaro nesta segunda (16) que marca a celebração do santo protetor contra doenças e pragas. Os devotos de São Roque que iam à igreja podiam, também, desfrutar do sincretismo que tomava o lado de fora: Omulu estaria presente.

Há 22 anos, a ialorixá Vera Alaíne passa o 16 de agosto nas portas da igreja, na Federação, para benzer todo e qualquer um que a solicite, seja em troca de 20 reais, seja em troca de um sorriso. Apesar de a pandemia ter dificultado o segundo agrado, a mãe de santo ainda realiza os rituais, que costumam envolver o famoso banho de endemorô (pipoca) e algumas folhas de arruda.

A planta medicinal é conhecida por possuir propriedades cicatrizantes e, combinadas com a pipoca, usada nas oferendas para o orixá Obaluayê com o objetivo de purificação, põem fim às energias negativas e ajudam na cura de doenças do corpo - propriedade também do santo padroeiro dos enfermos. Além dessas, a benção com água de cheiro e pó de pemba atraem simpatias e evitam inimigos."O pessoal me paga com o que quiser e, se não tiver, não paga", diz a ialorixá.O dinheiro arrecadado vai para a Olubajé, festa realizada em homenagem a Omulu nos terreiros de candomblé, no dia 26 de agosto. Omulu, por sua vez, é a quem os devotos do candomblé evocam em tempos difíceis, o responsável pela cura das doenças infectuosas.

Vera Alaíne realizava o ritual em Bruno Nascimento enquanto explicava. Bruno levou toda a família para a ocasião, mas não chegou a assistir a missa. Aproveitou para estender a tarde em um dos bares da região. "Prosperidade, um banho de folha, marcar presença e estar na festa. Todo ano venho com minha esposa e minha filha e esse ano não seria diferente. Venho para espantar o olho gordo, as maldades e, nesse ano, esse vírus maldito, para que não atinjam nossa família", afirma.

Já Aidil Rabelo, 72, chegou à Estrada de São Lázaro, na Rua Aristides Novis, e logo se dirigiu à fila de entrada da missa, que arrodeava a igreja. A soteropolitana costuma ir ao município de Cachoeira para a festa de São Roque, mas, devido à pandemia, ficou na capital. "Estou com alguns problemas de saúde, então o dia de hoje é especialmente importante para vir à missa".

De acordo com o padre Casimiro Malolespszy, também presente na ocasião, a festa remete a um santo que doou parte de sua vida para a ajuda dos necessitados, pobres e doentes, durante o século XIII. Por isso, o dia foi de inspiração às atitudes dele. "Estamos vivendo uma realidade muito ruim: além dos mais de 570 mil mortos, muitos estão desempregados, com famílias desestruturadas, em luto. Quem vem aqui, se inspira nessa atitude de se doar, reconhecer que é necessário praticar a solidariedade".

Quanto ao sincretismo presente nas celebrações, o padre, polônes, mas morador do Brasil há anos, afirma que a igreja de Jesus Cristo deve se posicionar como Jesus se posicionou: de forma a acolher mesmo os que pensam diferente. "Se há pessoas que tem um motivo para viver a relação do São Roque com entidades de matrizes africanas, sejam bem-vindos. Pelo fato de não os celebrarmos, não quer dizer que não temos muito em comum", pontua.

Além das 7 missas realizadas ao longo do dia, a programação da Arquidiocese de Salvador contou com uma alvorada, uma recitação de um terço e uma bênção com o Santíssimo Sacramento. As missas começaram às 5h30. Cinco pela manhã, e duas pela tarde, em número limitado, para evitar a disseminação do coronavírus.

*orientada pela subchefe de reportagem Monique Lôbo