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Millena Marques
Publicado em 27 de julho de 2025 às 12:03
Por medida de precaução, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) suspendeu temporariamente a comercialização, distribuição, fabricação, importação, propaganda e o uso do medicamento de terapia gênica Elevidys® (delandistrogeno moxeparvoveque) no Brasil. A decisão, publicada na quinta-feira (24), ocorreu após relatos de casos fatais de insuficiência hepática aguda em pacientes tratados com o produto nos Estados Unidos. >
De acordo com a Anvisa, a medida foi tomada em função de novas informações regulatórias divulgadas pela Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora dos Estados Unidos, que relata três óbitos associados ao uso de produtos de terapia gênica com a tecnologia vetorial AAVrh74, desenvolvida pela empresa Sarepta Therapeutics. >
Dois dos casos ocorreram em pacientes pediátricos não deambuladores (que não conseguiam caminhar por conta própria) com distrofia muscular de Duchenne (DMD), tratados com Elevidys®. O terceiro caso foi de um paciente adulto com distrofia muscular de cinturas, que utilizou um produto de terapia gênica experimental baseado no mesmo vetor viral. Os eventos envolveram evolução para insuficiência hepática aguda com desfecho fatal. Destaca-se que a empresa Sarepta Therapeutics é a responsável pelo registro do Elevydis® nos Estados Unidos. >
No Brasil, o registro do Elevidys® foi concedido à empresa Roche Farma Brasil em dezembro de 2024, em caráter excepcional, exclusivamente para pacientes pediátricos deambuladores (que andam) na faixa etária de 4 a 7 anos, com mutação confirmada no gene DMD. O registro foi condicionado ao monitoramento intensivo de segurança e à confirmação de eficácia de longo prazo, conforme a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 505/2021. >
Nenhum dos casos fatais acima relatados ocorreu no Brasil. Tais óbitos se referem a cenários clínicos com indicações não autorizadas pela Anvisa, conforme divulgado pela Agência, em 17 de junho de 2025, em relação aos dois casos iniciais.>
A empresa Sarepta atendeu a uma solicitação da FDA e interrompeu voluntariamente a distribuição do medicamento Elevidys® nos Estados Unidos para todos os pacientes, incluindo aqueles deambuladores e não deambuladores.>
Fora dos Estados Unidos, a Roche comunicou a suspensão voluntária e temporária do fornecimento de Elevidys® para novos pacientes deambuladores com DMD em países que dependem exclusivamente da aprovação da FDA para uso local do produto, além daqueles com programas assistenciais específicos. >
Embora os casos de óbito tenham ocorrido em perfil de pacientes para os quais o Elevidys® não está indicado no Brasil e não haja, até o momento, relatos de problemas relacionados à sua aplicação no país, a Anvisa decidiu suspender temporariamente o uso do produto. A decisão foi tomada de forma cientificamente prudente e preventiva, diante do surgimento de novos dados internacionais que apontam para hepatotoxicidade grave com desfecho fatal. >
De acordo com a Anvisa, a suspensão temporária do uso do produto como medida preventiva, em alinhamento com a empresa Roche, tem o objetivo de: >
Garantir a segurança dos pacientes brasileiros, que deve sempre prevalecer sobre qualquer outra consideração;>
Permitir a avaliação aprofundada dos sinais de risco hepático emergentes nos Estados Unidos;>
Discutir, com base nos novos achados e correlações, possíveis aprimoramentos e ajustes no plano de gerenciamento de risco e nas estratégias de manejo clínico, se necessário, antes de eventual retomada da comercialização do medicamento;>
Como se trata de um produto inovador, complexo e de uso restrito, qualquer dúvida razoável sobre seu perfil de segurança exige ação regulatória imediata. >
A Anvisa segue em articulação com a FDA, dos Estados Unidos, e com a PMDA (Pharmaceuticals and Medical Devices Agency), agência reguladora do Japão, para o aprofundamento do monitoramento contínuo da segurança, qualidade e eficácia do Elevidys®. O Elevidys® está registrado no Brasil, nos Estados Unidos e no Japão. >
No Brasil, o registro do Elevidys® foi concedido em dezembro de 2024, em caráter excepcional, exclusivamente para pacientes pediátricos deambuladores (4 a 7 anos) com mutação confirmada no gene DMD, e condicionado ao monitoramento intensivo de segurança e à confirmação de eficácia de longo prazo, conforme a RDC 505/2021. Segundo informações da empresa Roche, cerca de 10 pacientes brasileiros foram tratados com o produto. >
Até esta quinta-feira, dia 24 de julho, foram recebidas pela Anvisa três notificações de eventos adversos feitas pela empresa Roche, todos ocorridos em 2025. >
Segundo a análise de causalidade dos eventos adversos, dois deles foram classificados como prováveis e com evolução favorável e compatível com os efeitos já descritos em bula e observados nos estudos clínicos. Destacam-se o aumento de enzimas musculares (creatina quinase), sendo um efeito demonstrado na referida terapia gênica para DMD, possivelmente relacionado à resposta imune ao vetor AAV ou à expressão de microdistrofina em fibras musculares afetadas; e sintomas gastrointestinais, que podem estar relacionados a corticoterapia (usada para supressão imunológica). >
Também foram observados aumentos das enzimas hepáticas e hepatite. A toxicidade hepática é um risco documentado com vetores AAV, devido ao seu tropismo hepático. A hepatite pode ser mediada por resposta imune ao vetor ou ao transgene. >
O terceiro caso notificado no Brasil apresentou nexo causal improvável com o uso do Elevidys®, sendo o quadro clinicamente compatível com uma infecção viral grave (influeza A), intensificada por imunossupressão, resultando em óbito. A bula do Elevidys® recomenda adiar a administração em casos de infecção ativa e preconiza a vacinação como mecanismo preventivo. >
Até o momento, os eventos notificados no Brasil relacionados ao Elevidys® não configuram sinal de segurança novo ou inesperado à saúde na população de pacientes brasileiros deambuladores com DMD. A bula brasileira já inclui alertas específicos sobre risco de lesão hepática grave e recomendações de precaução para pacientes com comprometimento hepático ou infecção hepática crônica, dentre outras advertências relacionadas, como infecções simultâneas e consequências de imunossupressão devido ao uso de corticoides.>