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Larissa Almeida
Publicado em 1 de julho de 2025 às 05:00
Um dos principais atrativos da Chapada Diamantina, a trilha do Vale Pati é considerada uma das mais desafiadoras do estado. Para além das condições de relevo e dos caminhos escorregadios pela alta umidade em determinadas épocas do ano, a região oferece riscos pela precariedade de serviços prestados por agências de turismo denunciadas por más condições de trabalho. Em menos de um ano, cinco acidentes graves foram registrados na trilha. Segundo relatos, turistas ficaram horas sem receber atendimento porque os guias não tinham kit de primeiros socorros.
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O acidente mais recente ocorreu com uma turista conduzida pela agência Chapada Backpackers, no dia 4 de maio deste ano. A jovem fraturou o pé no trecho da trilha do Cachoeirão por Baixo, sendo constatada a necessidade de resgate de helicóptero pelo Corpo de Bombeiros. Por conta do mau tempo, não foi possível realizar o resgate por via aérea, resultando em uma espera de 72 horas da vítima por atendimento médico. >
Nas redes sociais, uma jovem – que terá a identidade preservada por questão de segurança – denunciou os maus tratos recebidos por um guia dessa mesma agência de turismo. Ela conta que o homem deixou e ela e os amigos para trás, após identificar que eles estavam andando mais devagar do que outras pessoas do grupo. >
Após chamar a atenção dele, uma vez que havia chovido e as pedras estavam escorregadias, dificultando a continuidade da trilha, a jovem afirma que foi agredida verbalmente pelo homem. “Ele não tinha um pingo de inteligência emocional e foi violento, agressivo, xingou MUITO minha amiga. Foi desesperador”, narrou. >
Ainda de acordo com a jovem, o guia teria dito que não adiantava reclamar, pois nada aconteceria com ele. “Nossa sorte foi o segundo guia, que tentou ficar mais presente até o restante do percurso. A gente tinha dois guias, mas quase nunca estávamos com ele. Na maioria das vezes, ele tinha que sair primeiro para preparar nossa comida, já que o outro também não o apoiava em outras divisões de tarefa”, relatou. >
A má experiência da jovem não foi isolada. Segundo uma denúncia protocolada no Ministério Público Federal (MPF) pelo condutor de trilhas Rafael Lage, a Chapada Backpackers era a responsável pelos grupos envolvidos em três dos cinco acidentes. O documento, ao qual o CORREIO teve acesso, aponta uma conduta perigosa adotada por agências similares. >
“Três dessas ocorrências envolveram grupos grandes com poucos guias (o quarto acidente, embora registrado em meios de comunicação, não foi possível saber se era um grupo grande ou não), o que demonstra a necessidade urgente de regulamentação da proporção adequada entre condutores e turistas”, diz trecho da denúncia. >
A denúncia destaca que, além dos riscos à segurança dos turistas, a falta de regulamentação sobre a proporção entre guias e visitantes gera um impacto financeiro considerável para o Estado da Bahia, uma vez todos os resgates são realizados, via de regra, pelo helicóptero do Corpo de Bombeiros da Bahia diante da dificuldade de acessar o local. >
Todos os acidentes tiveram quadro de fraturas, sendo que uma das vítimas também apresentou traumatismo crânio encefálico. O turista em questão era um francês, que foi regatado com ferimentos graves no dia 12 de setembro de 2024. Segundo o Corpo de Bombeiros, Bananier Emmanuel Cédric se acidentou na trilha e foi socorrido de um helicóptero pelo Corpo de Bombeiros de Salvador, que chegou na região do município de Palmeiras cerca de duas horas depois após o chamado de um grupo de turistas. >
No dia 10 de março deste ano, uma turista de Londres fraturou o tornozelo durante uma trilha no Pati e recebeu atendimento inicial por médica que estava no local. Ela resgatada depois pelo Corpo de Bombeiros. As outras ocorrências foram registradas na região no dia 18 de dezembro e no dia 31 de dezembro do ano passado. >
Diante desse cenário, Rafael Lage cobra uma maior fiscalização do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável por ações preventivas e pelo controle de proporção de guias e turistas em uma excursão de aventura. >
“A ausência de responsabilização sobre esses acidentes funciona como um estímulo a essas agências predadoras, uma vez que o lucro é delas e o custo do resgate é nosso, realizado na maioria dos casos pelo Corpo de Bombeiros do estado da Bahia, por outros guias em solidariedade ou mesmo pelos moradores locais da comunidade tradicional do Pati”, finaliza. >
A reportagem tentou fazer contato com a agência Chapada Backpackers, mas não conseguiu. O número de telefone disponibilizado no site e nas redes sociais não chamava, enquanto o WhatsApp, nesse mesmo número, não recebia mensagens. O espaço segue aberto. >
O ICMBio e o MPF também foram procurados para se posicionar sobre o assunto, mas não retornaram até a publicação desta matéria. >