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Priscila Natividade
Publicado em 18 de agosto de 2018 às 17:03
- Atualizado há 2 anos
Quem passa na avenida J.J Seabra não consegue imaginar que ali funcionou o cinema de rua mais importante do estado. A fachada, ao invés de tirar o fôlego pela sua imponência – reflete só abandono. Solitária, uma hélice da ventilação gira diante do que sobrou das janelas destruídas e do prédio em ruínas. Contra o descaso, o Cine-Teatro Jandaia, na Baixa dos Sapateiros ganhou na manhã deste sábado (18) um abraço. >
O ato simbólico promovido pelo Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) promoveu nacionalmente e ao mesmo tempo, eventos onde arquitetos, urbanistas e urbanistas e defensores da preservação do patrimônio cultural se mobilizaram a favor da revitalização de bens arquitetônicos e urbanos em estado de arruinamento ou abandono.>
A iniciativa integra as comemorações do Dia Nacional do Patrimônio, celebrado ontem (17). De acordo com o presidente nacional do IAB, Nivaldo Andrade, entre os 20 edifícios abraçados no país, em Salvador, o Jandaia foi escolhido por conta da sua importância história para a cidade. >
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“Após o surgimento dos cinemas de shopping nos anos 80, alguns cinemas de rua fecharam, outros viraram igrejas e tiveram também os que viraram pornôs. O movimento tem por objetivo trazer o olhar, chamar a atenção para a história e cultura que esses espaços trazem e o abandono que se encontram”, destaca Andrade. >
De colorido na fachada do prédio, só mesmo as cangas de praia vendidas pelo ambulante, Antônio Souza, de 75 anos. “Era bom que estivesse aberto, porque aí a gente tinha ainda mais clientela. Trabalho na frente deste cinema há 34 anos vendendo canga por R$ 25 e chapéu por R$ 10. Sempre gostei de trabalhar aqui porque a gente fica no centro do movimento, Eu espero que essa coluna aqui que eu amarro as minhas cangas nunca caia”. >
Logo ali em frente do cinema, o gerente da loja Marivan Modas, Joelson Miranda, 37 anos, queria mesmo é que ali fosse construído um shopping. “É um desperdício. Seria uma solução para revitalizar a Baixa dos Sapateiros. É muito preocupante ver o tempo passar e isso fica da vez mais perigoso. O que não falta é opção do que fazer com esse espaço. Falta é vontade”, reclama. Ainda de acordo com ele, que trabalha há 12 anos no estabelecimento, muito cliente antigo costuma lembrar com saudosismo do Jandaia. “Todo mundo diz que era muito famoso, bonito e movimentado”, completa. >
Recém-chegado na vizinhança, o proprietário do lava-jato que ainda não tem nome mas faz esquina com o cinema, Antônio Carlos da Silva, 48, defende que o prédio seja aproveitado como um centro cultural com oferta de cursos de arte e profissionalizantes abertos para a população. “Abri hoje o lava-jato e escolhi o local pelo fluxo de pessoas. O Jandaia é um espaço perdido. Isso aqui era para estar gerando empregos e não para ficar abandonado desse jeito”. >
História>
De um modesto galpão com telhado de zinco para um prédio cheio de luxo e presença em uma área de 1,2 mil m2, a sala foi inaugurada em 1911 e ampliada em 1931, década que alcançou o seu auge em um dos mais movimentados centros comerciais da cidade. O Jandaia foi o primeiro cinema do nordeste a adquirir aparelhos para a exibição de filmes sonoros e recebeu também artistas como Carmem Miranda, Pablo Neruda, Raul Roulien, Procópio Ferreira, Zoraide Aranha e Bidu Saião, Vicente Celestino e Lamartine Babo. >
O Jandaia fechou nos anos 90, exibindo filmes pornográficos e de artes marciais. Só em 2011, o governo do estado decretou o tombamento provisório do cinema, tombado definitivamente em 2015, quando pertencia a Carlos Valensi, um descendente de franceses que mora no Rio de Janeiro e é herdeiro de uma rede de cinemas em várias cidades brasileiras. Entre as obras emergenciais estavam previstas uma reforma de conservação e mais a recuperação dos vitrais cinco metros de altura e 3,5 metros de largura da fachada do espaço. >
Segundo a Secretaria da casa Civil, com o projeto requalificação do Centro Antigo de Salvador, o Governo do Estado manifestou a intenção de desapropriar o prédio do Cine Jandaia, o que gerou a instauração de um inquérito civil, por parte do Ministério Público da Bahia (MPBA). >
Durante o processo, os proprietários do equipamento declararam interesse em doar o bem para o Estado. A oferta foi aceita e o inquérito encerrado. Nas tratativas, o Estado assumiu e quitou a dívida de IPTU do imóvel. Atualmente, equipamento encontra-se em processo final para ser incorporado ao patrimônio do Estado.>