Secretário prevê colapso na Saúde em Salvador a partir dessa sexta

Leo Prates, titular da SMS, diz que a capital bateu o recorde de regulação de pacientes para leitos de covid-19 de toda a pandemia

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  • Daniel Aloísio

Publicado em 12 de março de 2021 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Paula Froes/CORREIO
Gripário do Pau Miúdo tem lotação máxima por Paula Froes/CORREIO

A família de Geane Santana, 35 anos, sabe o que é ter covid-19 e lutar por um leito de UTI. Primeiro foi a mãe Maria Clara, 65, que em fevereiro esperou mais de 24 horas para conseguir uma vaga no Hospital Municipal de Salvador (HMS). Ela sobreviveu e teve alta. Mas agora é a vez da prima Jaci Santana, 40, que chegou desmaiada à UPA do Marback na manhã de quarta-feira, 10, e só saiu de lá às 18h desta quinta-feira, 11, direto para o Hospital de Referência do Caminho das Árvores.

No total, na quinta-feira, 129 pessoas em Salvador esperavam ser reguladas para UTIs ou leitos clínicos destinados à covid-19 e não conseguiam vagas. Esse é o maior número de toda a pandemia, segundo o secretário municipal de Saúde, Leo Prates, que prevê o colapso total no sistema na capital ainda nesta sexta-feira, 12.

“Nós estamos com recorde absoluto. A situação é desesperadora. Caso não consiga abrir novas vagas ou ter um grande número de altas, vai colapsar nas primeiras horas do dia” alertou Prates, nesta quinta-feira, 11, em entrevista à TV Bahia. 

Dos 129 pedidos de regulação, 58 são para vagas de UTI adulto e quatro para UTI pediátrica. Os demais foram para leitos de enfermaria: 64 adultos e três pediátricos. Basicamente, regular significa tirar um paciente do gripário ou Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e interná-lo na rede hospitalar, onde existe uma estrutura mais completa de assistência médica. Quem coordenada toda essa logística é a Central Estadual de Regulação, o que quer dizer que os pacientes de Salvador acabam competindo com os demais vindos do interior.  “Aqui o paciente só consegue ser estabilizado. Se ele precisar de um hospital especializado, tem que entrar na regulação. Só que antes essa transferência acontecia em menos de 24 horas. Agora, com a taxa de ocupação enorme, tem paciente que leva quatro dias aguardando”, conta o médico Elmar Dourado, coordenador médico do gripário do Pau Miúdo. A reportagem, nessa quinta-feira, registrou o drama vivido pelos pacientes internados e os profissionais de saúde. O local tem operado na sua capacidade máxima, com 22 pessoas internadas esperando a regulação. Quando uma transferência consegue ser feita, quase imediatamente acontece a adequação de outro paciente no local.

“Tivemos que pegar estrutura da UPA de Pau Miúdo destinada a pacientes não covid para dar contar da demanda”, confessou Elmar.  

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Estado de guerra 

Enquanto o CORREIO esteve no gripário, a reportagem viu a transferência de um paciente e a quase imediata chegada de outro para ficar na fila da regulação. Nos corredores do gripário, o cenário é de guerra. “As estratégias estão sendo feitas. Leitos estão sendo abertos. Mas não dá para acolher todo mundo de vez. As pessoas não estão respeitando. Mesmo com o comércio fechado, as ruas estão cheias. É vindo muita gente de vez, sistema de saúde nenhum comporta”, lamentou Dourado.  

Entre os funcionários, tensão e pressa já foram incorporadas à rotina diária. “Meu filho, aqui está muito lotado. As coisas não param”, contou a enfermeira Jaqueline Rodrigues. “A demanda está realmente alta e não conseguimos parar”, acrescentou Taiane Andrade, funcionária do setor administrativo.  

A lotação gera sobrecarga nos profissionais, explicou o coordenador médico Elmar Dourado. “As equipes estão cansadas e mesmo assim na linha de frente. Nós fazemos 260 atendimentos diários, o que é muito puxado. Só em fevereiro, foram mais de 5 mil atendimentos. Ajudou o fato da população com sintomas mais leves não estarem mais vindo para cá e sim para as unidades básicas de saúde, mas ainda é muita pressão”.  

O médico Jean Rios, que trabalha no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), no Hospital Municipal de Salvador e na UPA de Itinga, em Lauro de Freitas, conhece bem a sobrecarga.“Trabalho 120 horas semanais, pois não quero abandonar a linha de frente e sei o quanto somos essenciais. A equipe está toda cansada e vivendo coisas estressantes. Na UPA, em local onde cabe três pacientes, temos que pôr nove pessoas. No Samu, já fiquei oito horas esperando paciente ser regulado”, conta.  Segundo Leo Prates, nos últimos três dias, mais de 100 pessoas com covid-19 foram reguladas em Salvador para hospitais. Mesmo assim, a procura por atendimento no serviço municipal não para. “Se a população não colaborar conosco, vai ser difícil. Nosso limite está chegando. A expectativa era da curva sobre o sistema de saúde melhorar, mas piora a cada dia”, disse.  

Às 18h de quinta-feira, 11, a taxa de ocupação nos leitos de UTI de Salvador era de 84%. Os hospitais Português, Santa Clara, Municipal, do Subúrbio e a Maternidade Professor Jose Maria de Magalhaes Neto eram as unidades que estavam completamente lotadas.  

Estado 

Se a situação da falta de vagas em unidades da capital é grave, o drama não é menor em todo o estado. Segundo os dados do último boletim da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab), às 15h de quinta-feira, 11, 655 pessoas adultas estavam na fila da regulação. Dessas, 418 solicitações de internação eram para UTI Adulto Covid-19. Outros 237 pedidos eram para leitos clínicos para adultos com a doença.  

Uma dessas pessoas é um senhor identificado apenas como Rosalvo, de Itaberaba, que desde o domingo (07) espera ser regulado. Sua situação ficou tão grave que, na quarta-feira, 10, ele foi intubado na própria unidade de saúde do município, que não tem leitos de UTI, informou a assessoria de comunicação da prefeitura de Itaberaba.

Em nota, a Sesab disse que o estado atingiu 88% na ocupação dos leitos de UTI nesta quinta. Esse índice é o recorde atingido em toda a pandemia.

“Todos os esforços necessários estão sendo feitos no sentido de evitar que a Bahia corra esse risco [de colapso total na saúde], haja vista a abertura de novos leitos, como vem ocorrendo no hospital de Campanha Arena Fonte Nova”, diz o texto da nota.  

Em toda o estado, dos 50 hospitais que têm leitos de UTI para covid-19, 18 estão com taxa de ocupação em 100%. Dentre as unidades lotadas encontram-se todos os hospitais de Feira de Santana, por exemplo. Por lá, até o Hospital Estadual da Criança está com lotação máxima, pois teve os leitos pediátricos destinados à adultos por causa da alta demanda de internação.