Museu submerso: mais dois navios serão afundados na Baía de Todos-os-Santos

Ordem para afundamento do ferryboat Juracy Magalhães e do casco do navio-varredor Anhatomirim foi assinada nesta quinta (20)

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  • Da Redação

Publicado em 20 de abril de 2023 às 20:22

- Atualizado há um ano

. Crédito: Camila Souza/Govba

Nesta quinta-feira (20), a Secretaria de Turismo do Estado (Setur-BA) realizou uma solenidade para assinar a ordem de serviço que autoriza o afundamento controlado do ferry-boat Juracy Magalhães, que está inativo, e do casco do navio-varredor Anhatomirim, doado pela Marinha.

A empresa que venceu a licitação para assumir o serviço foi a Engesub, corporação de engenharia e serviços submarinos especialista em naufrágios assistidos. O valor total investido na execução foi de aproximadamente R$740 mil, o que inclui a feitura dos documentos necessários, o descarte de materiais poluentes das embarcações e o assentamento dos navios na água, no local escolhido entre o governo do estado e a Marinha.

A solenidade teve entre os participantes as secretarias estaduais do Meio Ambiente (Sema) e de Infraestrutura (Seinfra), o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), o 2º Distrito Naval e o Conselho Baiano de Turismo (CBTur). 

O afundamento assistido consiste em naufragar navegações que já não estão em uso, evitando que virem sucata. Para que a submersão aconteça, muitas etapas são necessárias. De acordo com Maurício Bacellar, Secretário de Turismo da Bahia, o trabalho é meticuloso: primeiro, é preciso escolher locais com profundidade e transparência seguras o suficiente para os mergulhadores e se certificar de que não haja corrente marinha para deslocar o navio ou cabos de comunicação ou de energia por perto. Depois, furos são feitos em locais específicos no casco para que o navio desabe e assente em pé, como se fosse navegar. 

De acordo com a Setur, a medida visa incentivar o turismo de mergulho e a memória náutica, construindo o maior parque de turismo de mergulho e de contemplação urbano do Brasil. “O que a gente está fazendo no fundo do mar é guardar a memória de um tempo, a engenharia de um determinado tempo da navegação brasileira. Quando a gente afunda, além de estimular a vida marinha, a gente está preservando a memória de uma época da navegação. É um museu de navegação submerso, que fica guardado no fundo do mar”, afirma Bacellar.

Em 2020, o ferry Agenor Gordilho e o rebocador Vega passaram pelo processo de afundamento. Segundo Bacellar, o monitoramento dessas embarcações permite perceber os benefícios dos recifes artificiais em que os navios se transformaram para a fauna e a flora marinhas.

Impacto ambiental Para que o processo não cause danos ao meio ambiente, um dos principais requisitos para participar da licitação foi que a empresa vencedora fosse especialista em naufrágios assistidos. A empresa também será responsável pela retirada de todos os materiais tóxicos das embarcações. De acordo com Maurício Bacellar, haverá a desinfecção total e os produtos poluentes, como óleos, serão descartados em locais apropriados.

Francisco Kelmo, Doutor em Zoologia e Ecologia Marinha e Diretor do Instituto de Biologia da Universidade da Bahia (UFBA), afirma que o afundamento de navios pode ser benéfico, mas, caso não haja o monitoramento contínuo por parte do governo, espécies invasoras podem se proliferar nos cascos das embarcações e causar danos à fauna local. O biólogo reforça a necessidade de haver um programa perpétuo de monitoramento e acompanhamento por parte do governo, para acompanhar o processo de colonização dos cascos das embarcações.

A Setur afirma que a atenção à sustentabilidade durante o processo será minuciosa. De acordo com o órgão, não há nenhum prejuízo ao meio ambiente pelo afundamento dos navios, já que os materiais que poderiam causar malefícios à vida marinha serão retirados previamente. Eles afirmam ainda que o naufrágio melhora as condições da fauna e da flora, a partir do recife artificial criado rapidamente no casco do navio.

De acordo com Kelmo, sem a disposição correta dos poluentes, as consequências podem ser graves. "O primeiro passo é fazer o descomissionamento das embarcações: retirar todos os resíduos de materiais plásticos, borrachas, componentes que tenham tido contato com combustível, não deixar nenhum tipo de combustível na embarcação. Ou seja, retirar tudo o que possa ser considerado como agente poluidor, como espumas, plásticos, resíduos de químicos, parte de motores, peças, tudo isso precisa ser removido", diz.  

O biólogo ressalta que os afundamentos devem ser feitos com responsabilidade. "Nós não podemos fazer do mar um depósito de sucatas. [...] Nós vamos transformar o fundo da nossa Baía de Todos-os-Santos num verdadeiro depósito de navios, um depósito de lixo e, se alguma espécie invasora chegar e se instalar, o prejuízo para a natureza vai ser imensurável. Então é por isso que o processo tem que ser feito com muito cuidado e precisa ser monitorado por cientistas, por pessoas que estejam devidamente comprometidas com a qualidade do ambiente marinho", defende Kelmo.

As embarcações O ferry boat Juracy Magalhães foi o segundo a ser entregue na Bahia, ainda na década de 1970. Antes dele, veio apenas o Navio Agenor Gordilho, que foi afundado em 2020. Em 1987, o Juracy Magalhães teve o compartimento de veículos aumentado, com capacidade elevada a 96 carros a cada travessia. Hoje, o ferry está fora de operação, ancorado em Bom Despacho, na Ilha de Itaparica. 

O navio Anhatomirim foi desativado em 2016, após mais de quatro décadas à serviço do 2º Distrito Naval. O navio foi construído na Alemanha e acumula 210.053 milhas náuticas navegadas, de acordo com o Comando do 2º Distrito Naval.

No fundo da baía, ainda se destacam três embarcações de naufrágios históricos: Galeão Sacramento (1668), Vapor Maraldi (1875) e Clipper Backdader (1905). 

*Orientada pela subeditora Fernanda Varela.