Saiba por que as crianças não estão imunes ao coronavírus; confira mitos e verdades

Casos graves de contaminação de crianças pelo coronavírus acendem o alerta para os riscos de exposição na pandemia

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  • Priscila Natividade

Publicado em 18 de outubro de 2020 às 07:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Ilustração: Quintino Brito/ CORREIO

“Comecei a flexibilizar as atividades com o meio externo pouco após o período junino. Passei a levá-la para dar passeios ao ar livre, andar de bicicleta na casa dos avós e interagir com algumas crianças no playground do prédio. Porém, a pandemia ainda é real. Pode ser que em relação à interação com outras crianças, mesmo com todos os cuidados, eu passe a analisar mais a questão de ambientes e números de crianças juntas”, afirma a publicitária Ana Christina Reis, mãe de Valentina, 6 anos.

A preocupação de mães e pais, como Ana, tem um motivo. Segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde (Sesab), dos 31 leitos de UTI pediátrica que a Bahia dispõe no momento para tratamento de covid-19, mais da metade deles está ocupada (61%). Já na enfermaria, a taxa de ocupação é de 72% do total de 39 leitos. Ao todo, 13.576 crianças de 0 a 9 anos já foram contaminadas pelo coronavírus.

O número limitado de 70 leitos pediátricos é decorrente do baixo volume de confirmação de casos no estado, taxa que se encontra atualmente em 4,1%. O que chama atenção ainda são os dados ligados à Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SMIP).

Até o dia 9 de outubro, foram registrados 35 casos confirmados da doença associada ao novo coronavírus. Destes, 22 casos (62,86%) ocorreram em pacientes do sexo masculino e 13 (37,14%) em pacientes do sexo feminino. Em relação à faixa etária, o intervalo de 5 a 9 anos foi o mais acometido representando 42,86%. Duas crianças morreram.

Para a professora do Instituto de Saúde Coletiva da Ufba, pesquisadora associada ao Cidacs/Fiocruz e uma das coordenadoras executivas da Rede CoVida, Maria Glória Teixeira, o crescimento dos casos de ocorrência da síndrome acende o alerta para o risco de contaminação em crianças e adolescentes. Entre os meses de agosto e outubro, o número de casos confirmados subiu 150%, de 14 para 35.

“Logo no início da pandemia, as crianças se expuseram menos, comparado aos adultos e idosos. O que pode estar acontecendo agora é um deslocamento de faixa etária. Os pacientes infantis que estão evoluindo para casos mais graves é um sinal de alerta para que  todos os cuidados sejam redobrados nesse momento”.

Algumas flexibilizações têm maior risco do que outras, como pontua a infectopediatra do Departamento de Infectologia Pediátrica da Sociedade Baiana de Pediatria (Sobape), Anne Galastri. “A recomendação é que qualquer pessoa que tenha uma doença crônica que não está controlada, que tenha uma deficiência de imunidade deve ser avaliada pelo seu pediatra antes de voltar às atividades normais”, aconselha.

Em Salvador, o prefeito ACM Neto também demonstra apreensão. Com base em dados da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), são 47 leitos pediátricos. Destes, 74% dos leitos de UTI estão ocupados e 59% dos leitos clínicos também.

“O que a gente tem percebido é que esse aumento está acontecendo no meio da semana, que pode ter relação direta com o que acontece no final de semana. Chega final de semana, os pais saem com a criança, encontra os vizinhos, vai para o parquinho ou para o shopping e isso faz com que elas fiquem mais expostas. É preciso ter vigilância, atenção”, disse ele, na sexta-feira.

E as escolas? O cenário atual fez ainda com que o prefeito recuasse do plano de reabertura das aulas presenciais. “Houve esse movimento que nos chamou a atenção e vamos aguardar para ver se o aumento é momentâneo ou se é algo permanente”, disse. 

Leia também: com a flexibilização, o que posso e o que não posso fazer para diminuir o contágio?   O presidente da Federação  Nacional das Escolas Particulares (Fenep), Ademar Batista Pereira, insiste que o setor precisa que as escolas sejam reabertas: “A escola está fechada faz sete meses. Tem pesquisas importantes que mostram que as crianças pegam em casa ou dos adultos”, critica.

O diretor do Sindicato das Escolas Particulares da Bahia (Sinepe-BA) , Jorge Tadeu, argumenta a favor do retorno facultativo. “O retorno em 2020 é importante para começar a organizar 2021”. 

10 MITOS E VERDADES

Crianças só desenvolvem casos brandos? Na faixa pediátrica de crianças saudáveis, em sua maioria, são formas assintomáticas, leves ou moderadas da covid-19. Poucas podem desenvolver manifestações potencialmente fatais, quando comparadas aos adultos. 

O sistema imunológico das crianças é mais resistente do que o dos adultos?  Não. A infectopediatra do Departamento de Infectologia da Sociedade Baiana de Pediatria (Sobape), Anne Galastri, diz que o que acontece é que, nos primeiros anos de vida, as crianças são poupadas de uma infeção mais grave, provocada pelo coronavírus.

A Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P) é grave?  Segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), crianças e adolescentes que estejam na faixa etária entre 0 e 19 anos podem apresentar rápida progressão para formas graves da doença. Apesar de ainda não existir nenhuma pesquisa conclusiva sobre a relação exata entre a síndrome e o coronavírus, em alguns casos a doença pode levar a criança à óbito 

Este é mesmo o momento certo de flexibilizar atividades também para as crianças?  A professora do Instituto de Saúde Coletiva da Ufba, pesquisadora associada ao Cidacs/Fiocruz e uma das coordenadoras executivas da Rede CoVida, Maria Glória Teixeira, afirma que o momento pede que os pais aumentem os cuidados. “As crianças que estão apresentando casos mais graves é um sinal de alerta para redobrar todos os cuidados”, orienta.   As crianças tem baixa capacidade em transmitir o vírus?  Seja na criança ou no adulto, quanto menores os sintomas menor a transmissão do vírus, como aponta Anne Galastri. “Com base nas informações que se tem até agora, quanto menos vírus você tem, menor a carga de transmissão. Isso não elimina a manutenção de cuidados de higienização das mãos com água e sabão ou álcool em gel nem as medidas de distanciamento social e uso de máscara”.  

 A reabertura das escolas pode aumentar o número de contaminações pela doença? Maria Glória Teixeira acredita que sim. “É justamente por isso que as escolas ainda não abriram. Reforço que ainda é preciso ter mais prudência. É um doença que precisa ser mais estudada”.

Quantos leitos a Bahia dispõe hoje para tratamento infantil da covid-19? Segundo a Sesab, são 70 leitos - a taxa de contaminação infantil é de 4,1%. 

Crianças e adolescentes podem ser contaminar mais de uma vez?  Ainda não existe uma informação científica sobre isso, mas a  faixa etária infantil não está livre de uma reincidência da doença. 

E as crianças que tem problemas respiratórios, cardíacos ou são diabéticas também fazem parte do grupo de risco? O potencial de risco vai depender da gravidade da infecção. “São crianças que têm mais risco de desenvolver formas mais graves, como pacientes que têm câncer, por exemplo. No entanto, se doenças respiratórias como asma estiverem controladas, a tendência é que seja mais brando também”, diz Anne Galastri.

Pacientes infantis também podem desenvolver sequelas por conta do coronavírus? Tudo vai depender da gravidade do quadro.