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Da Redação
Publicado em 6 de janeiro de 2018 às 05:00
- Atualizado há 2 anos
(Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Entre o vai e vem dos ventos da praia de Patamares, o aroma e a brisa do mar dão lugar a um odor desagradável. Além do fedor de esgoto, a coloração da água, mais escura que o normal, avisa que algo não vai bem por ali. Mas não é de hoje: o problema na região começou há cerca de duas semanas, segundo frequentadores.>
A Empresa Baiana de Água e Saneamento (Embasa), ligada ao governo do estado, percebeu há uma semana que era preciso fazer uma manutenção da emergência na rede coletora de esgoto da região.>
Ontem, no entanto, no dia da manutenção, o sistema parou de vez e a Embasa recomendou que os banhistas evitem o mar na área por pelo menos cinco dias. “Com a interrupção do funcionamento do interceptor, o esgoto coletado por essa tubulação é extravasado para o Rio Jaguaribe e, consequentemente, para a praia onde está situada sua foz, no caso, a praia da Terceira Ponte”, explica o órgão, em nota enviada ao CORREIO.>
Em outras palavras, significa dizer que o esgoto sanitário dos bairros de Mussurunga, parte da Avenida Paralela, São Cristóvão, Jardim das Margaridas, Bairro da Paz e Alto do Coqueirinho foi parar no rio - e, de lá, direto no mar.>
O odor tem afastado banhistas, moradores e até comerciantes do local. O educador físico Marcelo Carvalho tinha o hábito de frequentar a praia de Patamares, diariamente. Ele ia até o local para tomar banho de mar e fazer atividades físicas. Abreu, no entanto, se viu obrigado a mudar a rotina depois da fedentina. Agora, ele levanta mais cedo para ir a outra praia.>
“Não tem quem suporte ficar aqui, não. O fedor sempre existiu, mas piorou e a água também está estranha”, disse. De fato, o esgoto que vem do rio passa por baixo da Terceira Ponte, no limite entre as praias de Patamares e Jaguaribe, e segue para Patamares. >
Sem vendas Marcelo não foi o único a ficar no prejuízo. O vendedor Maciano Pereira trabalha em uma das barracas de Patamares e conta que está perdendo de R$ 1,5 mil a R$ 2 mil por causa do fedor.>
“Os clientes chegam com crianças, olham a cor e o fedor da água e vão embora. Ninguém quer ficar na barraca”, conta Pereira. Para ele, esse problema afeta até o turismo da região. “Os gringos ficam com medo da água. Hoje, eu perdi um grupo aqui. A Embasa deveria tomar alguma providência e resolver essa situação”, completa. >
Em nota, a Embasa informou que a manutenção só deve terminar na próxima quarta-feira (10). Até lá, é importante evitar banho na região.>
Foi o que fez a doméstica Lindinalva Sena, que foi ontem à praia de Patamares. Acompanhada da família, ela passou a tarde na areia, com receio de entrar no mar por causa da cor da água. “Preferi não tomar banho, porque com essa água, tenho medo de entrar no mar e pegar alguma doença”, conta. Ao tomar banho em praias impróprias, o banhista corre risco de contrair doenças gastroentéricas, vômito, diarreia e, em casos mais graves, até a hepatite A.>
Outras praias A metros do Rio Jaguaribe está a praia que leva seu nome. Por lá, a coloração do mar ainda é a mesma, mas, o odor também afeta os banhistas. A doméstica Márcia Ramos disse que conseguia sentir o fedor de longe. “É um mau cheiro insuportável. Eu saí de lá, mas, às vezes, bate aqui”, conta, se referindo a Jaguaribe.>
Para fugir do fedor em Patamares, teve gente que correu para a praia vizinha, o que também não é recomendado. De acordo com o diretor de Águas do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), Eduardo Topázio, a presença do rio faz com que a praia já seja imprópria para banho.>
“Essa praia de Jaguaribe, independente do problema da Embasa, está imprópria para banho por causa do Rio Jaguaribe, que está poluído”, explica. Ontem, o Inema enviou uma equipe até o local para acompanhar os trabalhos e dimensionar o volume de dejetos descartados.>
A análise leva 48 horas para ficar pronta. Foram coletadas amostras em seis pontos diferentes dos que já são avaliados semanalmente para o boletim de balneabilidade, que avalia as condições das praias. Segundo Eduardo Topázio, a olho nu não é possível observar uma alteração significativa na água do mar, já que fica distante do ponto de concentração de esgoto derramado, no rio. Ainda segundo ele, a água do mar não favorece a proliferação de bactérias.>
O oceanógrafo Marcelo Caetano afirma que o lançamento de esgotos no local pode influenciar outras praias, como Piatã e Pituaçu, por conta de fatores como vento, ondas, correntes e maré. “O ideal para se saber o alcance da poluição é fazer uma modelagem numérica para o local. Entretanto, é muito difícil que a poluição restrinja-se a apenas uma praia”, diz.>
Canalização de rio é motivo de protestos O problema que afeta agora a região da Terceira Ponte, segundo a Embasa, não tem relação com as obras de canalização do Rio Jaguaribe, tocadas pela Companhia de Desenvolvimento Urbano da Bahia (Conder), ligada ao governo do estado. >
Em relação à canalização, o problema não é tão novo. O projeto, que prevê a requalificação de canais com extensão total de 10.135 metros, a partir do revestimento de parte das margens, foi anunciado no ano passado. De acordo com professora e integrante do Movimento Jaguaribe Vivo, Lavínia BomSucesso, manifestações e “provocações” já foram feitas para que a proposta de canalização do Rio Jaguaribe seja analisada novamente. >
“O rio está sofrendo com esgotos sanitários. O rio nunca esteve tão ruim, a água está preta e até passeando de carro dá pra sentir o cheiro desagradável. Ali deveria ser uma área de cuidado”, diz a professora. Ela teme que em breve a área esteja imprópria para banho. “Daqui a pouco, o rio vai tá impróprio para uso. E a gente salientou que isso poderia acontecer muito antes da obra começar. Não somos contra o projeto e sim contra essa concepção”, conta.>
Integrante da ONG Gambá, a bióloga Maira Azevedo prevê diferentes impactos para a população e para o rio. “A gente se importa com qualidade. Quando existe um projeto como esse, há a perda de convivência e espaços naturais”, diz. Ela alerta para a perda da biodiversidade do rio. “Geralmente, a proliferação e nutrientes nos rios geram a perda de espécies, porque apenas uma ou duas ficam no local”, completa.>
Procurada, a Conder não se manifestou em relação ao caso.>
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