Uma vida em vão

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Publicado em 8 de abril de 2021 às 21:24

- Atualizado há um ano

Oito de abril de um dia atribulado que inicia com a rotina perseverante que me impus em tempos de pandemia. Acordar, agradecer, me preparar para o dia de trabalho (agradecer especialmente por isso) e seguir na atualização nauseante, mas necessária do noticiário. As notícias, atualmente, nascem, ora veja, sob o signo da morte. Morte de ídolos, amigos, parentes, todos seres humanos como eu, como nós, e morte dos ditos ceenepejotas. A quem fica, a diária missão de proteger a si e aos nossos, superar-se, reinventar-se e perseverar, características próprias da vida. Nessa rotina de resistir, perseverar e tentar seguir com os afazeres, varro os olhos nos grupos profissionais das redes sociais e me deparo com um corpo inerte despencando do alto do mais importante cartão postal da cidade. Assim, sem filtro e sem censura. Golpe seco e covarde na alma, às 11h da manhã de uma 5ª feira, 08 de abril. Choque, terror, lamento e revolta. Precisamos disso para ficarmos piores do que já estamos? Até onde pode descer o discernimento humano ao postar algo assim pelo simples fato de tê-lo recebido? Onde estão nossos escrúpulos? Nossos brios? Nosso respeito por aquele ser humano que seguramente tem uma família, uma mãe, um pai, filhos, talvez...? Será que na bem abastada, bem nutrida e escolarizada mente de quem postou essa imagem sem qualquer pudor, não pesa o respeito e o decoro por outro ser humano? Ciente que o resto do meu próprio dia já está condenado, lamento notar que a morte em si, que há meses, tanto avassala nosso dia-a-dia e nossos laços afetivos, seja ostentada dessa forma. A vida em vão, que em desespero despencou Elevador Lacerda abaixo, é a mesma de quem pede emprego, comida, casa, ajuda ou se preferir, auxílio digno, chance de estudo e igualdade de condições há gerações. Quem resume essa tragédia a uma postagem impactante e lacradora, não percebe que a dignidade daquele ser humano já morreu há muito mais tempo, sem posses, sem nutrição, sem escolaridade, sem oportunidades, sem perspectivas, sem esperança e sem que ninguém ostentasse também isso nas redes sociais. A vida em vão, além da que se soltou da Cidade Alta, é também a de quem vive, vê, ouve e nega esses gatilhos. Vive também em vão quem não sente e não se ressente com esses sinais. Quem não tem empatia pelo sofrimento do outro antes mesmo do desespero do suicídio. A morte, para essas pessoas, não quer dizer nada. Talvez porque elas já estejam mortas há muito tempo. Talvez desde que nasceram. Essa vida sim, é a mais ordinária e deplorável vida em vão. Escultura Melancholy, de Albert György, localizada no Lago Genebra, na Suíça e também dentro de muitos. Texto publicado originalmente no Facebook de Silvana Gomes