Treze obras do artista plástico Calasans Neto são furtadas de ateliê em Itapuã

Família disse que acionará a Interpol; caso é investigado na 12ª Delegacia, na capital

  • Foto do(a) author(a) Bruno Wendel
  • Bruno Wendel

Publicado em 12 de dezembro de 2019 às 05:15

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arisson Marinho/ CORREIO
Árvores na Noite por Divulgação

Parte do acervo do artista plástico baiano Calasans Neto foi furtada do seu ateliê, no bairro de Itapuã, em Salvador. Foram levadas 13 obras, entre quadros e matrizes – que é o processo e técnica de gravura em relevo sobre madeira – que fariam parte de um memorial do artista para visitação pública. O caso foi registrado na 12ª Delegacia (Itapuã), e a família vai procurar a Interpol (Organização Internacional de Polícia Criminal), na tentativa de dificultar a venda das peças no mercado clandestino, pois acredita que o roubo foi encomendado.

O furto aconteceu no dia 11 de outubro deste ano, quando um homem arrombou uma das casas onde José Júlio de Calasans Neto viveu por anos – o artista morreu  no dia 11 de maio de 2006, aos 73 anos, em consequência de uma infecção pulmonar. No imóvel, funciona o ateliê do artista, com 33 peças. Depois do crime, as obras restantes foram encaminhadas para um depósito no Rio de Janeiro. O caso foi registrado somente no dia 7 de novembro, quando o responsável pelo ateliê, Eduardo Rozendo Pinto, primo de Auta Rosa, viúva do artista, esteve em Salvador.

“Como moro no Rio, me ligaram no dia seguinte ao furto e, daqui mesmo, adotei medidas emergenciais, como a retirada das demais obras e o conserto do que foi quebrado”, disse Eduardo ao CORREIO, por telefone. Segundo ele, ainda não é possível estimar o prejuízo financeiro.“Por enquanto, só o valor sentimental, porque ele não está mais vivo. É um pedaço de Calá que se vai”, disse.Para Eduardo, o furto foi uma ação premeditada. Ele disse que as obras ficaram em exposição no “Agosto das Artes” no Palacete das Artes, na Graça. “A exposição foi um sucesso e quem fez o roubo aguardou o dia mais propício. Era véspera de um feriado, a cidade vazia. Quem roubou entende de arte. Por isso, vamos contactar a Interpol para evitar que as obras sejam vendidas no comércio internacional, pois quem cometeu o crime, não irá vender por aqui, pois as obras têm registro e passaram por uma exposição recente.”

O terreno onde Calasans passou seus últimos anos de vida possui duas casas. Uma na Rua Amoreiras e a outra na Rua Calazans, onde está o ateliê. Segundo Eduardo, o ladrão teve acesso ao acervo invadindo um outro imóvel, onde funciona uma base de apoio da Limpurb – o local serve como depósito das ferramentas usadas pelos garis. O terreno onde Calasans passou seus últimos anos de vida possui duas casas (Foto: Arisson Marinho/ CORREIO) “O que fiquei sabendo é que um único homem entrou nesse imóvel, cujo muro dá no jardim do terreno, arrombou uma fechadura e teve acesso ao ateliê”, contou Eduardo.Todo o terreno é murado e com cerca de arame farpado, o que não impediu a ação do criminoso. “Nunca pensei em reforçar a segurança porque roubo de obras de artes nunca tinha acontecido por lá, em Itapuã, reduto de outros artistas plásticos”, acrescentou.

O vizinho Alberto da Cruz Viana, 53, se queixa da segurança na Rua Amoreiras: “Na minha casa, levaram a campainha manual. Era uma mão de bronze que conseguiram arrancar.”

Artistas lamentam

Artistas cobraram respostas das autoridades sobre o crime. O artista plástico e crítico de arte Justino Marinho contou que Calasans Neto tinha um estilo próprio de criar e que até hoje é considerado uma referência da arte moderna.

“Quando se fala de arte na Bahia, as pessoas lembram de Calasans, assim como lembram de Jorge Amado e Dorival Caymmi, por exemplo. Isso porque ele tinha uma assinatura muito própria. A gente batia o olho e dizia ‘Essa obra é de Calasans’”, disse.

Marinho lembrou da época em que frequentava a casa do amigo e contou que ele sempre foi bem-humorado. O crítico disse que o roubo das peças representa um prejuízo material e cultural e é consequência da falta de preservação da memória dos pintores e escultores baianos.

Paulo Darzé, proprietário de uma galeria de arte no Corredor da Vitória, contou que as peças de Calasans variam, em média, de R$ 12 mil a R$ 50 mil. “Ele é, sem dúvida, um dos artistas mais importantes da Bahia. Era baixinho no tamanho, mas um leão em criação e produtividade. O valor das obras varia de acordo com o tamanho e o tipo, mas eu já cheguei a vender uma tela de Calasans por R$ 80 mil.”

Em uma rede social, a artesã, redatora, ilustradora e amiga Paloma Amado disse estar “tristíssima”. “Roubaram o acervo mais precioso de Calasans Neto, as matrizes de suas maravilhosas gravuras, que ficavam no atelier do artista. Estou rachada em cruz. Meu Calá querido, meu grande amigo, não merecia.”

A lista das obras furtadas

O Voo Submerso - De 1988, xilogravura matriz, com 0,97 m x 1,47 m

Um Lugar ao Sol - Sem data, xilogravura matriz, com 0,63 m x 1,32 m

Duas Cabras - Sem data, xilogravura matriz, com 0,66 m x 1,24 m

Flores, Pássaros e Cajus - De 2004, óleo sobre tela, com 0,36 m x 0,69 m

Baleia e Coqueiro - De 1979, óleo sobre tela, com 0,25 m x 0,25 m

Árvores na Noite - De 1979, óleo sobre tela, com 0,25 m x 0,25 m

Mulher Nua de Costas  De 1995, gravura, com 0,35 m x 0,22 m

Cavalo do Abaeté - De 1979, xilogravura matriz, com 0,35 m x 0,25 m

Cabra Olhando para o Rabo - Sem data, xilogravura matriz, com 0,27 m x 0,38 m

Pássaro Noturno do Abaeté - De 1983, xilogravura matriz, com 0,45 m x 0,45 m

Duas Corujas e Dois Cajus - De 1997, óleo sobre tela, com 0,96 m x 0,41 m

Coruja e Peixe - De 1997, óleo sobre tela, com 0,96 m x 0,41 m

Dunas e Areias de Itapuã - Óleo sobre tela, com 0,50 m x 0,50 m

[[galeria]]

Colaborou Gil Santos