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Larissa Almeida
Publicado em 28 de maio de 2025 às 06:00
O Plano de Saúde dos Servidores Públicos Estaduais da Bahia (Planserv), que há pelo menos sete anos é alvo de constantes críticas dos beneficiários, não custeou o fornecimento de um medicamento para o tratamento de uma paciente com câncer. Maria Luiza Sacramento Perdiz, de 68 anos, dedicou a vida ao funcionalismo público e tinha pouco mais de um ano como aposentada. Em 2024, ela foi diagnosticada com câncer de mama e, posteriormente, com metástase. A idosa morreu no último dia 8 de maio, após travar e vencer uma briga judicial contra o Planserv, que não cumpriu a decisão da Justiça.
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Segundo a estudante Isabella Tainara Barreto, estudante de Ciências Econômicas na Ufba e neta de Maria Luiza, o diagnóstico da avó começou a ser revelado durante uma mamografia. Ela, que já sabia que tinha um nódulo na mama, não se preocupava porque havia sido tranquilizada por uma ginecologista, que supôs que o nódulo era de gordura. >
Quando fez o novo exame, o caroço já tinha o dobro do tamanho inicial e ela foi encaminhada para um mastologista, um cirurgião e, por fim, um oncologista, que constatou não apenas um, mas outros quatro nódulos, sendo dois no fígado e dois no pulmão. >
“Como a doutora não era oncologista especializada em fígado, ela encaminhou minha avó para um oncologista de confiança dela, no Hospital Santa Izabel. Minha vó já tinha feito a biopsia do fígado, que o Planserv não cobria, no particular e viu que era realmente câncer”, detalha Isabella. >
Logo após o diagnóstico, o plano era remover os nódulos do fígado primeiro e depois cuidar do pulmão e da mama. No entanto, outro exame detectou oito nódulos no fígado e mais dois na coluna, configurando metástase do fígado – processo que ocorre quando o câncer se espalha. Com isso, a cirurgia foi suspensa e Maria Luiza recebeu um protocolo de quimioterapia e bloqueador hormonal, como parte do tratamento. >
Foram três quimioterapias diferentes, porque eram dois tipos diferentes de câncer de fígado e outro tipo de câncer na coluna. O mais agressivo, que estava localizado no fígado, demandava o uso da droga Avastin, o medicamento mais potente escolhido pelo oncologista. Ao fazer a solicitação no Planserv, o plano liberou todas as medicações, exceto a Avastin. >
“Nesse tempo, minha avó sentia dores extremamente insuportáveis em casa e, quando não aguentou mais, aceitou ir para o hospital investigar e tomar os remédios necessários. Ela ficou quase duas semanas internada no Santa Izabel recebendo morfina, metadona, dipirona e outros inúmeros remédios para tratar a dor e os problemas que, com ela, vieram a ocorrer, como problemas nos rins”, narra Isabella. >
No período que avó, neta e demais parentes ficaram no hospital buscando alguma solução, a família descobriu que o Planserv havia negado o custeio do medicamento. Logo, o sobrinho de Maria Luiza, que é advogado, entrou com um processo contra o Planserv, exigindo a droga. Por uma infeliz coincidência, tudo ocorreu durante um dos feriados de abril, o que fez com o andamento da Justiça fosse lento. >
A decisão só foi publicada pela juíza Regianne Yuki Tiba Xavier no dia 24 de abril, dez dias após o despacho. Ela determinou que a parte ré (Planserv) autorizasse e custeasse o fornecimento do medicamento Avastin, tendo um prazo de dez dias úteis para cumprimento desta decisão. >
Às 20h58 do dia 8 de maio, a juíza assinou outra decisão, recusando o pedido de ampliação do prazo do Planserv. “Considerando o lapso temporal decorrido, uma vez que a decisão foi proferida em 24/04/2025, e tratando-se de matéria revestida de urgência, indefiro o pedido de dilatação de prazo formulado pela parte ré”, diz a autoridade em documento que o CORREIO teve acesso.>
Justiça determinou que Planserv custeasse medicamentos de servidora que morreu
Por volta das 21h do dia 8 de maio, Maria Luiza Sacramento Perdiz morreu. “Minha avó teve um trombolismo pulmonar na própria quinta-feira. Ela havia começado o tratamento do câncer da mama uma semana antes e havia tomado uma droga para que os ossos não quebrassem. Só faltava o tratamento crucial que era o do fígado e nem a chance de morrer lutando o Planserv deu a ela”, lamenta a neta. >
A perda da avó abalou Isabella Tainara. Ela conta que Maria Luiza era a provedora da casa e a impedia de trabalhar para que se dedicasse exclusivamente aos estudos. Queria dar aos netos – todos dependentes da sua titularidade no Planserv – o que não teve na juventude, uma vez que trabalhou a vida toda. “Ela começou nos hospitais como faxineira e subiu até a profissão de técnica de enfermagem, com muito estudo, em uma época em que os técnicos faziam o papel dos enfermeiros”, diz Isabella. >
Maria Luiza também custeava a escola de outra neta e o plano de saúde da filha. Era defensora do trabalho e do concurso público. “Ela tinha orgulho de dizer que era funcionária do estado e que tinha o Planserv como plano de saúde, isso antes do sucateamento do plano. No fim, ela morreu em uma UPA em Abrantes, com teto mofado, chão sujo e poucos profissionais. E mesmo assim, lá, os profissionais fizeram de tudo para que ela sobrevivesse”, finaliza.>
O CORREIO procurou o Planserv para obter um posicionamento a respeito do caso, no intuito de entender o que levou o serviço a não custear o medicamento nem antes nem após a decisão judicial. Também buscou saber se há critérios para a liberação do Avastin para pacientes com câncer e, em caso positivo, qual foi utilizado nesse caso. Por fim, buscou saber se o Planserv propôs alguma forma de compensação ou custeio parcial da medicação quando a paciente estava viva. Não houve retorno para nenhum questionamento. >