Tragédia em Brumadinho foi determinante para queda no PIB

Além dos impactos sociais e ambientais, rompimento de barragem em Minas refletiu na economia

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  • Da Redação

Publicado em 31 de maio de 2019 às 06:01

- Atualizado há um ano

. Crédito: AFP
. por CORREIO Gráficos

O aumento das restrições à produção de minério de ferro em Minas Gerais após a tragédia de Brumadinho (MG) teve o mesmo efeito sobre a indústria extrativa brasileira que a quebra do banco americano Lehman Brothers – ícone da crise econômica mundial, em 2008. Os dois momentos acabaram representando exatamente o mesmo índice de retração na atividade.  E a queda de agora foi determinante para que o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil fechasse o primeiro trimestre no negativo, com uma retração de 0,2% pela primeira vez depois de dois anos seguidos em expansão. 

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De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a indústria extrativa recuou 6,3%, na comparação com o trimestre anterior. Segundo a coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis, sem a queda da indústria extrativa, o PIB poderia ter ficado estável, com um resultado próximo a zero. “A indústria extrativa foi responsável pela queda do PIB”, assegurou ela. 

No auge da crise, restrições a operações afetaram minas com capacidade equivalente a 20% da produção nacional de minério de ferro, incluindo o maior ativo da Vale em Minas Gerais, a mina de Brucutu. A indústria como um todo registrou queda de 0,7% no primeiro trimestre, em comparação com o mesmo período do ano anterior.

O rompimento da barragem da mina Córrego do Feijão ocorreu no dia 25 de janeiro, deixando até o momento 245 mortos e 25 desaparecidos. Em seguida, houve reforço em restrições a operações de barragens construídas com tecnologia semelhante à que se rompeu.

Segundo o IBGE, houve queda também na produção de petróleo no primeiro trimestre, mas o recuo na produção de minério foi determinante para o mau desempenho da indústria extrativa no período. 

“Além de Brumadinho, outras barragens foram paralisadas, até mesmo por decisões judiciais”, apontou Claudia Dionisio, gerente da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE.

Sem surpresa Apesar de interromper uma trajetória de crescimento da economia que vinha se mantendo desde 2016, a queda no desempenho era projetada por economistas. Com o resultado, o PIB está agora no mesmo patamar de 2012 e 5,3% abaixo do pico da atividade, registrado no primeiro trimestre de 2014. 

Em valores correntes, o PIB foi de R$ 1,71 trilhão nos três primeiros meses do ano. O PIB do quarto trimestre de 2018 não foi revisado, permanecendo com crescimento de 0,1%.

A retração do PIB, depois de um período de fraco crescimento - a economia cresceu só 1,1% em 2017 e repetiu essa baixa expansão em 2018 - já leva alguns economistas a avaliarem que o país segue estagnado e outros acreditam que o Brasil pode estar vivendo uma depressão.

Pelo lado da demanda, os investimentos, medidos pela sigla de Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), tiveram queda de 1,7% no primeiro trimestre de 2019. Isso aconteceu, principalmente,  devido à retração na produção de máquinas e a um recuo na construção civil. Segundo Claudia Dionísio,  a queda nos investimentos foi a maior contribuição negativa para retração do PIB, considerando a ótica da demanda.

O setor externo também contribuiu negativamente. As exportações de bens e serviços recuaram 1,9% no trimestre, devido ao câmbio mais desvalorizado neste começo de ano e à crise na Argentina, principal mercado comprador brasileiro.

As importações cresceram apenas 0,5%, em razão da crise na indústria, que acaba produzindo e importando menos.

A queda de 2,2% na indústria da construção foi marcada pela redução nos investimentos, com destaque para as obras de infraestrutura.

A coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis, lembrou os cortes nos investimentos públicos, em meio aos ajustes fiscais.

Consumo  Se fatores como o desastre de Brumadinho e a frustração nas exportações tornaram pior o desempenho da economia nacional, o consumo das famílias brasileiras teve um leve avanço de 0,3% no primeiro trimestre deste ano. O resultado foi menor que os anteriores, entretanto foi positivo pela nona vez consecutiva. O item tem um peso de 64% no PIB. No quarto trimestre de 2018, a alta havia sido de 0,5% e, no terceiro trimestre do ano passado, a variação positiva foi de 0,6%. Já o  consumo do governo teve alta de 0,4%.

A desaceleração do consumo das famílias é explicada pela atual situação econômica do país. Mas mesmo com um crescimento mais tímido, ele segue como um contrapeso para que o resultado do PIB não seja pior.

