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Malu Fontes
Publicado em 17 de dezembro de 2018 às 05:52
- Atualizado há um ano
Na virada do milênio, uma frase emblemática foi pichada em muros em Paris, atribuída a um tanto de gente que nunca confirmou a autoria: Deus morreu, Marx morreu e eu mesmo não estou me sentindo muito bem. Às vésperas do ingresso no século XX, a expressão traduzia o que Nietsche já havia dito sobre a morte de Deus, lá pelos idos de 1882, inicialmente em A Gaia Ciência: Gott ist tot. Depois aprofundou “a tese” em Assim Falou Zaratustra: “Deus está morto. Deus permanece morto. E quem o matou fomos nós”. Claro, como não poderia deixar de ser, não foi compreendido nem na época e até hoje, por todo mundo que tem a vida ancorada na religião. A viagem de Nietzsche era muito mais sofisticada do que a interpretação dos religiosos.
Lenhados Já a morte de Marx, pichada nos muros, referia-se a coisas muito mais concretas, recentes e historicamente apreensíveis: Em 1989, a queda do Muro de Berlim era a pá de cal do período da história que dividiu o mundo em três: o primeiro mundo, formado pelos países ocidentais capitalistas, o terceiro mundo, formado pelos lenhados de pires na mão e o segundo mundo, embora quase nunca se ouça ou leia essa expressão: os países do bloco socialista associados ao bloco soviético emergido da Segunda Guerra e cuja Alemanha dividida em duas por um muro era a tradução em cimento e pedra. E em morte, daqueles que ousassem fugir do lado oriental para o ocidental. O “Marx morreu” do muro era o fim do mundo dividido em capitalista e comunista.
O século XXI já está praticamente se despedindo da segunda década. Saímos da modernidade para a tal pós-modernidade, um período que até hoje ninguém entendeu direito o que foi, era ou é. Fomos cuspidos, com o empurrão brutal da tecnologia, dentro de um mundo fluido que chamaram de modernidade líquida e agora nos desinformamos com pós-verdades ou autoverdades estrategicamente construídas e disseminadas com esse objetivo de não deixar pedra sobre pedras quanto a quaisquer certezas. No entanto, talvez por uma sensação histórica de desamparo, já que nem a ciência, nem a religião, nem a política foram capazes de levar a humanidade para um mundo menos hostil, estamos empacados na era Black Mirror, em que a realidade supera a ficção, a gente sabe disso e mesmo assim segue em frente na alucinação, pois é só isso que temos para hoje.
Bruxo Vive-se num tempo em que as grandes certezas, que os intelectuais chamam de grandes paradigmas que norteavam a história, morreram todas e agora somos quase todos uns androides. Todo mundo odiando a política, acreditando que Marx está vivo e está ali na esquina construindo um bunker comunista vermelho para mastigar criancinhas, a família de bem e a propriedade privada. Agora vejam só que alucinógeno poderoso anda-se consumindo no século XXI. As mesmas pessoas que não acreditam na política, na ciência, na educação como forma de libertação, acreditam em gurus. Sim, gurus. E há gurus para todos os gostos. Por aqui, tem-se de Prem Baba a João de Deus, passando por Olavão, o guru poderosíssimo da República. Olavo de Carvalho, ou o bruxo da Virgínia (EUA), como o batizou o sociólogo Demétrio Magnolli, é o guru-mor do presidente eleito, com envergadura para indicar ministros.
O mundo está aí para provar as coisas, mas quem se importa? Se esse negócio de guru prestasse, Mianmar seria o paraíso na terra, com tanto monge budista por lá. Mas, ao contrário, é uma sucursal paranoica muito próxima do inferno. Lá, o povo e o governo são racistas, preconceituosos, e vivem em pânico com medo de serem invadidos pela China ou derrotados pelos mulçumanos. Acham que os mulçumanos roubam suas mulheres para fazer filhos de pele escura, o que eles acham horrível. Se os gurus não dão jeito em Mianmar, imagine se iriam dar em Brasília ou nas doenças dos turistas esotéricos de Abadiânia.