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Carol Neves
Publicado em 15 de outubro de 2025 às 09:24
Francisco Mairlon Barros Aguiar, preso por 15 anos pela morte do ex-ministro do TSE José Guilherme Villela, da esposa dele, Maria Villela, e da empregada da família, Francisca Nascimento da Silva, deixou o Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, pouco depois da meia-noite desta quarta-feira (15). A libertação foi determinada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu de forma unânime anular o processo e determinar a “soltura imediata” do ex-réu. >
Detido em 2010, aos 22 anos, Mairlon sai da prisão aos 37, após cumprir mais da metade de uma pena de 55 anos – posteriormente reduzida a 47. Emocionado, ele agradeceu à família, aos advogados e aos ministros que analisaram o caso. “Não estou nem acreditando, o dia mais feliz da minha vida está sendo hoje. Muita gratidão a todas as pessoas que não desistiram de mim, a ONG Innocence que insistiu, ainda. Família, amigos, não sei nem o que falar”, declarou em entrevista à TV Globo, abraçado à família.>
Crime da 113 Sul chocou o país
O caso, conhecido como “crime da 113 Sul”, chocou Brasília em 2009. O ex-ministro José Guilherme Villela, sua esposa, Maria Carvalho, e a funcionária da casa, Francisca Nascimento, foram mortos a facadas dentro do apartamento do casal, em uma área nobre da capital. Dólares e joias desapareceram do local.>
A decisão do STJ atendeu a um pedido da ONG Innocence Project, que revisou o processo e apontou irregularidades graves. A advogada Dora Cavalcanti, que representa a organização, afirmou que o caso de Mairlon foi marcado por falhas e violações. “Ao longo das 16 mil páginas e dos quatro anos em que o Innocence Project estudou a condenação definitiva de Francisco Mairlon, o que se pode constatar é que ficou ele esquecido, invisibilizado”, afirmou.>
De acordo com a defesa, Mairlon foi incluído na cena do crime apenas com base em confissões colhidas sob pressão policial. As declarações dadas na delegacia por ele e por outros dois acusados, Leonardo Campos Alves e Paulo Cardoso Santana, foram posteriormente retratadas em juízo. Não há provas físicas, como DNA, digitais ou testemunhas, que liguem Mairlon ao local.>
A ONG sustenta que as confissões foram obtidas após longas horas de interrogatório, com privação de sono e alimentação. “Depois de seis horas, a chance de alguém assumir a responsabilidade por um crime que não cometeu sob a falsa promessa de que vai ser liberado para ir para casa aumenta exponencialmente”, disse a advogada.>
Os ministros da Sexta Turma foram unânimes em reconhecer as falhas. O relator, Sebastião Reis Junior, destacou que a condenação se baseou apenas em depoimentos extrajudiciais, sem respaldo nas provas apresentadas ao longo do processo. “É inadmissível que, em um Estado Democrático de Direito, um acusado seja pronunciado e condenado apenas com base em elementos da fase extrajudicial, dissonantes da prova produzida em juízo”, afirmou.>
O ministro Rogerio Schietti Cruz classificou o episódio como “gravíssimo”. Segundo ele, o caso expõe “uma das grandes chagas da tradição judicial brasileira, que é o uso de meios viciados de obtenção de provas”. Já Og Fernandes observou que os vídeos dos depoimentos revelam “coação moral” e concluiu: “Parece que essa verdade assim obtida é falsa. Não convence.”>
Outros dois homens seguem condenados como executores do crime: Leonardo Campos Alves, ex-porteiro do prédio onde morava a família Villela, condenado a 60 anos de prisão; e Paulo Cardoso Santana, sobrinho de Leonardo, sentenciado a 62 anos.>
A decisão do STJ foi tomada após o tribunal anular, em setembro deste ano, a condenação da arquiteta Adriana Villela a 61 anos de prisão. Adriana é filha do casal Villela e foi acusada de ser a mandante do crime. >
Com a decisão, Mairlon deixa de ser réu e de carregar qualquer condenação relacionada ao caso. O Ministério Público do Distrito Federal ainda pode recorrer da decisão.>