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Publicado em 2 de fevereiro de 2022 às 05:20
- Atualizado há 10 meses
Ontem foi Dia de Bênção, dia festivo, dia tradicional Terça da Benção. Um dia especial para a nossa negritude baiana. Embora estejamos em uma pandemia, ainda tem gente que vai à missa na Igreja de São Francisco, no Cruzeiro, depois toma um cravinho no Terreiro de Jesus e desce para o ensaio do Olodum. Antes do show os tambores rufaram suavemente em homenagem a uma mulher que, por talento e merecimento, se tornou a primeira-dama do Pelô.
Para nossa tristeza, Alaíde do Feijão nos deixou. Alaíde fez do seu tabuleiro na Praça Cayru - e depois no restaurante do Pelô - a base da sua militância. Desde jovem, aprendeu com a mãe, Dona das Neves, a dividir, a alimentar quem tinha fome. E não faltava gente que, ao passar em frente ao restaurante, lhe dirigia o olhar. E ela, prontamente, perguntava: “tá com fome, né? Venha!”.
Com sua sabedoria, Alaíde alimentava a alma das pessoas, tinha sempre uma palavra de conforto para as nossas aflições. O restaurante Alaide do Feijão passou a ser ponto de encontro da negritude de todas as classes sociais e categorias artísticas, intelectuais e políticas.
Inteligente e boa ouvinte, sempre esteve muito atenta aos fatos que marcaram nossa história de revoltas e levantes que tiveram a Bahia como palco pela libertação. O que ouvia dos clientes militantes, como Vovô - o queridinho dela (mesmo ele torcendo pelo Vitória e ela tricolor) -, João Jorge Rodrigues, Marcelo Gentil, Valmir França, Zulu Araújo e muitos outros ativistas da nossa geração, ela fazia questão de passar adiante como ensinamentos. Passava o ano todo observando os ensaios dos blocos afro e afoxés... Tinha ótimas fontes, sabia de muita coisa antes de muita gente... Até mesmo dos temas carnavalescos das entidades... Ficava por dentro das fantasias escolhidas com antecedência e até de surpresas que aconteceriam na Avenida. Sabia de tudo… O que não via na Avenida, acompanhava pela televisão.
Era uma verdadeira mestra. Bem humorada, gostava de uma boa conversa, fosse com quem fosse. E nós, amigos fiéis, levávamos amigos de fora para conhecer e degustar o feijão da Alaide. As pessoas saiam encantadas e ressaltavam: “Olha o feijão dela é bom, mas a conversa e as tiradas dela são boas demais".
Vaidosa , não dispensava uma saia rodada. Era sambista e sambadeira. Certa vez, no ensaio do Ilê, ao ser admirada por um rapaz - surpreso com a performance dela - a mesma cochichou no meu ouvido: “Olhe seu parente aí, ele pensa o quê? Minha filha, eu também já fui jovem, bonita, magra e gostosa. Eu fazia sucesso. Tá pensando o quê?". E deu uma gargalhada.
Essa era minha, nossa amiga, Alaíde do Feijão. A pérola negra do Ilê!
Saudades sem fim!
Wanda Chase é jornalista