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Portal Edicase
Publicado em 29 de outubro de 2025 às 17:44
As novas configurações familiares estão cada vez mais presentes no Brasil. Divórcios, recasamentos e famílias formadas por filhos de diferentes uniões compõem um retrato social que já deixou de ser exceção. Mas, com essa diversidade, surgem dilemas emocionais que nem sempre são discutidos com a profundidade que merecem: como equilibrar vínculos, papéis e afetos quando o passado e o presente convivem na mesma história? >
Segundo a psicóloga Dra. Cristiane Pertusi, presidente da Abratef (Associação Brasileira de Terapia Familiar), essas mudanças exigem um novo olhar sobre o conceito de família. “O modelo tradicional já não dá conta da realidade contemporânea. Hoje é comum encontrarmos famílias em que o ex-parceiro participa ativamente da rotina dos filhos, enquanto há um novo cônjuge em cena. Esse cenário, embora possível e saudável, pede maturidade emocional, diálogo e limites claros”, explica. >
No consultório, a Dra. Cristiane Pertusi observa que as tensões costumam surgir não apenas por conflitos diretos, mas por expectativas silenciosas. “O novo parceiro, muitas vezes, sente-se deslocado. Já o ex-cônjuge pode reagir com ciúme ou resistência, mesmo inconscientemente. E os filhos, que transitam entre dois lares, acabam assumindo o papel de mediadores, o que pode gerar culpa e ansiedade”, alerta. >
Ela destaca que o maior risco é transformar a convivência em um campo de disputa afetiva. “Quando os adultos não elaboram o próprio luto do relacionamento anterior, tendem a misturar as fronteiras entre o que é conjugal e o que é parental. A criança ou o adolescente percebe a tensão e, sem entender, se sente responsável por manter a harmonia entre todos”, observa a especialista. >
Para a profissional, a chave está em compreender que a parentalidade continua, mesmo quando o casamento termina. “Separar-se conjugalmente não significa se separar dos filhos. O desafio é aprender a cooperar sem competir. É possível manter uma relação funcional com o ex-parceiro quando há clareza de papéis: quem decide o quê, como se comunicam, quais assuntos cabem aos pais e quais pertencem ao novo casal”, afirma. >
Ela reforça que o diálogo entre todos os envolvidos precisa ser mais objetivo e menos reativo. “O problema não é o novo parceiro participar das decisões familiares, mas quando isso acontece sem acordos prévios. A ausência de combinados abre espaço para mal-entendidos e ressentimentos. Por isso, é essencial que o novo casal converse sobre os limites e que o ex-casal mantenha uma comunicação mínima, mas respeitosa”, aconselha. >
A presidente da Abratef ressalta que construir uma nova família é reorganizar o afeto. “É natural que o novo parceiro traga suas inseguranças e o ex tenha dificuldades em ceder espaço. Mas a convivência saudável se torna possível quando há empatia: compreender que todos estão se ajustando a uma nova realidade”, diz. >
Ela lembra que os filhos precisam de segurança emocional, e isso só acontece quando percebem que os adultos estão no controle das próprias emoções. “A criança não precisa ver amor entre ex-parceiros, mas precisa perceber respeito. O vínculo parental é permanente, e o melhor presente que um pai ou mãe pode oferecer ao filho é a estabilidade emocional do próprio comportamento”, ressalta. >
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que o Brasil teve queda de 3% nos casamentos civis e alta de 4,9% nos divórcios em 2023. Esses números mostram que o país vive um momento em que a ideia de família deixou de ser estrutura única para se tornar um organismo vivo, em constante transformação. >
A Dra. Cristiane Pertusi avalia esse cenário como uma oportunidade. “É hora de tirar o peso moral das novas composições familiares e enxergá-las como o que realmente são: tentativas legítimas de continuar amando, convivendo e educando dentro das possibilidades que a vida oferece. O que define uma família não é a origem do vínculo, mas a qualidade da relação”, explica. >
Para a Dra. Cristiane Pertusi, o conceito de família precisa ser ampliado. Veja dicas para lidar com a convivência familiar em novas configurações: >
“A família contemporânea é plural, e a afetividade precisa ocupar o lugar do controle. Relações saudáveis se constroem com diálogo e empatia, não com imposição. O que sustenta um lar não é a estrutura, mas o vínculo”, finaliza a especialista. >
Por Juliana Macedo >