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Mario Bitencourt
Publicado em 15 de maio de 2019 às 05:00
- Atualizado há 2 anos
Duas das 24 mulheres que afirmam ser vítimas de assédio sexual por um médico especializado em ginecologia e obstetrícia em Vitória da Conquista, no Sudoeste do estado, prestaram queixa contra o profissional nessa terça-feira (14), na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam).>
Nos depoimentos, segundo a delegada titular Dercimária Cardoso Gonçalves, as vítimas relataram que foram assediadas sexualmente pelo médico Orcione Júnior, no consultório dele, nos anos de 2018 e 2019. Segundo os relatos, o médico acariciava o clitóris das pacientes, para estimulá-los, e ainda fazia elogios às partes íntimas das mulheres. >
Elas também relataram que se sentiram incomodadas com "massagens nos seios" por parte do médico, durante o exame clínico. “O que elas relatam são casos de assédio sexual e pode ser enquadrado até como abuso sexual, mas vamos analisar os casos para ver em que crime podemos tipificar os relatos”, disse a delegada.>
Os casos já tinham sido comunicados para a delegada na segunda-feira (13), durante reunião na Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), onde as 24 mulheres estavam presentes e deram detalhes sobre os supostos assédios, que vinham ocorrendo, segundo elas contaram, há pelo menos seis anos.>
Segundo a delegada, muitas delas choraram durante os relatos na OAB e algumas sequer conseguiram expressar o que sentiam, devido ao estado emocional. Havia um clima de indignação também.>
Além de apoio jurídico, todas as vítimas vão receber assistência psicológica no Centro de Referência Albertina Vasconcelos, pertencente à rede pública de saúde municipal.>
A delegada está com os dados de todas as pacientes, que confirmaram que irão prestar depoimentos. “O que estamos fazendo agora é agendando com cada uma delas os depoimentos, que são feitos de forma separada. As demais mulheres estarão falando nos próximos dias na delegacia”, explicou a delegada.>
Semelhanças A advogada Andressa Gusmão, membro da Comissão da Mulher Advogada da OAB em Vitória da Conquista e que acompanhou os depoimentos, disse que “o que se percebe é uma semelhança na forma de atuação do médico com relação ao assédio que denota um ‘modus operandi’. Os relatos são muito parecidos”, afirmou.>
Andressa informou também que outras mulheres, além das 24 que estiveram na reunião na OAB, entraram em contato com a Ordem para relatar que também foram assediadas. Elas manifestaram interesse em prestar queixa contra o médico, que atende a rede pública e privada em Vitória da Conquista.>
“São mulheres de outras cidades da Bahia, algumas de Salvador e até de fora do Brasil. Não sei precisar quantas mais, mas elas demonstraram interesse também em realizar a denúncia. Acredito que, devido a esse movimento, muitas vítimas vão tomar coragem e decidir por denunciar”, disse a advogada.>
Ainda segundo Andressa Gusmão, por enquanto, as vítimas não vão dar entrevista para a imprensa. Ela informou que o Ministério Público da Bahia (MP-BA) já foi oficiado para dar acompanhamento ao caso. Já com relação ao Conselho Regional de Medicina da Bahia (Cremeb), a comunicação sobre os supostos assédios deverá ser realizada pela Polícia Civil.>
Conselheira Estadual da OAB e integrante da Comissão Estadual de Proteção aos Direitos da Mulher, a advogada Luciana Santos Silva declarou que as supostas vítimas do médico possuem entre 18 e 30 anos. “São coisas graves que relataram. É uma realidade triste que a gente ainda vive num pais patriarcal, machista”, falou. Foto: Divulgação Denúncia nas redes As denúncias contra o médico iniciaram por meio de um perfil anônimo na rede social Instagram, chamado @diganaovca (as últimas três letras se referem a Vitória da Conquista). O perfil foi criado no dia 10 de maio por uma mulher que se disse assediada durante uma consulta.>
A pessoa que administra a página afirma que “há algumas semanas esteve no consultório do médico Orcione Júnior para realizar um exame preventivo" e “no início, a consulta estava seguindo com normalidade, até eu achar estranho/desnecessário ele elogiar o meu clitóris”.>
“Seu clitóris é um pouco grande, mas é bonito e interessante”, foi o que a moça relatou ter ouvido do médico. “A partir daí não tive nem reação para respondê-lo”, acrescentou.>
“A consulta continuou e ele estava colhendo o meu material, até que eu senti que ele estava tentando estimular o meu clitóris, mas como ele ainda estava colhendo o material eu até achei que seria normal. Foi quando ele tirou o espéculo [instrumento usado para dilatação], mas ainda sim continuou na tentativa de me estimular”.>
A moça diz que, em seguida, o médico pediu para que ela tirasse a blusa, para que ele pudesse examinar os seios da paciente. Logo depois, tentou guiar o braço dela em direção ao pênis, “e no primeiro momento ele obteve êxito, pois eu achava que era a posição correta que o braço teria que ficar e nesse momento eu senti que o pênis dele estava ereto”.>
“Foi aí que eu tirei meu braço de perto dele e só tremia”, relatou a suposta vítima. “Depois, me pediu pra vestir minha roupa e assim eu fiz. Quando voltei, ele me pediu para sentar e foi aferir minha pressão. Ele segurou meu braço de uma forma que queria que a minha mão passasse novamente no pênis dele, mas eu esquivei e coloquei em cima da mesa”.>
A moça diz que “talvez eu não tenha sido a primeira, mas tenho certeza que não serei a última, fui atrás de um profissional e me deparei com isso. Minha mente ficou perturbada por dias”, diz o relato complementar publicado no Instagram, onde foram publicadas outras histórias anônimas de mulheres que se dizem assediadas de forma semelhante.>
Até o início da noite desta terça-feira (14), a conta reunía 6.317 seguidores. O advogado Paulo de Tarso, que defende o médico Orcione Júnior, disse que entrou com ação judicial contra o Facebook para que o perfil seja tirado do ar. Para o advogado, “o que está ocorrendo é um linchamento virtual”.>
Paulo de Tarso disse que já havia identificado a autoria da mulher que criou o perfil e fez o relato, contudo, a mulher indicada conversou com o CORREIO e afirmou que nunca foi atendida pelo médico e que apenas compartilhou a informação recebida sobre a denúncia: “Eu nem conheço a autora da denúncia, só achei o caso absurdo”.>