Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Da Redação
Publicado em 13 de junho de 2013 às 06:39
- Atualizado há 2 anos
Léo Pirão*>
Viver em Salvador é uma experiência sensorial sem precedentes. Como caminhar em um bairro nobre e não avistar fezes de cães de madame sobre as calçadas? Como andar pelo centro e não sentir o odor de urina, suor e lixo? Como passear pelo Subúrbio sem se deleitar com o limitado gosto musical popular, saído de aparelhos de som mais caros que os próprios carros que os portam? O soteropolitano sente orgulho pelo seu bizarro carnaval, gaba-se pelas festas hedonistas o ano todo e pela quantidade de álcool que ingere nelas, mas se esquece de algo fundamental para o convívio social harmônico: o sentimento de pertencimento em relação aos espaços públicos e coletivos. É impressionante como a maioria dos seres desta cidade não se sente responsável pelo ambiente que vai além da porta das suas residências. E isso não tem nada a ver com a classe social. Moro em um edifício em um bairro favorecido da cidade e não tem como eu tomar um banho de piscina sem antes tirar 3 ou 4 pontas de cigarro da água. Sem falar nos móveis das áreas comuns, todos queimados pelos mesmos cigarros. Partindo do pressuposto que esse ou esses vizinhos-fumantes pagam condomínio e taxas de manutenção, fica difícil acreditar que eles usam suas massas encefálicas para outras coisas que não seja tragar fumaça.>
A Cidade de Todos os Santos poderia ser um lugar melhor se todos a abraçassem de fato. Nas comunidades afastadas dos bairros nobres é comum observar casas com aparência decrépita, sem reboco, com vergalhões retorcidos e enferrujados saindo das colunas, mas com o seu interior totalmente arrumado. São TVs de LED, geladeiras digitais, antenas de TV por assinatura e carros novos repousando em suas garagens. Por que o capricho não extrapola para o lado de fora? Decerto, nesses casos, não é por falta de recursos financeiros e sim falta de boa vontade e sentimento coletivo. Áreas tidas como degradadas poderiam ser muito mais salubres se cada um fizesse a sua parte e não ficasse esperando pelo poder público.Aliás, esperar pelo poder público responsabilizando-o por tudo é uma das toscas especialidades do soteropolitano. Todo mundo reclama do prefeito que arruinou Salvador nos últimos oito anos de administração. Porém, não foi o Divino Espírito Santo que colocou ele no poder. Todos votaram, elegeram e reelegeram o indivíduo e ninguém assume essa responsabilidade. Às vezes, penso que ser e agir como cidadão é a última coisa que passa pela cabeça da maioria das pessoas desta cidade.Não tem milagre. Quem faz a cidade são as pessoas. Precisamos mudar a forma de como vemos o meio em que vivemos. A nossa casa não é só a que fica para trás quando batemos a porta e saímos para a rua. O nosso teto é apenas uma parte do todo. Somos células de um grande organismo vivo e pulsante. E, como células, devemos ter cuidado para não ser a causa do câncer do corpo que habitamos.>
* Léo Pirão é publicitário, historiador, músico e poeta>