Se Dulce não é santa, você é o quê?

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  • Flavia Azevedo

Publicado em 14 de outubro de 2019 às 13:33

- Atualizado há um ano

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Quero dizer que não assisti a nenhuma canonização e que, se perto do Vaticano estivesse, ninguém me veria na cerimônia de Santa Dulce. Porque nenhuma religião me toma, esses rituais me entediam e tenho o costume de só rezar (do meu jeito, inclusive) quando as coisas dão muito errado pra mim. Gostaria, mas (ainda?) não consigo acreditar, o tempo todo, que há alguém "lá em cima" cuidando da gente. Só no desespero mesmo, porque "vai que".

Mas o povo anda falando e eu me irritando daqui. Primeiro, uma cantora que não lembro o nome, garantiu que "santo só Jesus" e babaca é um adjetivo suave pra quem acha que pode decidir sobre o que o outro deve crer. Depois, teve o post de um moço apontando altas falcatruas que envolveriam Irmã Dulce no exercício do trabalho social ao qual dedicou a vida inteira. Pode ser verdade? Se sim, acho lindo que ela não ligasse para a procedência do dinheiro. Vergonhoso é não conseguir conter o ímpeto de pegar essa caroninha aí. Tudo tem sua hora, né? Há o tamanho incontestável da obra e o mico gigante de tentar desconstruir.

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Perebas, doenças contagiosas, mau cheiro. Era isso que ela encarava, porque quis. Crianças roídas por ratos. Ratos. Matar e cozinhar galinhas do galinheiro emprestado para acolher "seus pobres" que abraçava sem medo nem nojinho nem a frescura que a maiorias das pessoas - inclusive bacaninhas, "espiritualizadas", veganas e super "trabalhadas"- têm. Era abrir as portas para QUALQUER UM e disso ainda há testemunhas oculares vivas, por aí. Foi vida na veia, procure saber. Andar cercada de gente miserável, buscando comida e onde dormir. Por dez segundos, feche os olhos e tente se imaginar assim.

Cale a boca é o mínimo que posso dizer. Principalmente, quando as críticas vêm de gente que acha que desafio é "pagar treino" na academia, que precisa de mil assessores pra criar os próprios filhos, que toma vários remedinhos pra suportar a vida e conta com coach da zorra toda pra brincar de sair e entrar numa "zona de conforto" que a maioria das pessoas deste país não sabe nem o que é. Direitos e limitações individuais, tudo bem. Mas é bom aprender a baixar a cabeça quando um ser humano maior surgir. Exatamente o nosso caso aqui.

Eu sei que a Igreja Católica anda preocupada com a perda de fiéis e que canonizar pessoas é uma estratégia nesse momento de crise. E que essa mesma igreja cometeu e comete "pecados" gigantes, portanto nem deveria ser parâmetro para a "santidade" de ninguém. Pra completar, a certeza de que a recém-santa detestaria tanta pompa e circunstância o que faz daquela homenagem inclusive uma incoerência sem fim. Mas é bom ter referências. É importante que certos valores sejam validados. Portanto, me alegro sim, não questiono a tal "santidade" e sugiro que não questione também. Porque, cá entre nós, se Dulce não é santa, você é o quê?

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