Acesse sua conta
Ainda não é assinante?
Ao continuar, você concorda com a nossa Política de Privacidade
ou
Entre com o Google
Alterar senha
Preencha os campos abaixo, e clique em "Confirma alteração" para confirmar a mudança.
Recuperar senha
Preencha o campo abaixo com seu email.

Já tem uma conta? Entre
Alterar senha
Preencha os campos abaixo, e clique em "Confirma alteração" para confirmar a mudança.
Dados não encontrados!
Você ainda não é nosso assinante!
Mas é facil resolver isso, clique abaixo e veja como fazer parte da comunidade Correio *
ASSINE

Busca por restos mortais de 100 mil escravizados é iniciada em cemitério redescoberto em Salvador

Corpos de escravizados e pessoas à margem da sociedade teriam sido sepultados como indigentes

  • Foto do(a) author(a) Larissa Almeida
  • Larissa Almeida

Publicado em 14 de maio de 2025 às 14:44

Cemitério de escravizados pode estar debaixo do estacionamento da propriedade Crédito: Reprodução/Google Street View

A pesquisa que identificou um cemitério de escravizados do século 18, que desapareceu do mapa de Salvador, dá início, na tarde desta quarta-feira (14), ao procedimento de busca arqueológica pelos restos mortais de aproximadamente 100 mil corpos de negros africanos, pobres, encarcerados e suicidas que podem ter sido sepultados como indigentes. A procura acontece no estacionamento da Pupileira, no bairro de Nazaré.

De acordo com a pesquisadora Silvana Oliveiri, que é responsável pela identificação do cemitério no terreno pertencente à Santa Casa de Misericórdia da Bahia, a expectativa é que a busca arqueológica encontre os restos mortais de 80 mil a 150 mil corpos no local.

Ela conta que não sabia da existência do cemitério, mas que passou a despertar para essa possibilidade quando viajou para Belém, no Pará, e descobriu um cemitério de indígenas e indigentes em uma região que é popular pela aparição de visagens. Quando retornou à Salvador, passou a vasculhar livros de história e de arquitetura, quando se deparou com mapas que indicavam a existência de um espaço similar na cidade.

"Nossa pesquisa, que era sobre a localização do espaço fúnebre, acabou servindo também para que as pessoas soubessem que esse local existia em Salvador. Houve um apagamento brutal desse lugar e, agora, nós vamos dar esse primeiro passo grande e irreversível rumo a reparação", destaca.

A arqueóloga Jeanne Almeida, que vai ser uma das responsáveis pelas escavações, detalhou o passo a passo das buscas, que deve durar 10 dias. "Na tarde de hoje, vamos fazer a marcação e fazer a retirada da camada inicial de terra. A partir de agora, vamos trabalhar até conseguir localizar os indivíduos que estamos buscando. Já escolhemos locais pontuais de acordo com a maior potencialidade arqueológica e são neles que vamos fazer as intervenções", conta.

Os pesquisadores vão atuar das 7h às 16h nos dias de semana e das 8h às 12 no sábado. Segundo Jeanne, a alta intensidade das buscas é proporcional ao desejo de revelar à sociedade o que pode ser o mais antigo cemitério de escravizados do Brasil e o maior da América Latina.

"Espero que a gente possa trazer para a sociedade essas evidências para atualizar a discussão sobre o racismo e a discriminação social. Que a gente possa trazer a sociedade para discutir esse estigma e, através disso, trazer estratégias de reparação", finaliza Jeanne Almeida.

Ato inter-religioso

Na manhã desta quarta-feira (14), antes das buscas começarem, cristãos, islâmicos e candomblecistas se uniram em um ato inter-religioso para honrar a memória dos escravizados e pessoas à margem da sociedade que possivelmente foram enterradas no estacionamento da Santa Casa Bahia. O momento também contou com a presença de pesquisadores e autoridades governamentais.

Gicélia Cruz, representante do Coletivo Negro Evangélico (Cuxi), celebrou a iniciativa de resgatar a memória de quem não teve direito, em vida, de ter acesso a dignidade. “Acredito que aqui vários irmãos e irmãs foram enterrados de forma indigna. O Deus que nós cremos é misericordioso, de justiça e o que cura. É o Deus que age de forma a ter chegado esse tempo de celebrarmos e agirmos com justiça. Isso aqui é um ato de justiça que a branquitude, ao longo de séculos, quis apagar”, apontou.

Para a mãe de santo Ubiracira Daniel de Paula, a redescoberta do cemitério representa uma chance de ampliação do direito à cidade. “Vai ser um espaço muito importante para todos que são da religião africana. A ancestralidade é muito forte e significa continuidade para nós que estamos aqui”, falou.

Padre Lázaro Muniz, por sua vez, ressaltou que lembrar os ancestrais é um convite a lembrar a origem da população soteropolitana. “Com certeza, a escavação que será feita aqui vai trazer grandes histórias e pode, talvez, desencadear uma grande escavação em todo o Campo da Pólvora. Tudo isso em prol de uma reparação, que é o que podemos fazer”, disse.

Sheikh Ahmad, representante do Centro Cultural Islâmico da Bahia (CCIB), deu ênfase à importância do trabalho em conjunto entre as diferentes religiões para a busca de direitos e reparação do povo negro. “Se continuarmos assim, nos vendo como um único povo que quer lutar pelos direitos que temos, vamos ter sucesso”, finalizou.