Tudo pelo voto: conheça baianos que não medem esforços pelo 'passaporte da democracia'

De 'Uber familiar' a pessoas que cruzam o estado, eleitores fazem questão de ir às urnas

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  • Da Redação

Publicado em 30 de outubro de 2022 às 05:30

. Crédito: TSE/Divulgação

Para todos os brasileiros, votar é uma obrigação. Mas, para alguns, é também uma satisfação, uma espécie de ‘passaporte’ da democracia. A diarista Sirlete Santos, de 44, anos mora em Salvador, mas é natural de Conceição do Coité, no nordeste da Bahia, onde também exerce sua cidadania. No primeiro turno destas eleições, realizado no dia 2, ela se deslocou até aquele município só pra isso. 

Mesmo com dores na coluna, em decorrência das irregularidades na estrada, Sirlete vai retornar a Coité de ônibus, para confirmar os votos nos candidatos escolhidos para o governo do estado e a Presidência. “Eu jamais deixaria de ir votar no segundo turno, porque, se a gente quer mudar o cenário, [este] é o momento”, justifica a diarista. “Nós eleitores temos o poder de escolher o melhor.” 

Assim como no caso de Sirlete, faltar à ‘festa da democracia’ nem passou pela cabeça do estudante Pedro Carvalho, 24. O jovem acredita que todo esforço valha a pena neste momento e, por isso, se desvinculou de familiares e amigos em Itapetinga, no sudoeste baiano, unicamente por causa do segundo turno das eleições. 

“Eu poderia, muito bem, justificar [a ausência], mas, como esse momento político no país é muito sério, eu percebo a importância do meu voto, que tem impacto na minha vida e em milhões de vidas, principalmente, nordestinas”, avalia Pedro. 

Compartilhando do mesmo pensamento, o engenheiro eletricista Nelson Oliveira, 55, não só faz questão de ir votar como também é peça fundamental para que pessoas de sua família exerçam seu papel de cidadãs. 

O carro em que Nelson vai parte do bairro de Praia Grande, no Subúrbio Ferroviário, onde ele mora e vota — assim como seu pai, o primeiro a quem o engenheiro acompanha. “Eu começo levando meu pai, que tem 87 anos, e sigo pra votar”, prioriza. Na sequência, vem sua esposa, Rosana, e seus filhos, Felipe e Letícia. “Rosana vota na Federal [Ufba, campus Canela], e Letícia e Felipe votam no Rio Vermelho.” 

Considerando-se que Nelson e o pai votam em escolas diferentes no mesmo bairro, até chegar ao último destino, ele faz três paradas — mais do que o permitido num serviço de transporte por aplicativo de viagens, por exemplo. “Com o trânsito, deslocamento, tudo, estamos falando aí, de no mínimo, quatro horas”, estima. 

Ainda assim, para o engenheiro, vale o tempo e a gasolina gastos. “O voto decide nosso futuro e o do país, né?! No dia do voto, todos [da família] estarão em suas seções eleitorais”, garante Nelson. A diarista Sirlene Santos vai de Salvador a Conceição do Coité, só pra votar (Foto: Acervo pessoal) Para o cientista político Cláudio André de Souza, o fato de as pesquisas indicarem um acirramento na disputa pelo Palácio do Planalto, entre Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), deve contribuir para um maior engajamento por parte da população. “A gente está diante de uma escolha binária, e isso mobiliza a sociedade”, acredita Cláudio André. 

Somado a isso, até o fechamento desta matéria, 32 municípios baianos tinham aderido à gratuidade no sistema de transporte público, conforme requisitado pela Defensoria Pública do Estado (DPE/BA). “Eu acho que a tendência é que a gente tenha uma abstenção, talvez, um pouco menor”, acrescenta o cientista político. 

No primeiro turno, 21,33% dos mais de 11,2 milhões de eleitores aptos na Bahia deixaram de fazer valer sua cidadania. Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do estado (TRE-BA), o desembargador Roberto Frank ratifica a importância de comparecer às urnas neste domingo. 

“Eu convoco a você que não participou do primeiro turno das eleições, que o faça agora no segundo turno. Participe e seja protagonista daquilo que você espera que seja melhor para o nosso estado e para o nosso país”, pediu Frank em coletiva nesta sexta (28). 

O que pesa na escolha do candidato

É comum que as pessoas sejam influenciadas ou, no mínimo, se sintam pressionadas dentro de instituições sociais como a própria família ou grupos religiosos. Católica e integrante da Congregação Mariana, a autônoma Albenir Nascimento, 63, convive com pessoas dos dois ‘lados’, mas sua posição se mantém a mesma desde que começou a participar das eleições. “Sempre votei na esquerda, pois acredito que é através disso que podemos ajudar os mais pobres e podemos trabalhar com a inclusão social”, diz. 

Segundo Albenir, a paróquia que ela frequenta, no bairro da Boa Viagem, está bem dividida entre os que apoiam Bolsonaro e os que preferem Lula. Para a idosa, a solução é respeitar as opiniões uns dos outros. “Estou firme no que vou fazer, sem intervenção de ninguém, e sim pela minha consciência”, assegura. Católica, a autônoma Albenir Nascimento prega respeito às diferenças políticas na paróquia que frequenta (Foto: Acervo pessoal) O estudante Jonathan Santana, 25, afirma que vai pelo mesmo caminho, da consciência. Uma das razões para ter abandonado a igreja evangélica em Alagoinhas, no nordeste do estado, há seis anos, foi o fato de o pastor ter passado a indicar candidatos durante os anos eleitorais.

Jonathan afirma que votará em Lula, ainda que as propostas do candidato não estejam completamente alinhadas a seus ideais. "É uma disputa entre a humanidade e a barbárie, a democracia e o autoritarismo, o respeito e a intolerância, o apoio à ciência e o negacionismo”, justifica.

Embora naquele espaço, as orientações, segundo Jonathan, fossem 'implícitas’ e apontassem ‘inequivocamente para o conservadorismo’, ele, o tempo todo, sentiu que, em casa, sua autonomia de escolha foi respeitada. “Meus pais, que sempre me guiaram por meio do discurso religioso, historicamente sempre votaram no Lula; e quando o mesmo deixou de ser uma possibilidade, em Marina Silva”, compartilha o estudante. 

Para a definição do voto pelo eleitor contribuem dois fatores, aponta o professor do Departamento de Ciência Política da Ufba Jorge Almeida. “Um é o que eu chamo de voto por valores, que inclui valores políticos mais definidos, como socialismo, e valores ideológicos, no sentido moral, ético e religioso”, explica Almeida. 

Ao outro fator ele dá o nome de racionalidade pragmática. “É uma avaliação de custo-benefício que as pessoas fazem na hora de votar, considerando mais uma avaliação sobre que candidato pode tomar medidas que melhorem suas condições de vida materiais”, continua o professor. 

Almeida reitera a visão de que os eleitores são influenciados, em certa medida, por terceiros. No entanto, chama a atenção para o fato de que essa influência não se restringe a familiares e aos meios de comunicação e acontece também por meio de líderes políticos, sindicatos e associações civis, por exemplo. 

“É por isso que, muitas vezes, as famílias se dividem: o critério só de ‘em quem o pai e a mãe votam os filhos votam e vice-versa' não funciona. As pessoas estão situadas, têm concepções político-ideológicas diferentes”, opina.