Virada de ano de muita luz e pouca aglomeração em Salvador

A tradicional queima de fogos se espalhou por lugares estratégicos da cidade para que todos pudessem ver de casa 

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  • Carmen Vasconcelos

Publicado em 1 de janeiro de 2021 às 17:25

- Atualizado há um ano

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. por Foto: Nara Gentil/CORREIO

Desafiador desde o início, 2020 ficará marcado como um ano inusitado e o último dia não poderia ser diferente. Pelas ruas de Salvador, não se viu engarrafamentos, bares e restaurantes lotados e a orla disputada como, geralmente, ocorre no dia 31. Mas, uma coisa não mudou: o céu ficou iluminado para anunciar a chegada do novo ano. A tradicional queima de fogos, desta vez, se espalhou por lugares estratégicos da cidade para que todos pudessem ver o show pirotécnico, preferencialmente, de casa. 

Parque da Cidade, Forte de São Marcelo, Plataforma, Canabrava, Boca da Mata, Abaeté, Imbuí, Paripe, Sussuarana, Patamares, Cassange, Liberdade, Bairro da Paz, Castelo Branco, Valéria, Fazenda Coutos, Pirajá, Pernambués, Vila Laura e o campi da UFBA foram os locais escolhidos pela prefeitura para abrigar as estruturas do espetáculo de luzes. A maior queima aconteceu no quebra mar do Mercado Modelo e durou oito minutos (os demais tiveram duração de quatro minutos). As luzes no céu simbolizaram o pedido de um ano novo iluminado em todos os sentidos. 

“O que desejamos nessa noite? Que essa virada represente o início de um novo momento e que, através da nossa fé, possamos renovar a esperança de um 2021 muito melhor. Chegamos ao final de um ano que desafiou a humanidade e a cada um de nós. Ficam muitas lições, sendo que a mais importante de todas é: nada é mais valioso na vida do que estar ao lado das pessoas que amamos de verdade”, afirmou o prefeito ACM Neto, através das redes sociais.

Segundo o presidente da Empresa Salvador de Turismo (Saltur), Isaac Edington, a proposta era justamente permitir que as pessoas pudessem assistir à queima de diversos pontos da cidade, além de puderem acompanhar por meio do canal da Saltur, no Youtube. Cerca de 20 mil pessoas assistiram à queima de fogos virtual pela internet. “Esse foi um ano difícil para todos e nosso papel era permanecer promovendo a cidade, garantindo o suporte necessário para as ações de controle da pandemia”, disse Edington, que acompanhou de perto a queima na Praça Municipal.

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Sem aglomeração Em tempos de pandemia, o Réveillon desse ano foi bem diferente e teve como meta evitar as aglomerações e comemorações grandiosas. A exceção foi a orla de Amaralina, onde depois da meia noite, foi possível perceber uma aglomeração maior, especialmente na Praça do Budião, mesmo com a presença ostensiva da Polícia Militar. Antes da virada, os grupos, em sua maioria, era constituído de famílias. Depois da virada, o espaço ficou mais cheio e tomado por pessoas que pareciam ignorar a necessidade do uso de máscara.   Em Amaralina, alguns pontos tiveram aglomeração (Foto: Nara Gentil/CORREIO) Nem mesmo a Barra, tradicional ponto turístico da cidade contou com o movimento de pessoas na noite da virada. A Polícia Militar e a Guarda Civil Municipal (GCM) fizeram um policiamento ostensivo nas áreas da Barra, Comércio, Rio Vermelho, Piatã e Itapuã, com o intuito de garantir o ordenamento nos locais. Além disso, a ação contou com o patrulhamento de viaturas, motocicletas e até mesmo o auxílio de drone para evitar aglomerações. A Polícia Militar e a Guarda Civil Municipal fizeram um policiamento ostensivo na Barra (Foto: Nara Gentil/CORREIO) Recém chegada a Salvador, a turista paulista Aline Santos, 30, esteve passeando na Barra com o marido e a filha para fazer o reconhecimento da área. “Nossa virada será no apartamento que alugamos, apenas nós mesmos, vibrando e desejando que, em 2021, tenhamos saúde, esperança e paz”, disse. Para ela, embora distante do passeio ideal, estar na capital baiana é a concretização de um desejo antigo. “Estamos juntos, com saúde e isso é o que importa. Aproveitaremos na medida do que for possível”, completou.

