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Thais Borges
Publicado em 5 de novembro de 2025 às 05:00
A partir de dezembro, três importantes construções religiosas e históricas de Salvador terão seus acervos de cara nova. Ao menos 30 itens oriundos da Catedral Basílica de Salvador, do Convento de Santa Clara do Desterro e do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB) estão passando por restauração e devem ser entregues antes do fim do ano. >
No Convento do Desterro e na Catedral Basílica, tratam-se de imagens sacras, enquanto as peças restauradas do IGHB incluem telas e mobiliário. De acordo com o restaurador-chefe José Dirson Argolo, diretor do Studio Argolo, que é responsável pelas intervenções, as peças chegaram entre fevereiro e março deste ano. >
“A preservação de todos esses objetos é a preservação da memória artística e cultural do povo brasileiro. Mantendo esses objetos, a gente está restaurando não só as memórias dos retratados, como também de quem as fez - no caso, dos mestres santeiros e pintores”, analisa Argolo. >
Pelo preceito básico da restauração, o processo deve manter as características originais de cada obra, uma vez que elas continuam sendo documentos da época em que foram criadas. Restaurações mal feitas acabam por adulterar a originalidade e os próprios documentos. “Não se pode acrescentar nada de novo à criação do passado”, enfatiza o restaurador. >
O trabalho está sendo custeado com recursos de três editais, cada um no valor de R$ 100 mil: dois deles pela Fundação Gregório de Mattos (no caso da Catedral e do Desterro) e um pela Lei Paulo Gustavo, através da Secretaria de Cultura do Estado (o IGHB) . “É de uma importância muito grande, porque essas instituições hoje são muito carentes de verba, como é o caso do Convento do Desterro, e assim elas podem preservar seus acervos”. >
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Do Convento do Desterro, algumas das imagens já estão finalizadas, como a do Senhor dos Passos, da Nossa Senhora das Dores, do Senhor da Coluna e do Senhor da Pedra Fria. Todos são imagens feitas em madeira, entre os séculos 18 e 19, e consideradas muito expressivas. Há, ainda, duas peanhas em formato de concha que são remanescentes de altares do século 18. >
Entre as imagens sacras, havia peças com sujidades, atacadas por cupins, com descolamento de camadas e até perda parcial de elementos dourados. "As peanhas estavam em péssimo estado de conservação, muito atacadas por cupins, com seríssimos problemas de repintar e douramentos escondidos com muitas camadas de tinta”, conta. >
Já do IGHB, um dos destaques é de duas grandes telas.- cada uma com 2,8m. Enquanto uma retrata Dom Pedro I, a outra traz Dom Pedro II. Ambas são de autoria do pintor José Antônio da Cunha Souto, um importante nome da arte no século 19.>
Outra peça é o retrato de Maria Epifânia de São José e Aragão. Segundo José Dirson Argolo, a peça é uma das mais importantes da entidade. É a pintura de uma mulher com bigode e, por isso, é conhecida como ‘a mulher de bigode’. Ela foi uma das donas da Torre da Casa Garcia D’Ávila. >
“Durante o restauro, descobri a assinatura do autor. Em toda publicação sobre o acervo do iGHB, essa tela era atribuída a um anônimo. Quando comecei a fazer a limpeza da tela, descobri a assinatura de Vienot e Morrisset”, diz, citando a dupla de retratistas franceses Edouard Vienot e Henri-Georges Morisset. >
Além da assinatura, os restauradores descobriram que a dona Maria Epifânia carregava um leque na mão direita. Tanto isso quanto parte de suas joias tinha sido encoberto por restauradores anteriores. >
O melhor grupo de peças era o da Catedral Basílica, no que diz respeito ao estado de conservação. Mesmo assim, a equipe registrou perda de dedos e das mãos, além de fissuras, rachaduras e ataques de cupins. “Como eram provenientes da antiga Sé, demolida em 1893, essas imagens estavam guardadas num depósito, sem as devidas condições, por mais de 100 anos”. >
Além da limpeza das telas, os restauradores fazem a remoção do verniz oxidado e das pinturas feitas em restaurações anteriores. Cerca de 10 pessoas, entre restauradores e mestres carpinteiros, estão trabalhando nas intervenções. >