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Da Redação
Publicado em 22 de agosto de 2021 às 08:15
- Atualizado há 2 anos
A tomada de poder pelo Taleban instituiu no Oriente Médio uma terceira teocracia islâmica que mexe com o jogo de forças na região. Enquanto o Irã está em "modo de pânico" por radicais islâmicos rivais ganharem força no vizinho, o Paquistão celebra um aliado para fazer frente à Índia. No entanto, o fortalecimento de um movimento Taleban paquistanês pode por uma sombra sobre as perspectivas de Islamabad no médio prazo, segundo analistas.>
Ao lado de Arábia Saudita, sunita wahabista, e do Irã, xiita, o Afeganistão passou a ser uma teocracia sunita salafista no Oriente Médio, como explica a analista e professora do US Naval War College Hayat Alvi. Na sua visão, o regime comandado pelos radicais, com o tempo, deve ir além e impor um sistema religioso fascista aos afegãos, apesar de tentarem provar o contrário neste momento.>
Com um recém-empossado presidente conservador, o Irã assiste com cautela esse novo redesenho e teme a ascensão de aliados também sunitas e extremistas do Taleban no Paquistão.>
"Por essa razão, e antecipando o fortalecimento do Taleban no Paquistão, o regime do Irã implantou milícias xiitas dentro do Afeganistão", afirma a professora. O cenário poderá resultar em uma violência sectária com potencial de se espalhar pela região. "É a receita para o desastre.">
Mudanças radicais O Irã já tem estado sob pressão para proteger os locais sagrados do xiismo e a comunidade xiita no Afeganistão, como explica o professor e especialista em Islã da Universidade de Delaware Muqtedar Khan. Ele também acredita na possibilidade de conflitos entre xiitas e sunitas dentro do Afeganistão, com o envolvimento do Irã.>
Em uma perspectiva geral, segundo Khan, a chegada do Taleban ao poder provoca uma mudança significativa. Se antes o Afeganistão vinha sendo dominado pela parceria EUA-Índia, agora ele passa a ficar sob a influência de Paquistão e China.>
O rearranjo de forças, segundo Alvi, começou a ocorrer assim que os EUA iniciaram a retirada de seus soldados do país, o que precipitou as mudanças nas configurações de poder, incluindo o envolvimento de uma variedade de milícias pela região. "Eles agora estão lutando para escolher um lado para apoiar, ou o do Taleban ou daqueles que estão contra o grupo", diz a professora.>
Segundo Alvi, países como Rússia, China, Paquistão e Índia estão considerando ir além da diplomacia e analisando ações estratégicas para proteger seus respectivos interesses na região, principalmente no Afeganistão.>
Enquanto a China claramente decidiu forjar uma relação positiva com o Taleban, a embaixada da Rússia recorreu às forças do próprio Taleban para a sua proteção e a de seu pessoal, como explica a analista. "Índia, Irã e as repúblicas da Ásia Central estão provavelmente muitos nervosos e ansiosos."Armas nucleares Para Khan, se o Taleban permitir a entrada de grupos islâmicos e jihadistas para serem treinados e atuarem no território afegão, isso terá novas consequências e representará um problema para todos os países em volta. Podem ser grupos para receber treinamento e agir militarmente na disputada Caxemira, na fronteira entre Paquistão e Índia, ou na Província de Xinjiang, onde se concentra a minoria uigur na China. "O Paquistão talvez queira grupos paquistaneses treinados no Afeganistão. Se algum ataque ocorrer na Índia, pode negar que tenha partido do seu território", avalia Khan.>
Os desdobramentos, porém, também impõem um risco interno no Paquistão, segundo a professora Alvi, uma vez que a versão do Taleban no país, o Tehrik-i-Taliban Pakistan (TTP), tem celebrado a vitória do grupo radical no país vizinho. "Há um risco inerente de o TTP buscar as mesmas ações estratégicas de empoderamento dentro do Paquistão. Se isso acontecer, o grupo supostamente teria acesso às armas nucleares do Paquistão", diz Alvi.>
Enquanto Estado e sociedade, o Paquistão, explica Khan, é muito heterogêneo. Se por um lado o governo paquistanês não é totalmente favorável a um apoio ao Taleban, as Forças Armadas e as agências de inteligência são. "Para eles, o Taleban é um instrumento muito importante.">
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.>