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Da Redação
Publicado em 8 de dezembro de 2020 às 05:28
- Atualizado há 2 anos
Tem início neste 8 de dezembro a Campanha pelo reconhecimento por parte da Igreja Católica, da santidade do índio Tibira do Maranhão, cruelmente executado em São Luiz, por ser homossexual. >
Esse martírio ocorreu em 1614, poucos meses após a instalação dos franceses no Maranhão: liderados pelo capuchinho Frei Yves d’Evreux, que foram informados da existência de um famoso “Tibira”, termo da língua tupi para descrever os índios homossexuais. Na época a sodomia era considerada pela Cristandade “o mais torpe, sujo e desonesto pecado”. E para evitar um temido castigo divino e aterrorizar eventuais futuros amantes do mesmo sexo, ordenaram os capuchinhos a captura e prisão do índio gay, que foi sumariamente julgado, batizado e condenado a morte. Estouraram o Tibira amarrado na boca de um canhão, ao pé do Forte de São Luís, caindo seu corpo estraçalhado na baía de São Marcos, “para limpar a nova conquista do abominável e nefando pecado de sodomia.” Tal execução, arbitrária e sem autorização do Papa nem da Inquisição, é detalhadamente descrita e justificada pelo missionário em seu livro História das coisas mais memoráveis acontecidas no Maranhão nos anos de 1613 e 1614, comparando o infeliz índio gay recém batizado com São Dimas, o bom ladrão perdoado por Jesus no Calvário. >
Em 2014, para celebrar o 4º Centenário dessa cruel execução, o Grupo Gay da Bahia conseguiu que o Governo do Maranhão construísse um belo monumento com a imagem do Tibira, no mesmo local que foi executado, constando a inscrição: Tibira do Maranhão, 1º Mártir da Homofobia no Brasil. Na ocasião foi lançado um livreto e um cordel narrando esse martírio. >
Dando continuidade à essa campanha, o GGB agora exige o pedido de perdão público por parte do Superior Geral da Ordem dos Capuchinhos de Roma, reconhecendo o erro desse abuso fundamentalista, já que os missionários não tinham autoridade para condenar à morte os sodomitas e o papa Francisco declarou “quem somos nós para julgar os gays?!”, condenando qualquer manifestação de intolerância contra a comunidade LGBT. >
Ainda visando resgatar a heroicidade do primeiro mártir gay indígena brasileiro, vítima da homofobia religiosa, o GGB está enviando ofício à CNBB, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e ao novo Cardeal Arcebispo da Bahia Dom Sergio da Rocha, e de São Luiz, Dom José Belisário, solicitando formalmente que intercedam junto ao Vaticano para a abertura de processo de canonização do Tibira do Maranhão, alegando o precedente do Bom Ladrão, que apesar de seu passado pecaminoso, Jesus o perdoou garantindo-lhe um lugar como santo no céu. O mesmo ocorreu com esse índio gay maranhense, que ao ser executado, como garantiu seu juiz e executor, o capuchinho Yves Évreux, “sua alma imortal foi levada pelos anjos ao Céu, pois morreu logo depois do batismo, certeza infalível da salvação daquele a quem Deus concedeu tal graça, tão rara como o arrependimento do bom ladrão na cruz, a quem Jesus prometeu: Hoje estarás comigo no Paraíso!” >
O GGB conclama igualmente à Funai - Fundação Nacional do Índio, e Associações de Povos Indígenas do Brasil para que encampem essa campanha para que a Igreja Católica eleve Tibira aos altares como mártir, já que foi executado devido à homofobia e ao etnocentrismo europeu-cristão, considerando que a homossexualidade masculina e feminina era fartamente praticada e respeitada entre todos nossos povos nativos do Novo Mundo, embora contemporaneamente seja discriminada, sobretudo nas culturas e aldeias que foram convertidas ao fundamentalismo cristão. A campanha pelo reconhecimento da santidade do mártir Tibira do Maranhão conta com o apoio do Bispo Dom Sergio Muricy, Bispo da Santa Igreja Celta no Brasil, Vigário Apostólico da América Latina e Mestre em História pela UFBa, que encomendou ao pintor M.Galindo, boliviano residente em Feira de Santana, a realização do primeiro ícone do futuro santo gay. >
Com essa campanha, o Grupo Gay da Bahia pretende igualmente chamar a atenção para os crimes homotransfóbicos que continuam a vitimizar os\as homossexuais e trans no Brasil contemporâneo: 50% dos assassinatos de LGBT do mundo ocorrem no nosso país, um “homocídio” a cada 28 horas. Um total de 280 crimes homofóbicos somente neste ano.>
Luiz Mott é antropólogo, fundador e diretor do GGB.>