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Larissa Almeida
Publicado em 15 de junho de 2024 às 11:00
Quem pisa no limite entre o asfalto e o chão de pedras na altura da Rua Chile, no Centro Histórico de Salvador, consegue ouvir, nos fins das tardes de junho, a musicalidade que é fruto da combinação da sanfona, do triângulo e do reco-reco. Alguns passos na direção do som levam à Praça da Sé, uma das estações da festividade junina que, desde o Dia de Santo Antônio, reúne forró raiz, opções de compras artesanais, comidas típicas e espaço para dançar o arrasta-pé no Pelourinho. Ao notar a movimentação no local, com pessoas de todas as idades ocupando o espaço, é difícil imaginar uma época em que a festa não existisse ali. Mas, ao contrário do que muitos pensam, a tradição de curtir o São João no Pelourinho é relativamente recente. >
De acordo com o escritor e jornalista Nelson Cadena, colombiano que tem título de cidadão baiano, até a década de 90 o Pelourinho sequer era frequentado a ponto de ser considerado um local de festa. “O Pelourinho, por muito tempo, foi um espaço degradado da cidade de Salvador. Seria inviável fazer ali não apenas o São João, mas celebrar qualquer festa. As pessoas tinham se afastado, não frequentavam muito o bairro, porque era um espaço marcado pela violência e com um índice de prostituição muito alto. Estou falando isso antes da restauração, que ocorre no período de 1990 até 1992”, aponta. >
Naquele período, a capital baiana como um todo não tinha tradição de realizar festas juninas. Não à toa, o São João era comemorado nos bairros pela meninada que juntava dinheiro para comprar fogos e por grupos de pessoas que preferiam não o forró, mas o samba para vivenciar a festividade. Esse era o caso do produtor e agitador cultural Geraldo Badá. “No meu tempo, o São João era nos bairros, com os samba-duro junino, que hoje, inclusive, é tombado pela lei municipal, e esses grupos estão vindo para o Pelourinho”, diz. >
Depois da restauração concluída em 1992, o panorama do bairro histórico mudou. O local passou a receber turistas, a ser visitado pelos soteropolitanos e engatou, aos poucos, sua potência econômica. No entanto, só oito anos mais tarde passou a ter o São João como uma possibilidade. “O Governo do Estado resolveu, no ano 2000, já com o Pelourinho totalmente recuperado, já ambientado e com frequência tanto de turistas como de baianos, criar o São João do Pelourinho. [...] Eu acho que, pela própria característica depois da recuperação, ficou um espaço mais intimista, lembra um pouco uma cidade interior e um espaço bem acolhedor”, destaca Nelson Cadena. >
Apesar da sensação de intimidade, durante os anos de realização da festa junina, a partir do ano 2000, o Pelourinho registrou alguns conflitos em relação à integridade do espaço, que é considerado patrimônio pelo Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e Unesco. Foi então que comerciantes locais criaram a Associação do Centro Histórico Empreendedor (Ache), que passou a rediscutir, junto à Prefeitura, a organização do São João no bairro. >
“Nós priorizamos um São João mais pé de serra, mais família, sem violência e sem grandes tumultos. O São João do Pelourinho ficou uma coisa muito bacana. Muito modesta, mas que ao mesmo tempo atrai o soteropolitano que quer vir realmente só com sua família. Eu estou aqui há 25 anos e acho isso aqui uma relíquia, uma Champs-Élysées, uma Torre Eiffel, um Cristo Redentor, um Pão de Açúcar. O Centro Histórico é um lugar lindo e junto com o forró, eu adoro”, ressalta Alexsandro Ferreira, proprietário do Boteco do Pelourinho. >
Com 50 anos de vida e de Pelourinho, o empresário Davi Costa, conta que viu a tradição junina nascer no seu hábitat natural conforme foi surgindo a necessidade de uma festa que fizesse contraste com os grandes shows que passaram a ser realizados no Parque de Exposições. “Dentro dessa necessidade, as festas de São João do Pelourinho foram criadas e, entre tentativas e erros, houve festas boas e festas ruins. Pela experiência que temos, sabemos hoje que não é salutar concentrar bandas que tragam grande número de público para cá”, afirma. >
“O Pelourinho comporta, assim como no Carnaval, bandas de menor porte que tragam famílias. É hoje o público que temos hoje e que gostamos que tenha lá, que traga o resgate da roça, do interior, do milho e da canjica. [...] Eu curto que seja assim. Saio com a família, damos uma volta, vemos os pontos no Terreiro de Jesus, no Largo do Pelourinho, no Cruzeiro São Francisco, visitamos as praças, vamos até o Santo Antônio. Vemos o que está acontecendo em cada local desse, passeando, se misturando, comendo, tudo ao mesmo tempo, tudo junto e misturado. Curtimos dessa forma”, completa. >
Morador do bairro da Saúde, no Centro Histórico, Josemir de Jesus, 58 anos, conta que não abre mão do forró do Pelô há mais de 20 anos. “Eu amo o São João pela gastronomia, pela música, pelo vestir mais elegante das pessoas. Isso é a transformação que o São João nos causa. Aqui no Pelourinho, o que me atrai é a diversidade. Hoje, estamos vendo um trio de forró, amanhã nós vamos ver bandas de axé tocando forró. Isso é cultural e só se vê aqui”, frisa.>
Lista de 10 coisas imperdíveis para curtir no São João do Pelô: >
1. Exposição de arte dos educandos do Projeto Axé: ‘Caminhos do Erê’, com miniaturas de igrejas e oratórios dedicados aos Santos Juninos. >
Quando: 03 a 28/06, das 09h às 18h >
Onde: Museu Eugênio Teixeira Leal - Rua do Açouguinho 01 - Pelourinho >
Quando: 10 a 18 de junho, das 15h às 19h >
Onde: No “Terreiro das Brincadeiras”, localizado no Terreiro de Jesus >
Quando: 10 a 18 de junho, das 15h às 19h >
Onde: No “Terreiro das Brincadeiras”, localizado no Terreiro de Jesus >
Quando: Segunda a sexta, das 11h às 20h; sábado e domingo, das 11h às 19h >
Onde: Bar O Cravinho, no Largo Terreiro de Jesus >
Quando: Sexta a domingo, das 16h às 19h >
Onde: ME Ateliê da Fotografia, na Ladeira do Boqueirão, 6 - Santo Antônio Além do Carmo >
Quando: 13 a 24 de junho >
Preço: R$23 >
Horário: 9h30 às 19h >
Onde: Tropicália Gelato & Café | Rua da Misericórdia, nº 7, loja 3 – em frente ao Museu da Misericórdia >
Preço: R$60 >
Horário: 11h às 23h >
Onde: Cantina da Lua | Praça 15 de Novembro, nº2, Terreiro de Jesus, Pelourinho >
Preço: R$89,00 >
Horário: 11h às 22h >
Onde: Boteco do Pelourinho | Largo do Cruzeiro de São Francisco, nº 5 – Pelourinho>
O Projeto São João 2024 é uma realização do jornal Correio com apoio do Sicoob. >
*Com orientação da editora Mariana Rios>