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Loja em shopping de Salvador reúne 100 empreendedores negros para impulsionar marcas

Afrocentrados Conceito foi criada por Cynthia Paixão em 2021

  • Foto do(a) author(a) Carolina Cerqueira
  • Carolina Cerqueira

Publicado em 18 de maio de 2025 às 11:00

Cynthia Paixão planeja expansão para segunda loja da marca
Cynthia Paixão planeja expansão para segunda loja da marca Crédito: Marina Silva/CORREIO

O cliente chega à loja e o papel dos vendedores não é somente ajudá-lo a encontrar o produto que deseja ou verificar o que há no estoque. Todos eles têm na ponta da língua a história de cada item em exposição. O consumidor sabe quem fez o que comprou e para quem o dinheiro dele foi.

A loja fica no Shopping Bela Vista, um dos maiores de Salvador, e tem 239 m². São cerca de 100 marcas de produtos autorais confeccionados em pequena escala, quase exclusivos, por pequenos empreendedores. Esse negócio tem cor, tem gênero e tem cara. Cerca de 90% dos criadores são negros e 85% são mulheres.

A Afrocentrados Conceito foi criada por Cynthia Paixão, uma mulher negra de 39 anos, em 2021. Começou no Shopping Vasco da Gama, em uma loja de 19m². Ela tinha uma marca de moda praia, e, quando o negócio começou a dar certo, não quis crescer sozinha. Ficou com apenas uma prateleira para si e colocou outras 13 marcas para serem vendidas no espaço.

Tanta gente respondeu à publicação de Cynthia nas redes sociais que perguntava “Loja de afroempreendedores. Quem topa?” que teve até fila de espera. Foi aí que ela conseguiu um espaço de 50m² no Shopping Bela Vista, em 2023, passando a atender 30 marcas.

Ainda não estava satisfeita. No ano seguinte, mudou para a loja atual, no mesmo centro comercial. E já tem um plano no papel para abrir outro espaço, ficando com dois. “Estou organizando a casa para poder expandir com segurança”, diz ela, que conta que o negócio teve uma receita de R$500.000 em 2024 e tem expectativa de superar este número em 2025.

Cynthia Paixão, 39 anos
Cynthia Paixão, 39 anos Crédito: Marina Silva/CORREIO

Já saindo do papel está o e-commerce do negócio. “Vamos começar com parcerias com plataformas de vendas online, como Amazon e Mercado Livre, e depois vamos criar nosso próprio site. Temos pedidos fora do estado e até do país e essa etapa vai ser muito importante. Estou focada em estudar isso”, compartilha Cynthia.

Como funciona

A CEO vai apresentando a loja e apontando qual empreendedor faz qual produto. “Quem vem aqui sabe que vai encontrar peças afrobrasileiras e autorais”, conta. Tem itens de decoração, moda, papelaria, cosméticos e até sex shop e setor alimentício, com produtos gourmet em fase de curadoria.

A Afroconceitos fornece a estrutura necessária para um ponto fixo de venda a um custo reduzido. Cobre vendedores, sistema de pagamento, impostos, equipe de marketing, equipe de assessoria de imprensa e mentoria. Os empreendedores pagam um aluguel que varia de R$200 a R$2.000 e 30% do valor das vendas fica com a loja. Todo mês, junto com o pagamento dos 70%, os empreendedores recebem um relatório com quantidade e tipo de itens vendidos, registro de trocas e perfil dos clientes.

A mentoria de Cynthia funciona organicamente, a partir das fraquezas que ela observa nas marcas. Dá sugestões de melhorias e dicas a partir da experiência que tem. “Não tenho formação acadêmica, minha formação é da vida. Sou é muito curiosa”, diz ela, que fez e faz cursos em áreas como gestão, finanças e marketing.

Os empreendedores que reúne são de Salvador, região metropolitana, Rio de Janeiro e São Paulo. Cynthia diz que muitos chegam até ela através do perfil no Instagram. São 11.200 seguidores ativos por lá, compartilha, tendo o número na ponta da língua. Mas, para chegar até a loja, é preciso passar por uma seleção. Do controle de qualidade Cynthia não abre mão.

Loja reúne cerca de 100 marcas
Loja reúne cerca de 100 marcas Crédito: Marina Silva/CORREIO

“Buscamos ter as melhores marcas neste espaço. A gente coloca o empreendedorismo negro em posição de grife, que vende para pessoas que buscam identidade. Os clientes compram arte, cultura, conceito. A gente tem peça aqui de R$400 que é um dos carros-chefes. Mas muita gente ainda acha que se é empreendedorismo negro não tem qualidade e tem que vender barato”, provoca Cynthia.

Cenário

A empreendedora sabe reconhecer os avanços, como mais espaços colaborativos voltados para donos de negócios negros e redes de apoio, como projetos de aceleração e financiamento para pequenos negócios negros. Mas não deixa de chamar a atenção para o que ainda é obstáculo, como a dificuldade do mercado consumidor em reconhecer e valorizar os produtos.

De acordo com dados mais recentes do Sebrae, 52,4% dos donos de negócios no Brasil são negros, ou seja, cerca de 15,6 milhões. O número apresentou um crescimento de 28% desde 2012.

Por outro lado, estes ganham, em média, 46,5% menos que os brancos. Quando somadas duas minorias, o cenário é ainda mais complicado. As mulheres negras donas de negócios representam 32,2% e ganham 50,5% menos que mulheres brancas.

