Viva a Opinião

por Aninha Franco

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Publicado em 21 de abril de 2018 às 06:53

- Atualizado há um ano

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Hoje, há 262 anos, o poder português enforcou e esquartejou Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes da cidade de Vila Rica, nas Minas Gerais, porque ele e mais dezenas de outros, entre os quais os poetas Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga, conspiraram contra o regime tentando afastá-lo do Brasil. Dos acusados, Cláudio se enforcou na cela e Tiradentes, o mais pobre deles, foi condenado à morte, esquartejado com vários pedaços do corpo distribuídos em locais estratégicos das Minas, e a cabeça no lugar onde o esquartejado morava, para servir de exemplo a possíveis seguidores.

A sentença a Tiradentes exibe a forma como Portugal tratava os que pretendiam usurpar-lhe a colônia: “Portanto, Portugal condena o réu‚ Joaquim José da Silva Xavier, alferes da tropa paga da capitania de Minas, que com baraço e pregão seja conduzido pelas ruas ao lugar da forca e nela morra de morte natural, para sempre! (...) e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Vila Rica, aonde em lugar mais público seja pregada em poste alto, até que o tempo a consuma. (...) Declaram ao réu infame e infames seus filhos e netos, e seus bens serão confiscados pela câmara real. (...) E a casa que vivia em Vila Rica seja arrasada e salgada, e que lá nada mais se edifique. (...) E no mesmo chão onde está esta casa se levante um padrão pelo qual se conserve em memória a infâmia desse abominável réu (...)”.

Logo depois, quatro baianos foram enforcados por ordem de Portugal na Praça da Piedade por pretenderem separar o Brasil do Reino e, mais que isso, acabar a escravização na Colônia, extinta em 1888, e a igualdade de direitos dos seus brancos e negros. Não, a trilha de hoje não é uma anotação histórica sobre as lutas de libertação do final do século 18, é sobre como nós evoluímos pouco nesses últimos 200 anos. E como estamos evoluindo rapidamente nos últimos 20 anos, talvez graças aos projetos dos garotos do Vale do Silício. Sim, eles são jovens e praticam burradas, mas possivelmente sem querer alteraram para sempre a história da opinião no planeta, sem que dessa vez o Brasil tenha ficado de fora.

A opinião está ao alcance de todos pela primeira vez neste Brasil onde ter livros sempre foi perigoso e onde só foi permitido publicá-los depois que um português separou a colônia do colonizador e se tornou seu imperador. Sim, o Brasil foi libertado por seu opressor na sequência de loucuras históricas que os brasileiros vivem desde o princípio e continuam vivendo agora.

Agora, a opinião está convivendo com milhares de manifestações, algumas explosivas, algumas desatinadas, algumas profícuas, todas expostas nas redes ou na imprensa depois de décadas republicanas de autoritarismo, de censuras, repressões e mortes. Recomenda-se àqueles que falam “do golpe de 2016”, que leiam o conteúdo do AI-5 que acuou o Brasil de 1968 a 1978, sem que o habeas corpus pudesse ser requerido.

Quando isso tudo é possível no Brasil onde há 130 anos, no mês de abril, havia humanos escravizados andando nas ruas, e onde há 48 anos se alguém publicasse este texto seria preso e, quem sabe, esquartejado, é preciso comemorar a liberdade da opinião, lembrando dos que morreram em seu nome.