Saúde e paz também foram os desejos do comerciário Lázaro Nascimento, 53, e de Cláudia Ferreira, 49. Eles aproveitaram a brisa fresca da beira mar em Amaralina para aproveitar a virada do ano. “Se cada um fizesse sua parte, com toda certeza estaríamos vivendo um momento melhor, mas como ainda não se tem essa consciência coletiva, vou pedindo que o novo ano chegue com a vacina e com as pessoas tendo mais amor no coração”, falou Cláudia. 

A recepcionista Jéssica Ventura, 27, aproveitou a casa de parentes e também foi aproveitar a virada do ano na orla. “Esse ano foi difícil, perdemos amigos e parentes, então acho que, apesar de tudo, foi um ano para compreender o que de fato é importante e superar as aparências”, avaliou. Para ela, o desejo de 2021 é a vacina para todos. 

Depois de trabalhar até às 15h30 da quinta-feira, o técnico em telecomunicação André Silva, 27, também fez questão de celebrar o novo ano com amigos. “Estamos vivos e precisamos ser gratos a isso. Sei que 2021 será um ano de muito esforço para superar todas essas dificuldades vividas em 2020, mas temos coragem e fé que as coisas evoluam para melhor”, completou. Para ele, o maior desejo para o ano novo é a vacinação em massa.  

A esperança de dias mais iluminados, com uma sociedade mais empática foi o desejo da professora Vânia Cerqueira, 38. “Espero que em 2021, nossa sociedade se conscientize da necessidade de mais equilíbrio em todos os sentidos”, falou, ressaltando que 2020 foi um ano muito triste e de muitas perdas. Com uma postura bem parecida, o músico Antônio Pires, 42, também chamou atenção para o comportamento individualista que torna tudo mais complicado. “É preciso abandonar essa vida artificial, de plástico e se voltar para a essência. Então só posso desejar que o ano de 2021 chegue com mais verdade”, finalizou. Rio Vermelho também contou com intensa fiscalização (Foto: Nara Gentil/CORREIO) De casa Na contramão de quem foi para as ruas, muita gente preferiu ficar quietinho em casa com as pessoas de seu círculo familiar imediato. E teve de tudo, desde quem ficou tomando uma em casa com a mãe, até quem preferiu virar o ano assistindo a uma nova série ficou da janela refletindo sobre a vida.

O soteropolitano Vitor Vinícius, webdesigner de 41 anos, que mora em Brasília, abriu mão da viagem para sua terra natal em nome da prudência. Vitor se programou, comprou um carro novo para fazer a viagem pela estrada, mas no final das contas a preocupação da mãe, que tem um problema respiratório, falou mais alto e ele deixou a viagem pra lá. Virou o ano dentro de casa mesmo.

“A gente iria para a Ilha de Bom Jesus dos Passos, próximo de Madre de Deus. Minha família é de lá e conheço todo o mundo, frequento desde que tinha dois anos de idade. E minha mãe me conhece, sabe que eu ia querer conversar com todo o mundo, matar a saudade de gente que não vejo há um tempão e ficou preocupada de eu ir”, contou o baiano.

Também teve quem fez o movimento contrário: caso da pesquisadora Lize Antunes. Natural de São Carlos, em São Paulo, ela mora na Bahia e retornou para sua terra natal logo no início da pandemia. A ideia era passar 15 dias com sua mãe, Sonia Antunes, mas acabou virando oito meses. Lize só voltou à Bahia em novembro para resolver alguns problemas pessoais e logo retornou. Tanto ela quanto sua mãe estão muito cuidadosas em relação à pandemia. É tanto que fizeram um generoso estoque de cerveja para nem pensar em sair de casa. Este ano, tudo se resumiu a elas duas, o gato Pedro Gabriel Manoel e os cachorros Carlos Eduardo e Manoel Carlos. “Preferimos prezar pela prudência. E está sendo muito tranquilo, não é nenhuma tristeza. Claro, gostamos de casa cheia, de ver aquela galera que não vemos sempre”, contou. Lize passou a virada de ano com a mãe e os pets em casa (Foto: Arquivo pessoal) A publicitária Milena Coutinho, de 36 anos, por sua vez, assistiu ao estouro dos fogos da sacada da sua casa completamente sozinha. Ela testou positivo para a covid-19 e, mesmo assintomática, passou os últimos 15 dias em casa. Seu filhinho de 4 anos foi para a casa do pai. No entanto, ela aproveitou o momento de solidão para pensar na vida, nos planos, nas realizações e na pessoa que era há exatos 12 meses.