Enquanto o principal motivo para os brancos empreenderem é viajar pelo Brasil (54%), a principal motivação para os negros é comprar a casa própria (53,8%). “O empreendedorismo surgiu na minha vida através da dor, pela necessidade de sobreviver. E é assim com a maioria dos donos de negócios negros. É diferente da pessoa que pega um dinheiro para investir. O empreendedor negro abre o negócio para pegar o dinheiro”, diz Cynthia.

As peças de moda estão entre as mais presentes na loja
As peças de moda estão entre as mais presentes na loja Crédito: Marina Silva/CORREIO

Histórias

Aos 12 anos ela já vendia carnês (que hoje equivaleriam aos do Bahia Dá Sorte) pelas ruas para ajudar a mãe, que era empregada doméstica, e o pai, que era motorista de ônibus. Trabalhou em diversas lojas de departamento, vendeu chips na rua, foi atendente de balcão de farmácia. Até que foi mãe de gêmeos aos 21 anos e não conseguia ver os filhos acordados em casa por conta da rotina exaustiva de trabalho.

Cynthia abriu mão do CLT e se jogou no mundo dos negócios, primeiro com uma loja de moda praia no bairro de Valéria, que acabou se tornando o que é hoje. Luciana Batalha, de 42 anos, também deixou o emprego fixo, mas não foi por escolha própria.

“O setor no qual eu trabalhei por oito anos foi extinto e eu fui desligada da empresa. Peguei o dinheiro que ganhei e fui comprar máquina, impressora e outros materiais para começar o Lumimosa Ateliê, na área de artesanato e costura criativa”, lembra Luciana, que compartilha que ganha, em média, R$4.000 por mês com o negócio, que é um dos integrantes da Afrocentrados Conceito.

De 2018 para cá, ela incentivou a cunhada a fazer o mesmo caminho e ganhou uma sócia. O marido também deixou o emprego e iniciou um negócio de marcenaria criativa na garagem de casa, no bairro Itapuã. Hoje, a família vive do empreendedorismo.

Camila Loren, de 45 anos, diz que não caiu nas graças do empreendedorismo por conta da necessidade financeira, mas por conta da necessidade de alcançar a liberdade e fazer a diferença. Bisneta de uma baiana de acarajé, Camila nasceu no Rio de Janeiro porque sua mãe foi ao Sudeste em busca de melhores condições de vida e encontrou emprego como empregada doméstica.

Camila Loren, 45 anos
Camila Loren, 45 anos Crédito: Marina Silva/CORREIO

“Eu não queria ser igual a minha mãe. Fui estudar, poderia ter um emprego, mas queria algo maior, queria impactar vidas”, compartilha. “Sempre tive na minha cabeça que não queria ser mandada. Eu via minha mãe sofrendo por causa do trabalho, ela estava sempre nas casas das famílias para as quais trabalhava, ficava pouco com a gente”, acrescenta.

Para Camila, o ateliê de moda autoral que leva seu nome vai muito além do que uma fonte de renda. “Tenho que tomar posse do que é meu, afirmar e reafirmar que sou a dona do negócio. Eu chego nas feiras e as pessoas ficam perguntando se eu que fiz aquelas peças, acham que eu sou empregada e não a dona”, conta.

Ela chegou até o Afrocentrados Conceito quando quis expandir a loja que tem no Rio de Janeiro e buscou suas raízes. “Comecei a pesquisar na internet como poderia chegar à Bahia e encontrei o projeto de Cynthia. Na mesma hora, entrei em contato para fazer parte”, finaliza.

Crescendo juntos

Na fala de Luciana e Camila, há algo em comum. Elas destacam a vontade de Cynthia de fazer todos os empreendedores da rede crescerem juntos. A ideia do negócio é fazer com que as marcas ganhem condições de andar sozinhas e abrir os próprios pontos físicos de venda, abrindo espaço para novos pequenos empreendedores na Afrocentrados.

Por isso, a loja segue a lógica colaborativa, mas também criativa. Transformando criatividade em valor econômico, os negócios ali presentes se encaixam na chamada economia criativa. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a área cresceu 12% entre 2023 e 2024, movimentando aproximadamente R$ 170 bilhões.

O Atelier Camila Loren é uma das marcas da Afrocentrados
O Atelier Camila Loren é uma das marcas da Afrocentrados Crédito: Marina Silva/CORREIO

Helô Nazaré, de 45 anos, sentiu esse crescimento. “Quando eu comecei, tinham menos pessoas fazendo acessórios, essa coisa de empreender não era tão forte e a situação econômica do país estava melhor. Hoje, a concorrência é muito maior, a gente tem que correr atrás mesmo”, acrescenta.

Ela cria e vende acessórios com a marca que leva seu nome há 23 anos e está na Afrocentrados Conceito buscando o impulsionamento do seu pequeno negócio. Ela abriu a marca depois de começar a fazer acessórios por hobby e o sucesso a levou a comercializá-los.

Por enquanto, a maior parte do rendimento que obtém vai para a compra de novos materiais. A empreendedora conta que tem o sonho de abrir a própria loja física, mas ainda não sente segurança.

“Tenho reuniões frequentes com Cynthia. Ela dá muitas dicas, sempre pensando em como podemos cativar os clientes. Pede para que a gente pense em datas comemorativas e invista em embalagens. Eu tinha deixado o negócio em segundo plano por alguns anos, mas agora voltei a olhar para ele com força total”, conta Helô, animada.

Afrocentrados Conceito

Endereço: Piso L2 do Shopping Bela Vista

Instagram: @lojaafrocentrados

WhatsApp: 71 9184-7432