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Larissa Almeida
Publicado em 3 de setembro de 2025 às 05:00
Mais da metade das armas registradas para caçadores, atiradores desportivos e colecionadores (CAC) na Bahia são de uso restrito. Esses tipos de armas, que têm maior capacidade destrutiva, são de acesso limitado e controlado pela Polícia Federal (PF), mas, hoje, estão autorizadas para uso de 23.267 pessoas no estado, incluindo autoridades. Em comparação, o número de armas permitidas para a população civil é menor: são 17.239 armas para CAC em todo o território baiano, conforme dados do Sistema Nacional de Armas (Sinarm) da Polícia Federal. >
No rol de armamento com uso limitado que circula na Bahia, estão 19.476 pistolas, 1.709 carabinas, 1.425 revólveres e 633 espingardas registradas como CAC. O estado ainda conta com a circulação de armas com maior capacidade destrutiva, como metralhadoras (15), submetralhadora (1) e canhão (1), que são de uso exclusivo de colecionadores, segundo informações da PF. >
Saiba quais são os tipos de armas mais utilizadas por CACs
Roberto Uchôa, especialista em controle de armas e conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, analisa que a maior circulação de armas restritas no estado é reflexo da política de flexibilização do armamento ocorrida durante o último governo federal. >
“No governo anterior, houve uma mudança na classificação do que seriam armas de calibre restrito. Por exemplo, a pistola 9 mm, a pistola calibre .40, a pistola calibre .45, o revólver 357 e o fuzil calibre 5,56 mm eram consideradas armas de acesso restrito, sendo que o fuzil sequer era vendido para a população. Era proibido ter acesso. No governo Bolsonaro, essas armas passaram a ser de calibre permitido”, explica. >
Atualmente, o ano de aquisição das armas não é disponibilizado pela PF, que passou a controlar o acesso a armas de fogo neste ano e ainda usa a base de dados anteriormente mantida pelo Exército Brasileiro, que fazia esse papel. No entanto, outro indicador, que compila o total de certificados de registro para CAC ao longo dos anos, mostra que a Bahia aumentou em mais de 14 vezes o número de emissões desse documento entre 2018 e 2022, registrando um salto de 828 para 11.786 certificados nesse período. >
A partir do governo Lula, houve uma queda abrupta de novos certificados, saindo da marca acima de 11 mil em 2022 para apenas 82 no ano seguinte. Isso se deveu a uma nova mudança feita na legislação sobre armamento. “O governo Lula desfez a mudança do governo Bolsonaro, transformando aquelas armas novamente em calibre restrito. Apesar disso, não houve retirada dessas armas de circulação e é por isso que há uma grande quantidade de armas de fogo de calibre restrito”, afirma Roberto Uchôa. >
O instrutor de armamento e tiro (IAT) Flávio Calhau lembra que a legislação do Estatuto do Desarmamento estabelece que armas de calibre restrito podem ser adquiridas e registradas apenas por categorias específicas. “[É o caso] das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica), polícias e forças auxiliares, agentes de segurança pública e penitenciária, quando em serviço ou conforme autorizações específicas, e atiradores de nível 3”, elenca. >
Muitas pessoas que adquiriram uma arma de uso restrito no governo Bolsonaro conseguiram tal feito porque o armamento era categorizado como de uso permitido. Essas pessoas, portanto, não cumprem as exigências para ter arma para CAC de uso restrito, conforme os requisitos em vigor no governo Lula, mas até então não tiveram o armamento recolhido, nem há previsão. Para Roberto Uchôa, isso é um ponto em desfavor da política criminal do governo federal. >
“Quando o governo tenta transformar uma arma em calibre restrito é porque ele não quer essa arma em circulação. Se ela estiver em circulação, ele vai entender como um sinal de que ela veio do tráfico internacional de armas. Quando Bolsonaro tornou 9 mm acessível à população, essa arma que vendia 100 a 300 exemplares por ano passou a ser rapidamente a arma mais vendida do Brasil. Um levantamento mostrou que foram vendidas no Brasil, como um todo, 600 mil pistolas 9 mm apenas no último governo”, pontua. >
Uchôa vê com preocupação o cenário atual das armas em circulação no estado e não vê no horizonte uma solução que não perpasse o recolhimento do armamento. “Posso concluir que as mudanças feitas durante o governo Bolsonaro possibilitaram que criminosos acessassem mais facilmente essas armas e que a permanência dessas armas, mesmo no governo Lula, ainda vai possibilitar o desvio das mãos de pessoas que adquiriram legalmente para criminosos”, finaliza. >