“Meu ritmo de vida é muito agitado, então nesse período aproveito para fazer nada. O Réveillon nunca me animou, acho uma festa muito cara. Mas estar sozinha neste momento pega pelo isolamento. Em outros anos eu podia marcar com uma amiga de ir rápido até a praia, fazer uma caminhada, almoçar, jantar, e estou privada dessa liberdade. Isso foi o mais difícil”, avaliou. Milena passou o Réveillon sozinha por conta da covid-19 e seu filho passou com o pai (Foto: Arquivo pessoal) Em Brotas, a psicóloga Leila Mignac brigou com boa parte da família para seguirem o isolamento, mas não conseguiu que todo o mundo continuasse em casa - o cansaço de quase um ano de pandemia acabou pesando. Ela, no entanto, seguiu firme. Virou o ano sentadinha em sua cadeira, reclamando um pouco no Twitter enquanto tomava um bom vinho e lia um dos vários livros que comprou na Black Friday. "Eu encaro esse período como uma oportunidade, assim como outras datas ou marcos pessoais", falou Leila.

O representante comercial Moacir Rodrigues virou o ano com seu filho, sua irmã e sobrinha - que passaram a morar com ele por conta da pandemia. Ele lamentou o fato de não conseguir encontrar sua família como era o planejado. A advogada Carolina Neris, 25, virou um ano em casa pela primeira vez. Fazendo companhia a seus pais na espera pela chegada de 2021. “Foi tão tenso que nem vale a pena passar o ano dormindo. Perde um pouco da emoção", ponderou.  A família Neris viu a chegada de 2021 de casa pela primeira vez (Foto: Arquivo pessoal) Totalmente avessa a aglomeração, a vendedora Maria Veloso, 22, virou o ano assistindo à série Bridgerton, lançada na Netflix. Um pouco antes da virada, ela disse que já estava na expectativa de dormir antes mesmo dos fogos estourarem. E está tudo bem assim, também.

Confira o texto de Edgard Abbehusen sobre a passagem de ano:

O ano que a gente sobreviveu 

Sobreviver a 2020 foi uma das batalhas mais duras que eu já travei. Cheguei no último mês do ano cansado, exausto, triste por muitas perdas e por muitos sonhos que tiveram que ser adiados. ⠀

É difícil não lamentar um ano tão turbulento como esse. É difícil querer focar o tempo todo na positividade, quando no fundo a gente só quer chorar. Foi um ano que perdemos muito. Vidas foram perdidas, empregos foram perdidos, muita gente se perdeu. É como se todos os países do mundo, ao mesmo tempo, perdessem uma Copa do Mundo. E de goleada. É como se vários aviões lotados de pais, de mães, de avós, de pessoas com histórico de atleta, caíssem ao mesmo tempo todos os dias. Deixando famílias em luto. 

Enfrentamos vários vírus. O vírus da ignorância. O vírus mortal que causa medo e fez todo mundo mudar um pouco a sua rotina. O vírus da desvalorização da ciência. O vírus da falsa informação propagada pelo whatsapp e o vírus da inoperância de quem deveria nos proteger. Se tem uma coisa que cada um de nós deve comemorar esse ano, apesar de tudo, é a possibilidade de poder pensar em recomeçar. Ficar  vivo foi a grande conquista de todos nós em 2020. ⠀

Viver, ainda que com os olhos marejados de tanto chorar por tantas coisas que tivemos que enfrentar; ainda que com a dor recente por perder um parente, um amigo, um amor, uma companhia; ainda que com o coração apertado e cansado por todas essas notícias (as absurdamente verdadeiras que temos que acompanhar todos os dias nos jornais) sobreviver foi e continuará sendo um desafio.⠀⠀

Se você me pedisse um conselho para 2021 seria exatamente esse: Continue sobrevivendo. Continue lutando. Continue buscando o seu melhor. Continue acreditando na ciência. Sempre que puder, plante amor. Por onde você passe, em cada palavra que você doar as pessoas, que seja doce. A esperança é força que move tudo a nossa volta. Aumenta a nossa imunidade. Com certeza, com esperança, chegamos até aqui. E faremos desse ritual de passagem, uma chave que nos abrirá portas, caminhos e novas possibilidades.

Ah! E eu também te daria mais um conselho: Quando você tiver a oportunidade de tomar uma vacina contra o coronavírus: se jogue!