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Thais Borges
Publicado em 10 de dezembro de 2014 às 07:28
- Atualizado há 2 anos
Qual foi a última vez que você separou o lixo em casa para reciclagem? Se sua resposta foi que deixou o hábito de lado - ou, quem sabe, nunca o teve - porque sequer sabe onde descartar os resíduos, as coisas podem mudar em breve. A capital baiana produz, em média, 70 toneladas de resíduos por mês(Foto: Arquivo Correio)A partir da primeira quinzena de janeiro, Salvador terá 100 pontos de entrega voluntária para a coleta seletiva, segundo o secretário municipal da Cidade Sustentável, André Fraga. A meta da prefeitura é que, até 2016, sejam instalados 200 pontos para que qualquer pessoa possa utilizar.>
“Só que o nosso planejamento vai ser para termos todos os 200 já no final do primeiro semestre de 2015”, adianta Fraga. Os primeiros equipamentos devem chegar até o final desta semana e passar por alguns testes até começar a instalação na cidade.“Estamos saindo do zero. Um programa como esse, associado ao Tudo Limpo, vai deixar a cidade mais sustentável e trazer emprego e renda para as cooperativas (de catadores)”, explica, referindo-se à campanha de conscientização lançada pela prefeitura no mês passado.Os contêineres, que são de plástico, vão receber apenas resíduos secos Ou seja: ainda em casa, o lixo úmido (orgânico e não reciclável, como materiais de higiene pessoal) deve ser separado do lixo seco — basicamente papelão, plásticos, latinhas e garrafas PET.>
Garrafas de vidros também poderão ser descartadas, mas não vidros planos, como janelas e espelhos. Os contenedores não terão divisão entre esses materiais. >
Depois, já no recipiente, os resíduos serão recolhidos e encaminhados a uma das 18 cooperativas cadastradas na Empresa de Limpeza Urbana de Salvador (Limpurb).>
Quando os pontos de entrega (também chamados de ‘ecopontos’) já estiverem instalados, a pessoa deve ir até um deles e lá deixar o lixo, em vez de deixar na porta de casa. Apesar de não garantir que todo mundo vai ter um equipamento a poucos metros de casa, o secretário diz que todos os contêineres vão ficar em locais de fácil acesso.>
Por isso, para os que já vão funcionar em janeiro, eles escolheram grandes avenidas e lugares onde há grande circulação de pessoas (veja o mapa abaixo), como as avenidas Paralela, Manoel Dias da Silva, Bonocô e Silveira Martins.No entanto, ainda não dá para dizer qual será a frequência ou o intervalo de tempo de coleta. “Ainda não foi definido como vai ser feito, nem quantos caminhões vamos usar”, diz Kátia Alves.>
Isso porque, segundo André Fraga, os primeiros 30 dias de funcionamento dos contêineres vão servir como um teste, até para ver se a população vai abraçar a ideia. “Vai ser um termômetro para analisar a necessidade de cada ponto”.>
Até grandes geradores poderão usar os contêineres - desde outubro, quem descarta mais de 300 litros por dia deve fazer sua própria coleta. “A partir da coleta seletiva, eles podem reduzir a quantidade que produzem e voltariam a ter a coleta feita pela Limpurb”, afirma. >
Ao todo, a prefeitura espera gastar R$ 2 milhões, em recursos municipais, para implantar o sistema de entrega voluntária. “Cada um dos equipamentos custa cerca de R$ 5 mil, mas também tem toda uma logística envolvida”, explicou o secretário.>
Um único contêiner pode armazenar seis mil litros de lixo, o que pode chegar a seis toneladas de resíduos.>
Cooperativas >
Hoje, a coleta seletiva é feita somente pelas cooperativas que atuam na cidade. Mas o índice é tão pequeno que não chega a ser significativo. Só para dar uma ideia, todos os dias, Salvador recebe três toneladas de resíduos sólidos e outras três toneladas de resíduos da construção civil (entulho).>
Apenas 1% disso tudo chega até as cooperativas para ser finalmente reciclado, segundo a Secretaria da Cidade Sustentável (Secis). Algumas cooperativas até têm pontos instalados em alguns locais da cidade, mas reclamam de não ter apoio de órgãos públicos. >
Os associados da Canore, do Nordeste de Amaralina, recolhem material descartado em pontos em hotéis, no shopping Center Lapa, em condomínios como Alphaville e supermercados.>
“A gente também pega nos condomínios, cata pelos passeios, pela rua... Hoje, a maior parte dos cooperados tem que sair com carro de mão e ganha, em média R$ 400 por mês. A gente fica isolado do poder público”, conta o presidente da Canore, Manoel Bernardo. >
No total, eles conseguem faturar até R$ 15 mil por mês. A falta de estrutura é uma das maiores dificuldades das cooperativas, segundo o presidente da Associação Jovens em Ação, de Ilha de Maré, Maurício José.>
“O projeto seria benéfico porque muitas pessoas sobrevivem disso”. Na associação, cada catador recebe R$ 200 por mês. A presidente da Limpurb, Kátia Alves, diz que o órgão dá apoio logístico às cooperativas cadastradas. >
“Nós fornecemos os equipamentos para que eles façam a coleta”. Cada uma das associações pode usar um caminhão da Limpurb por até duas vezes na semana, para ajudar a recolher os resíduos.>
Com a instalação dos ecopontos, os resíduos chegarão diretamente às cooperativas, que dão novo encaminhamento ao material — algumas fazem artesanato, outras vendem para fábricas. >
“A tendência com esse projeto é ser positivo tanto para educar o morador que hoje joga lixo na rua como para trazer mais renda para muitas famílias que trabalham com isso”, comenta o presidente da cooperativa Cooperguary, Edmundo Goes. >
Primeiro passo >
Os pontos de entrega são apenas a primeira etapa, segundo André Fraga. A ideia é implementar a coleta seletiva porta a porta. “A população está muito mal-acostumada. Sair de alguém que joga lixo na rua até chegar em alguém que recicla é um desafio, mas precisamos dar o primeiro passo”, explicou André.>
Quando a coleta for feita porta a porta, em um dia específico da semana, os resíduos recicláveis seriam recolhidos da mesma forma que o lixo comum. >
“Só que a logística disso é muito maior e ainda estamos fazendo planejamento”, diz o secretário, que não soube dizer a previsão de início para esse tipo de coleta. Ainda assim, os primeiros estudos da Secis já indicam custos em torno de R$ 32 milhões.>
Lei obriga implantação de coleta, mas modelo é livre>
Todas as cidades brasileiras devem implantar coleta seletiva, segundo a Lei de Resíduos Sólidos, de 2010, mas não há um modelo definido para isso. >
“Cada município pode criar o seu (modelo). Um dos indicativos é que se use cooperativas para tal, como forma de inclusão social”, diz o advogado Bernardo Rocha, especialista em Direito Ambiental. >
No caso das cidades que adotarem os ecopontos, como Salvador, o diretor-executivo da Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre), André Vilhena, alerta que a adesão da população não é imediata. “É um processo, mas é importante começar, pois consolida a consciência nos bairros”. >
No final, as cidades têm pelo menos três grandes benefícios, com a implantação. Além da geração de renda e emprego e da conservação ambiental, também o aumento da vida útil do aterro sanitário, segundo a bióloga Laís Maciel, coordenadora do curso de Engenharia Ambiental e Sanitária da Unifacs.>
“Os aterros têm uma capacidade e, com a coleta, conseguimos diminuir a quantidade de resíduos despejados lá”, explica.>