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Da Redação
Publicado em 13 de junho de 2017 às 14:43
- Atualizado há um ano
O caso do menino infrator que teve a testa tatuada com a palavra ladrão mostra que o buraco da realidade brasileira é muito mais embaixo. E o que vivemos não é uma divisão entre esquerda e direita. A divisão se dá entre o humano e inumano.Em linhas rasas, viver seria fácil por aqui se apenas tivéssemos dois grupos disputando o controle político do país entre duas orientações, uma que prevê um estado ausente da economia mas atuante no controle das liberdades individuais (projeto conservador) e outra que pretende aumentar a força do estado na regulamentação das atividades produtivas e ausentá-lo da vida privada dos cidadãos (a chamada visão liberal).
Leia mais: 'Tive vontade de morrer, comecei a chorar', diz adolescente tatuado na testaA política – em sua origem – impede a barbárie e uma guerra física pelo controle do poder sobre a tribo. A guerra, então, vai para uma disputa pela palavra, pelo argumento com maior capacidade de convencer e agregar pessoas em determinado momento. Assim, a polarização esquerda x direita poderia ser resolvida no espaço que cabe a ela, que são as eleições. E claro que vale discussões acaloradas em mesas de bar. Mas nada além disto. Simplesmente porque não vale a pena.A ação dos tatuadores não e uma face da disputa esquerda x direita embora muito dos que demonstraram apoio aos torturadores argumentem, em outras palavras, que bandido bom é bandido morto, e que o adolescente infrator teve o que merece, e que os esquerdistas defensores dos direitos humanos protegem bandidos enquanto as pessoas de bem estão sendo assassinadas. A tortura e o apoio que ela recebeu é uma demonstração de que a política faliu e que voltamos aos tempos pré-civilização.A tatuagem na testa de um menor esfrega em nossa cara que falhamos, que não fomos capazes de estabelecer por aqui uma civilização, em que atos e valores da humanidade falem mais alto que nossos instintos mais primários e violentos. Somos uma sociedade falida, que não conseguiu produzir líderes e instituições (polícia, Justiça, sistema prisional) confiáveis. Somos um bando incapaz de prover a um adolescente um projeto de felicidade (talvez a palavra que melhor defina o que é o humano pela capacidade que temos de nos sentirmos felizes, inclusive com a felicidade alheia) capaz de livrá-lo do vício, de ter uma vida familiar, de ter perspectivas de um futuro digno. E formamos um estado (união de sociedade e instituições) tão fraco, mas tão fraco, que a lei não vale nada. Ou na melhor das hipóteses, só vale para alguns. Ou, na pior das realidades, cada melhor ainda, há uma lei e um estado criados e ditados para cada grupo, em cada território e em cada ocasião.O episódio é mais um mostrar que Brasil está diante de várias escolhas cruciais e paralisado sem saber o que quer ser. O primeiro passo, se falamos em nos reconhecermos uma nação, é reestabelecer a política, para nos recompor das falhas e nos recuperar das falências a partir do resgate da humanidade que ainda teima em resistir em cada um de nós. Sá assim poderemos retomar condições de diálogo e chegar à polarização – sem raiva, rancor ou medo – entre esquerda x direita.
Flavio Oliveira é editor no jornal CORREIO