Inema já tinha notificado quatro vezes Marinha sobre barragem do Rio dos Macacos

Cerca de 110 famílias vivem no entorno da barragem

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  • Bruno Wendel

Publicado em 18 de maio de 2020 às 10:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Divulgação/Quilombo Rio dos Macacos

A ausência de um Plano de Ação de Emergência (PAE) para a barragem do Rio dos Macacos não é um problema novo. Após vistorias anuais no açude que abastece a Base Naval de Aratu, o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) notificou quatro vezes a Marinha do Brasil (MB) pela falta do plano que deve ser elaborado com base em estudos técnicos de cenários hipotéticos para ações emergenciais no caso de um rompimento. 

De acordo com o relatório de inspeção da Superintendência de Proteção e Defesa Civil (Sudec), ao qual o CORREIO teve acesso, até o começo deste mês havia apenas uma fissura na estrutura do açude, mas, com as chuvas intensas dos últimos dias, o problema se agravou e hoje há, no local, uma rachadura com extensão de 14 metros. O caso vem tirando sono dos moradores da comunidade quilombola que vivem naquela região – cerca 110 famílias. 

“A Marinha tem enviado relatórios, mas incompletos, sem o PAE. Está cumprindo paulatinamente o que foi determinado na fiscalização, alegando até restrições financeiras, e já foi advertida quatro vezes quanto à necessidade de um plano de evacuação. Em caso de rompimento, para onde essa água vai? Qual o trajeto dela? No plano tem que detalhar todo o impacto e o treinamento da população no entorno no caso da ruptura do açude”, declarou, ao CORREIO, o diretor de recursos hídricos e monitoramento do Inema, engenheiro Eduardo Topázio. A fiscalização de barragens na Bahia é do Inema e da Agência Nacional de Águas (Ana) – nos casos em que a estrutura está em rios da União.

No relatório da Sudec consta que a Barragem dos Macacos ainda não dispõe de instrumentação geotécnica e não possui ou não apresentou o Plano de Ação Emergencial (PAE), conforme determina a Lei 12.334/2010. Além disso, a estrutura está classificada como categoria de risco alto e dano potencial associado alto. 

Segundo o diretor de recursos hídricos e monitoramento do Inema, uma ação judicial foi movida contra a Marinha por até agora não ter apresentado um plano de evacuação. A ação prevê uma multa e teria sido movida pelo Ministério Público Federal (MPF). O CORREIO procurou o MPF para saber o andamento do processo, que disse desconhecer essa ação específica. A Marinha do Brasil também foi procurada pelo CORREIO para saber, entre outros aspectos, por que, desde a primeira notificação, não implantou o PAE. Areportagem questionou ainda por que só agora, depois da rachadura de 14 metros - isso aponta o relatório da Sudec - a Marinha se comprometeu em adotar a medida? Até quando o PAE estará em execução? Quais as sanções que a Marinha sofreu por não ter implantado o PAE?  

Por meio de comunicado, a Marinha do Brasil (MB), por meio da Base Naval de Aratu, reiterou que "a preocupação com a integridade da barragem Rio do Macacos é constante, desde a sua instalação no início dos anos 60. Em primeiro lugar, pela segurança das vidas humanas envolvidas, mas também porque ela é o meio de abastecimento do Complexo Naval de Aratu, onde está instalada a Base Naval de Aratu e outras organizações militares, que são de importância estratégica para Força. Desta forma, acata e cumpre sempre todas as determinações que recebe dos órgãos técnicos".

Acrescentou ainda que "a fissura apresentada hoje na barragem não representa risco de rompimento da barragem e é acompanhada diariamente, mantendo-se estável, sem avanço" e que "a equipe técnica da BNA mantém inspeções diárias para acompanhamento do nível de água e das condições do talude da barragem".

O documento diz ainda que a ação mais importante, no momento, é reduzir o nível da água, o que é realizado pelos dispositivos próprios da barragem e também por meio dos sifões auxiliares instalados pela Base.

"Esta ação de redução do nível d’água representou uma diminuição de nível, de ontém (14) para hoje (15), eliminando o escoamento pelo vertedouro. Adicionalmente, a BNA está contratando a instalação de piezômetros no talude da barragem, a fim de aperfeiçoar o monitoramento", diz trecho do documento. 

A Marinha disse ainda que, anualmente, a Base Naval de Aratu recebe notificações do órgão fiscalizador Inema relativas à barragem Rio dos Macacos. "A última visita técnica do órgão ocorreu em 12 de maio. Por meio de documento formal, a Base Naval encaminha as repostas às notificações do órgão e vem trabalhando para atender às demandas do Inema", concluiu.

Na última quarta-feira (15), a Defesa Civil de Salvador (Codesal) recomendou à Marinha do Brasil, por meio de ofício, que sejam realizadas, em caráter de urgência, intervenções na Barragem dos Macacos, entre elas a implantação do plano emergencial. 

Risco Segundo o Inema, não há risco iminente de a barragem se romper.  A estrutura está estável e que a Marinha foi orientada retirar parte da água da barragem para diminuir o nível. “Quando uma barragem vai romper dar sinais com antecedências, como, por exemplo, não vazamento no corpo da barragem. Mas isso não quer dizer que se deve ignorar o risco. Não vai romper nem hoje, nem amanhã, nem depois, mesmo assim medidas precisam ser adotadas. O problema é que a gente tem o hábito de postergar as coisas”, disse o diretor de recursos hídricos e monitoramento do Inema, engenheiro Eduardo Topázio.

No dia 7 deste mês, a Sudec constatou o surgimento de uma pequena rachadura no corpo da barragem, provavelmente devido à movimentação do talude (plano de terreno inclinado que limita um aterro e tem como função garantir a estabilidade do aterro). Três dias depois, técnicos do órgão realizaram uma nova vistoria e constataram que agora a fissura evoluiu para uma rachadura de 14 metros devido às fortes chuvas no início do mês. “Técnicos contratados pela Marinha avaliaram que não há ricos da barragem se romper abruptamente e asseguraram que a rachadura é um problema fácil de se resolver, que inclusive seria solucionado por estes dias”, declarou Topázio.

Ele pontuou ainda que a ruptura possível não está só relacionada ao aumento da capacidade o volume de água do reservatório por causa da chuva. A barragem do Rio dos Macacos, que possui o volume de 300.000 metros cúbicos de água, está situada abaixo de um outro açude, de menor capacidade. “Apesar de possuir menor tamanho, qualquer volume de água que desça, em caso de rompimento, pode causar impacto na barragem maior. Esse açude em questão está abandona e estamos atrás dos proprietários”, pontuou o diretor de recursos hídricos e monitoramento do Inema. 

A barragem Rio dos Macacos teve sua construção finalizada no ano de 1957 e está localizada próxima à Base Naval de Aratu, da Marinha do Brasil, no município de Simões Filho, situada na latitude -12.833021° e longitude -38.45464°. A barragem em questão possui estrutura de terra, sendo o abastecimento da Base Naval sua principal finalidade. No entorno vivem cerca de 110 famílias do Quilombo do Rio dos Macacos, que resiste desde que o país ainda era colônia de Portugal – a área pertencia às fazendas Aratu, Meireles e, principalmente, Macacos, que cultivavam cana de açúcar na região, por isso, muitos dos habitantes originais eram negros escravizados.