Entenda o que levou a PF a pedir prisão do publicitário baiano João Santana, o Patinhas

Ele e a mulher, a também jornalista e publicitária baiana Mônica Moura, figuram entre as oito pessoas com prisão decretada pela Justiça Federal

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  • Da Redação

Publicado em 23 de fevereiro de 2016 às 09:11

- Atualizado há um ano

Policiais vasculham apartamento de João Santanano Corredor da Vitória (Foto: Marina Silva)Aos amigos mais íntimos, o marqueteiro baiano João Santana, o Patinhas, sempre revelou o maior temor de sua vida profissional: repetir a trajetória do conterrâneo e ex-sócio Duda Mendonça, que sacudiu a República ao confessar o recebimento, no exterior, de dinheiro de caixa 2 de campanhas do PT. Nesta segunda (22), dez anos e meio após o depoimento do colega à CPI dos Correios, em agosto de 2005, Santana confrontou o velho medo bem de perto, quando se tornou alvo da 23ª fase da Lava Jato, a Operação Acarajé.Ele e a mulher, a também jornalista e publicitária baiana Mônica Moura, figuram entre as oito pessoas com prisão decretada pela Justiça Federal do Paraná na nova etapa da operação. O casal só não foi levado pelos agentes da Polícia Federal na manhã de ontem porque estava na República Dominicana, no Caribe, onde cuidam da campanha do presidente Danilo Medina à reeleição. No entanto, tiveram os endereços na Bahia e São Paulo vasculhados por equipes da PF e investigadores da Receita.  Na lista de 38 alvos de busca e apreensão, constam o apartamento de João Santana no Corredor da Vitória, a mansão que ele tem no condomínio Interlagos, Litoral Norte, e escritórios da empresa Polis Propaganda em Ondina e São Paulo. Neles, os agentes recolheram arquivos, computadores, documentos, obras de arte e veículos. EstopimA PF fez varredura também em outro apartamento do marqueteiro, situado na capital paulistana. A compra do imóvel, segundo a PF, está diretamente ligada à origem da investigação que levou João Santana e Mônica Moura ao topo da vidraça da Lava Jato. Um caso que começa em fevereiro do ano passado, a partir da apreensão de documentos na casa do engenheiro Zwi Skornicki, preso preventivamente ontem sob suspeita de intermediar repasses ao publicitário via offshores indicadas pela Odebrecht. Em entrevista na Superintendência da PF no Paraná, os investigadores da Lava Jato informaram que a polícia havia apreendido, na casa de Skornicki, um bilhete em que a mulher do marqueteiro dá orientações sobre envio de dinheiro para contas do casal no exterior. O papel, assinado por Mônica (com sobrenome Santana), foi enviado a funcionários da construtora, apontados como responsáveis pelos pagamentos. O destino dos repasses seriam contas na Suíça, a partir de financeiras localizadas nos Estados Unidos. A informação foi obtida através de cruzamento de documentos enviados dos Estados Unidos com provas de fases anteriores da investigação e da Receita. João Santana e Mônica Moura: casal com influência na cúpula do poder (Foto: Cintia Reis/Divulgação)Os papéis, segundo a Lava Jato, comprovam que João Santana e a mulher são controladores da offshore Shellbil Finance, aberta no Panamá. Contas dessa empresa receberam pelo menos US$ 7,5 milhões, entre 2012 e 2014, da Odebrecht e de Skornicki. A suspeita é de que os recursos tenham sido desviados do esquema de corrupção na Petrobras para pagar parte das campanhas do PT, incluindo a da presidente Dilma em 2014.  Além do bilhete, a PF diz ter outra prova que liga o marqueteiro a uma conta da Shellbil no banco suíço Heritage: um contrato encaminhado à Skornicki por Mônica Moura, com sua assinatura, firmado entre e Shellbil e a Klienfeld, offshore ligada à Odebrecht e investigada pela PF, segundo informou o delegado Filipe Hille Pace, da força-tarefa da Lava Jato.Outros alvosEndereços da Odebrecht na Bahia, Rio e São Paulo também foram alvos da Operação Acarajé. Nome que, segundo a PF, era usado como sinônimo de dinheiro vivo. Executivos e funcionários da empreiteira tiveram prisão decretada ontem. Dois estavam no exterior - Benedito Barbosa Júnior, diretor-presidente da Construtora Odebrecht, que ainda ontem prometeu se entregar, e Fernando Migliaccio. Secretária da empresa, Maria Lúcia Tavares foi detida em Salvador e levada para o Paraná. Dois suspeitos de operar transações - Vinícius Borin e Marcelo Rodrigues -  tiveram prisão efetuada. Houve ainda mandados de condução coercitiva contra cinco pessoas, incluindo o executivo Hilberto Filho, da Odebrecht na Bahia, que teve o apartamento vasculhado no Jardim Apipema.

Patinhas, seis presidentes e poder no Planalto

João Cerqueira de Santana Filho, 63 anos, começou a ganhar notoriedade como Patinhas, apelido dos tempos em que estudava Jornalismo na Universidade Federal da Bahia (Ufba) e era tesoureiro do diretório estudantil. A alcunha, em referência ao tio  mão-de-vaca do Pato Donald, foi mantida ao longo de anos pelo baiano nascido em Tucano e se tornou conhecida na fase em que ele foi um dos principais compositores do grupo Bendegó, um dos “filhos” do Tropicalismo.

“Sou um anfíbio nesse meio. Sou baiano, mas vim do meio jornalístico e artístico e desemboquei na publicidade. Modestamente, tento buscar o que há de melhor em cada corrente”, definiu-se Santana à Revista IstoÉ em 2013, quando foi considerado um dos 60 brasileiros mais influentes daquele ano. Foi o 53º, para ser exato. 

Como jornalista, fez fama em 1992 ao entrevistar, para a IstoÉ, o motorista Eriberto França, personagem que representou a derrocada do ex-presidente Fernando Collor. Anos depois, foi o responsável direto pela reeleição do ex-presidente Lula em 2006 e pelas vitórias da presidente Dilma Rousseff em 2010 e 2014. Santana também dirigiu as campanhas de Hugo Chávez, na Venezuela; Mauricio Funes, em El Salvador; José Eduardo dos Santos, em Angola; e Danilo Medina, na República Dominicana, onde estava atualmente. 

Antes de virar guru dos luminares do PT, com alta influência no Planalto, foi sócio do marqueteiro baiano Duda Mendonça, com quem participou da campanha de Lula em 2002. Rompeu para criar a própria empresa, iniciando a trajetória que o tornou alguém que, mesmo sem cargo no governo, tinha status de ministro, do tipo ouvido nas decisões mais importantes. 

Desde que virou “o homem que elegeu seis presidentes”, o marqueteiro rejeitou completamente o apelido. Passou a se chatear com quem ainda o via como o velho “Patinhas”. Seu patrimônio agora incluia apartamento no Edifício Arthur Moreira Lima, Corredor da Vitória, com teleférico para a Baía de Todos os Santos, mansão em Interlagos, imóveis em São Paulo e carros esportivos que, diga-se, não combinam mesmo com o tio do Donald.

Donaldson Gomes