'Em alerta': maestro Carlos Prazeres narra detalhes da perseguição que sofre há dois anos

Situação chegou ao ápice há duas semanas, quando a stalker, que é estudante universitária, foi ao trabalho de Prazeres

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  • Fernanda Santana

Publicado em 25 de maio de 2024 às 05:00

O maestro Carlos
O maestro Carlos Crédito: Caio Lírio/divulgação

O inferno começou em abril de 2022. Uma prima do maestro Carlos Prazeres estava de visita em Salvador e os dois postaram uma foto, juntos, em uma rede social. Nos comentários da imagem, o músico estranhou as dezenas de mensagens agressivas, escritas por diferentes perfis. Era o início de uma perseguição que se arrastaria até hoje.

A perseguição a uma pessoa, online ou fisicamente, era considerada crime no Brasil há um ano quando Prazeres se deu conta de que era vítima de stalking (nome em inglês para perseguição). A pena prevista é de até dois anos de prisão e multa.

Antes de prestar duas queixas policiais contra a stalker, o maestro da Orquestra Sinfônica da Bahia (Osba) havia recebido mensagens de cunho religioso. "Soube que Satanás vai acabar com sua vida", foi uma das frases escritas pela acusada de stalking, estudante de uma universidade pública baiana.

Há duas semanas, o stalking ultrapassou o mundo digital. A mulher foi até a sede de um órgão público onde Prazeres circula a trabalho — será mantido em sigilo por segurança — e deixou uma carta em que atacava o músico. "O pessoal ficou preocupado com minha integridade", conta Prazeres.

Ele nunca viu o rosto dela, nem sabe como a stalker chegou até ele. Foi o Instagram que enviou um aviso que associava os perfis fakes denunciados por Prazeres a um nome e CPF. "Alertei que iria denunciá-la", diz, "e foi ali que piorou".

A mulher, que já tinha perseguido uma amiga dele, passou a importunar a namorada de Prazeres. Para ela, a stalker dizia que sabia seu endereço, em tom de ameaça. "Isso lhe gera crises de ansiedade", conta o músico.

Os casos de perseguição cresceram em todo o país. Em 2022, foram 53.918 ocorrências do tipo - 75% a mais que no ano anterior, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Na Bahia, aumentaram de 321 para 1.596. A Polícia Civil não informou à reportagem os números atualizados.

O stalker não tem um só perfil, mas estudos têm associado o comportamento de perseguição a transtornos de personalidade e delirantes. "Apenas gostaria que ela me esquecesse", desabafa Prazeres, em relato para a reportagem.

'Constante estado de alerta na rua', narra Carlos Prazeres

Fui abordado por ela, pela primeira vez, através do aplicativo Instagram. As mensagens dela eram de cunho religioso. Em uma delas, ela escreveu coisas como: “Soube que o satanás vai acabar com sua vida”. Num primeiro momento respondi o que ela dizia. Mas logo percebi que os temas abordados por ela não eram do meu interesse, e entendi que era o caso de não seguir com a conversa.

Acredito que a stalker soube de mim pelo meu trabalho da Orquestra Sinfônica da Bahia, mas como não a conheço pessoalmente, não consigo confirmar. Nunca a vi pessoalmente, nunca a encontrei. Jamais vivi algo semelhante com isso.

Mas a primeira vez que tive noção que estava sendo perseguido mesmo foi quando uma prima me visitou em Salvador, em abril de 2022. Postamos uma foto no Instagram e em sequência observei que nos comentários havia mensagens de baixíssimo calão vindas de um perfil fake.

Em seguida, outros perfis fakes começaram a perseguir uma amiga querida, fazendo comentários misóginos citando sua relação materna [em uma das agressões, a stalker xinga essa amiga, dizendo-lhe que ela “abandona o filho só para curtir como se fosse menininha. Se olha no espelho e vê os pés de galinha da cara”].

Essa perseguição chegou ao seu grupo de doutorado e lhe causou enorme dano psicológico, além de despesas com advogados.

Não denunciei a stalker imediatamente, porque não sabia de onde vinham estes ataques. Eram inúmeros perfis fake, que por mais que eu denunciasse, a plataforma dizia que eles não violavam as regras da mesma.

Carlos Prazeres, maestro, é vítima da stalking há dois anos
Carlos Prazeres, maestro, é vítima da stalking há dois anos Crédito: Paula Fróes/Arquivo CORREIO

Alguns meses depois eu recebi, por parte da plataforma, um aviso que ligava um destes perfis fakes à pessoa que me enviava textos religiosos citados acima e a partir desta ligação é que fiz a associação. Ainda tentei alertá-la de que eu sabia e iria denunciá-la à polícia. Achei que com isso ela fosse parar. Justamente ali tudo começou a piorar.

Esse stalking altera minha rotina. Afinal, você vive em constante estado de alerta na rua. Além disso, nas inúmeras vezes onde ela fez o disparo em massa de mensagens virtuais manchando a minha reputação, além de lidar com a situação, ainda precisava tentar responder a todos que me enviavam as mensagens.

Sinto medo. Assim que ela se deu conta de quem era minha namorada, começaram os ataques a ela. Minha parceira já foi ameaçada e ela já enviou bilhetes mostrando que tem os endereços dela, tanto da casa quanto dos lugares onde trabalha. Isso lhe gera enormes crises de ansiedade. Os mesmos ataques que viveu esta amiga querida sobre a qual falei acima.

Com certeza tenho medo de que ela vá aos concertos da Osba, afinal os concertos são públicos e muitas vezes feitos em locais como igrejas; sem qualquer controle de entrada.

Este assunto está sendo tratado por meus advogados. Aguardando uma posição do sistema judiciário. Ela tentou algumas medidas judiciais contra mim depois que eu a denunciei formalmente, totalmente despropositadas e que estão sendo cuidadas pelos meus advogados.

Há duas semanas, ela foi pessoalmente no meu trabalho levar toda a sorte de reclamações contra mim. Ela dizia coisas absurdas sobre mim, segundo me contaram depois, mas eu não a encontrei pessoalmente. Ela deixou uma carta escrita a próprio punho com essas agressões. Isso me preocupa e preocupa as pessoas com quem trabalho.

Apenas gostaria que ela me esquecesse e nunca mais entrasse em contato comigo.