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Paula Theotonio
Publicado em 22 de setembro de 2022 às 14:49
- Atualizado há 2 anos
A colunista Paula Theotonio entre barricas de vinho (divulgação) Você certamente já ouviu ou leu que tal vinho fermentou ou maturou em barricas de carvalho. Ou até mesmo já sentiu aromas amadeirados nos vinhos que degustou. Mas sabia que o uso desses recipientes vai muito além de emprestar sabores e aromas às bebidas? E que existem diversos tamanhos de barris e até outros tipos de madeira utilizadas no vinho?>
Quando começamos a usar barricas de carvalho? Recipientes de madeiras diversas, barro e cerâmica já eram utilizados há milênios para armazenar líquidos como cerveja, água, óleo, mel e vinagre; metais preciosos; pregos; pós e minerais; bem como para a conservação de alimentos. Heródoto, historiador grego, foi o primeiro a registrar o uso de barris de madeira de palmeira no transporte de vinho armênio para a Babilônia (Mesopotâmia).>
Mas o formato atual — ovalado, resistente e mais fácil de transportar — foi criado pelos celtas, que já estavam usando madeira da árvore do gênero Quercus (madeira fina em celta) para construir barcos. A escolha por essa matéria-prima parecia lógica: era abundante em território europeu e mais resistente à água que outras madeiras. Rapidamente o recém-criado barril de madeira foi difundido pelos gregos e romanos, que passaram a utilizá-lo para armazenamento de vinhos.>
Porém demorou bastante tempo até que os produtores de vinho percebessem que, além de trazer praticidade, as barricas traziam uma outra característica para suas bebidas.>
Como a barrica influencia o vinho? Hoje sabemos que a madeira altera a composição química do vinho. Ao mesmo tempo em que empresta sabores, aromas e taninos à bebida, sua porosidade permite uma ação lenta e microscópica do oxigênio, deixando-o mais macio, menos adstringente e de coloração mais estável.>
Porém nem todas as barricas são iguais, portanto essa influência varia bastante. Há diferentes tamanhos; e quanto maior, menor é sua influência no vinho. Há barris com 225 litros, como a clássica de Bordeaux, e foudres enormes que podem carregar um lote inteiro.>
A espécie de carvalho utilizada para fazer o recipiente também faz toda a diferença. Os mais porosos, como o carvalho americano (Quercus alba), permitem uma maior extração de sabores e taninos da madeira. Este normalmente agrega notas de baunilha, coco, manteiga e outras notas adocicadas.>
Os menos porosos, como o francês (Quercus robur, Quercus petraea), influenciam o vinho de maneira mais sutil, adicionando notas defumadas, de cravo e de cedro. Há espécies diferentes na França, Estados Unidos, Croácia, Eslovênia, Hungria, Rússia; e o enólogo faz sua escolha baseado justamente em como deseja influenciar o vinho.>
Há, ainda, barricas que não são de carvalho. A madeira da acácia é conhecida por dar mais corpo e maciez aos vinhos, nem necessariamente aportar aromas amadeirados. A barrica de cerejeira aumenta as notas de cereja e frutas vermelhas; e a castanheira permite maior micro-oxigenação. A madeira brasileira jequitibá rosa, por sua vez, aporta aromas doces, com traços de anis, açúcar caramelizado e melado.>
O grau de tosta da madeira também muda tudo! Carvalhos com tosta leve interferem no vinho de maneira mais delicada e aporta aromas abaunilhados. A média adiciona aromas de cacau e baunilha; a média plus dá aromas de café, toffee, frutos secos e mel; e a forte oferece aromas defumados e de tabaco.>
Além disso, barricas novas costumam impactar mais os vinhos que aquelas que já foram usadas. Após cinco ou mais utilizações, passam a ser usadas apenas para armazenamento do vinho; e embora não já não influenciem no sabor, seguem promovendo a micro-oxigenação da bebida.>
Vinho que amadureceu em barrica é melhor? É mito que o estágio em barricas seja garantia de qualidade; ou que torne o vinho superior aos demais. A madeira simplesmente altera o perfil da bebida, deixando-a com um estilo próprio. É um instrumentos dos enólogos tal qual os tanques de aço e as ânforas de barro. Há brancos, rosés e tintos excelentes que nunca passaram por qualquer estágio em madeira, como os brancos da região de Chablis.>
Porém o perfil amadeirado ou mais macio dos vinhos é bastante desejado no mercado; e algumas técnicas alternativas (e mais baratas) têm sido empregadas para alcançar mais rapidamente o efeito das barricas.>
O sabor amadeirado também pode ser alcançado pelo uso de aduelas, lascas e até serragem de carvalho. O resultado da micro-oxigenação, por sua vez, pode ser alcançado com a adição de oxigênio de maneira controlada à bebida.>
Quem faz as barricas de carvalho? As tanoarias são os locais onde se fazem barris de madeira e os tanoeiros são os profissionais que produzem esses recipientes. Um dos mais importantes negócios deste segmento no país é a Tanoaria Mesacasa, localizada no município de Monte Belo do Sul (RS). Porém seus principais clientes não são vinícolas, mas sim cachaçarias brasileiras que usam diversos tipos de madeira.>