“São vários fatores que explicam a desaceleração no consumo das famílias: no primeiro trimestre de 2019, a inflação está mais elevada do que em igual período de 2018, embora ainda dentro da meta”, destacou Claudia. 

Ela lembrou ainda que indicadores de emprego e renda, mesmo apresentando alguma melhora, avançam a passos lentos. “É a conjuntura, não um ponto isolado, que explica esta desaceleração. 

O consumo das famílias ainda segue contrabalanceando perdas na indústria e nos investimentos”, destacou.

Brasil fica na 38ª posição em ranking de 43 países

Com um recuo de 0,2% em relação ao quarto trimestre de 2018, o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) para o primeiro trimestre deste ano frente ao trimestre imediatamente anterior fez o Brasil ocupar a 38ª posição em um ranking com 43 países, segundo levantamento feito pela agência de classificação de risco Austin Rating.  Dos países da América Latina, o Brasil teve um resultado pior do que Colômbia e Chile, que ocupam o 35º e 36º lugares, respectivamente. Dos 43 países analisados pela agência, 36 tiveram resultados positivos. 

“O Brasil está num momento bastante crítico, com baixo nível de confiança. Isso reduz o potencial do crescimento e pode ser visto na queda nos investimentos”, explica  o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini. “As economias centrais que cresceram no último ano estão desacelerando e alguns emergentes que são parceiros econômicos do Brasil vão desacelerar também, como o México e Argentina, já estando esse último em recessão”, diz. Ele acredita que há uma perspectiva internacional propícia à retração.    De acordo com o ranking, a China está na 4ª posição, com crescimento de 1,4%, enquanto os Estados Unidos ocupam o 16º lugar com o resultado de 0,8%. 

O levantamento só inclui países que fazem a divulgação trimestral dos resultados.

Analistas apontam sinais de que ano está perdido

A economia brasileira caminha para mais um ano perdido, na avaliação de analistas. As projeções do início do ano de crescimento em torno de 2,6% agora estão em 1,0%. Há, porém, risco de o PIB ficar abaixo disso, conforme pesquisa com 26 instituições financeiras. Em 11 delas, as estimativas são inferiores a 1,0% para o crescimento deste ano. Na pesquisa anterior, feita após a divulgação do Índice de Atividade Econômica divulgado pelo do Banco Central (IBC-Br), de 26 consultadas, 3 previam menos de 1,0%.

Citibank, JP Morgan e MB Associados estão entre as que cortaram projeções. A previsão do Citibank era de alta de 1,4% em 2019, mas caiu para 0,9%. O JP Morgan reduziu sua projeção de 1,5% para 0,9%, e a MB Associados de 1,1% para 0,9%.

O economista-chefe da MB Associados Sergio Vale disse que ainda não é o caso de falar em recessão. 

Para Juliana Cunha, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da FGV, uma economia mais acelerada no segundo semestre não bastaria para o PIB fechar, na média, muito acima de 2018, mesmo que empresários e consumidores vejam “as coisas acontecendo”.

Líder do governo diz que  reformas vão mudar quadro

Líder do governo no Congresso, a deputada federal Joice Hasselmann (PSL) afirmou, ontem,  ser “absolutamente compreensível” a queda de 0,2% no Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre, na comparação com o quarto trimestre de 2018, uma vez que a reforma da Previdência ainda não foi aprovada. Joice defendeu que a “chave” do PIB irá “virar” assim que as novas regras passarem no Congresso Nacional. 

“Isso deve acontecer aí até o final do semestre, e sabemos que para gerar emprego e ter investimento a gente tem que destravar o país e o primeiro passo é a nova Previdência, milagres não acontecem”, afirmou Joice após café da manhã com o presidente Jair Bolsonaro junto da bancada feminina. 

Segundo ela, o assunto não foi tratado no encontro. “Só assim (com aprovação) os investimentos vão chegar no país, só assim a gente vai ter geração de emprego, se não é só chover no molhado”, disse. 

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, avaliou  que a queda na agropecuária brasileira no primeiro trimestre de 2018 “não é desse governo”, mas uma consequência da pior crise econômica do país em 100 anos. Dados do IBGE apontam que o PIB setorial recuou 0,5% em comparação com o 4º trimestre de 2018 e 0,1% ante o 1º trimestre do ano passado.  O recuo sobre o trimestre anterior foi o primeiro desde o 3º trimestre de 2017. 

“Vinha lá detrás e culminou com o PIB negativo, inclusive do agronegócio”, disse a ministra.