Vasco da Gama, tua fama assim se fez

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  • Paulo Leandro

Publicado em 7 de setembro de 2019 às 05:00

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O Clube de Regatas Vasco da Gama está para o futebol do Rio de Janeiro e do Brasil como o Ypiranga pode ser contextualizado no ludopédio baiano. São duas referências de resistência, combate e vitórias sobre o racismo de classe.

Racismo de classe é quando misturam-se os privilégios dos proprietários das terras, fábricas, empresas de um modo geral, com a discriminação de grupos sociais afastados de seus direitos de cidadania por viés étnico. É a maligna união do capital com a cor da pele.

O foot-ball nasceu no berço esplêndido de quem podia comprar bolas, material esportivo e tinha contato com os donos do jogo, os ingleses construtores de estradas de ferro, companhias de iluminação e bondes a tração animal.

Fluminense e sua criatura, o Flamengo, o  Botafogo, o América, eram os clubes da zona sul, queridinhos da liga por serem constituídos por players de “boas famílias”, os tais “cidadãos de bens”.

Aí, acontece de o Vasco aparecer com a proposta de acolher os afro-brasileiros, saídos da condição de corpos humanos escravizados havia apenas três décadas e meia. Exerciam funções subalternas como biscateiros, soldados, artesãos, faxineiros...

No pós-abolição, a saída súbita das senzalas causou dificuldades de sobrevivência, cujos desdobramentos esticam-se até os dias de hoje, especialmente quando se verifica a composição étnica do sistema prisional.

Então, o Vasco da Gama, filho dos portugueses, subiu da segunda para a primeira divisão e no ano seguinte, foi o campeão da cidade, algo senão inédito, ao menos raríssimo na história do futebol mundial.

Os clubes rico-branqueados uniram-se para impor o racismo de classe: só podia jogar quem soubesse assinar a súmula. A alegação dos anjinhos era o combate ao analfabetismo, mas a intenção, bem outra: exterminar aquele time de pobres “de cor”.

Os afro-brasileiros não tinham acesso à boa educação, como ocorre até hoje, a despeito dos avanços registrados antes do abril de 2016; então, o jeito foi ensinar os vascaínos a desenhar o nome em garranchos para poderem jogar.

Aí, inventaram outra regra nível Deltan. Só podia jogar quem tivesse mando de campo. O Flu tinha Laranjeiras; o América, Andaraí; o Bota, General Severiano; o Fla, a Gávea; o São Cristóvão, Figueira de Melo...

Então, os portugas, pois, pois, responderam com a construção do maior estádio, o de São Januário, onde o saudoso Getúlio assinou a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), ora em estado de decomposição.

O Vasco aprendeu a superar-se continuamente para construir-se como grande clube. A listra em diagonal foi copiada nos anos 1940, do River Plate, pois o brasileiro sofria de platinismo, uma sensação de inferioridade em relação aos gardelitos.

Embora tenha sido brutal, como toda colonização, a presença portuguesa permitiu maior interação, pois os invasores vieram sem família e alteraram nossos códigos genéticos, ao namorarem indígenas e afro-brasileiras: o Vasco representa bem este convívio e a boa mistura.

Por toda esta história de luta e de inserção cultural num combate maior da sociedade brasileira contra ideologias de desumanidade, o Vasco merece toda consideração por ser um clube vocacionado a defender nossos melhores valores de cidadania.

Paulo Leandro é jornalista e prof. doutor em Cultura e Sociedade