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Da Redação
Publicado em 30 de janeiro de 2015 às 04:43
- Atualizado há 3 anos
Semana passada, ao saber que assaltantes invadiram, sem nenhuma cerimônia, a casa do ex-governador César Borges, uma indagação despertou-me da inércia, inquirindo-me: por que os políticos brasileiros não mobilizam o Congresso Nacional para resolver a questão da criminalidade no Brasil, se ela está cada vez mais perto deles e dos seus filhos?Esta semana, ao constatar que o Brasil é um dos cinco países mais violentos do mundo, com cerca de 60 mil homicídios por ano, e que Salvador é a quinta cidade mais violenta do país, com 58 homicídios para cada 100 mil habitantes, segundo a fundação City Mayors, outra indagação surgiu de imediato: por que a população brasileira não se rebela frente a tal situação, não sai às ruas em passeata clamando por segurança e aceita conviver com a violência que mata seus filhos diariamente?Um terceira pergunta ainda fez ninho em meu cérebro e, passeando pelos liames da Ciência Econômica, se materializou: por que os líderes empresariais do país, que, além de filhos e parentes, estão perdendo bilhões de reais por causa da violência que impera no país não se mobilizam política e financeiramente para pôr fim a esse descalabro?Não tive como responder a nenhuma dessas perguntas e por um momento pensei em recorrer à Psicologia para entender por que o brasileiro e suas lideranças políticas e empresariais convivem tão candidamente com um problema que os afeta diretamente. É possível até identificar em parcelas da população um interesse inusitado pelo assunto, de tal modo que os programas televisivos e o noticiário sobre o crime e a violência batem recordes de audiência. Para completar, a elite intelectual e econômica se mantém inerte em relação ao assunto, quase conformada, como se fosse uma sina conviver com a criminalidade, ou uma espécie de castigo a ser pago por conta da desigualdade social do país. Foi surpreendente, por exemplo, nos protestos dos jovens brasileiros, que em 2013 foram às ruas clamar contra mazelas do país, que nenhuma bandeira tenha sido levantada contra a crescente violência que mata especialmente os jovens. Aliás, na última quarta-feira, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e o Unicef divulgaram pesquisa mostrando que a Bahia é segundo estado do país com maior índice de homicídios de adolescentes e que cinco de suas cidades – Itabuna, Camaçari, Vitória da Conquista, Salvador e Feira de Santana – estão entre as campeãs de assassinatos de jovens.O fato é que há na sociedade um certo conformismo em relação ao assunto e, no entanto, esse é um problema que atinge o coração das famílias brasileiras, e também a economia do país. Recentemente, um estudo do Ipea – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, intitulado Custo da Juventude Perdida no Brasil, fez um diagnóstico mostrando que as mortes prematuras de jovens custam R$ 79 bilhões a cada ano, o que correspondente a 1,5% do PIB brasileiro. Na Bahia, o custo da vitimização violenta de jovens atinge o montante de 3% do PIB estadual e chega a R$ 5,4 bilhões anuais, o quarto pior resultado do país. É um valor expressivo, duas vezes maior do que o Bolsa-Família transfere para o estado. Mas, em termos econômicos, o custo da violência não está apenas na perda efetiva de recursos gerada pelas mortes violentas, está também na redução da competitividade das empresas e atinge todos os setores. O comércio, por exemplo, perde, pois a violência espanta o consumidor das ruas e faz aumentar seus custos, com a contratação de vigilantes, instalação em shoppings e outros expedientes. Os bancos são atingidos com os assaltos e as explosões de caixas eletrônicos e a indústria perde com a logística e o roubo de carga, como ocorre, por exemplo, com a indústria de celulose e de cobre na Bahia. Já a agropecuária também perde com a insegurança nas fazendas e os roubos e assaltos no interior. O fato é que a violência torna o Brasil e a Bahia menos competitiva, e aumenta o Custo-Brasil, mas esse custo econômico é ínfimo frente às vidas perdidas e da dor das famílias.Enquanto isso, o governo da Presidente Dilma Rousseff, que prometeu na campanha uma ação federal contra a criminalidade, nada faz, os políticos, por sua vez, fazem de conta que o problema não lhes diz respeito e a população segue a mercê da criminalidade. Está na hora, portanto, dos jovens brasileiros saírem à rua pedindo segurança, do Ministério Público exigir que o Estado cumpra a função constitucional de proteger a população, dos empresários empenharem seus recursos e seu poder político para que o problema seja resolvido e da sociedade civil exigir uma política federal de combate ao crime e à violência. Sem isso, o Brasil não tem futuro e nunca será um país desenvolvido.>
E não me venham com a históriaE não me venham com a história de que a violência é um problema social resultante da grande quantidade de brasileiros vivendo na pobreza. Se fosse assim, nos último 10 anos, quando cerca de 30 milhões de brasileiros deixaram a pobreza e as taxas de desemprego foram as mais baixas da história recente, a violência teria se reduzido drasticamente e, no entanto, ela só aumentou, e desmesuradamente. E não me venham com a explicação de que a violência é resultado do tráfico de drogas, que está em toda a parte e é impossível de controlar. Se fosse assim, a Colômbia, que por muito tempo foi o paraíso dos traficantes, e que fez um grande programa de combate à violência, não teria hoje índices de criminalidade bem menores que os nossos. E, sempre é bom lembrar, que o maior mercado de drogas do mundo está nos Estados Unidos, onde a criminalidade é baixa, e que cidades como Nova York, que detinha altíssimo índice de violência, inclusive por causa do tráfico de drogas, reduziram a criminalidade a níveis baixíssimos quando o poder público colocou a questão como prioridade.Salvador, o Carnaval e a preguiçaOutro dia, um jornalista da TV Record de São Paulo perguntou minha opinião sobre a famosa preguiça baiana, a ideia de que o baiano, supostamente, não gosta de trabalhar. Respondi que isso era um mito, com raízes históricas e culturais e que, ao contrário do que se diz, de preguiçoso o baiano não tem nada. Parte desse mito tem origem no trabalho escravo e era uma estratégia de sobrevivência, pois o escravo, se inteligente fosse, deveria se fazer preguiçoso, afinal, se fosse expedito, trabalharia muito mais e de forma inumana. Há quem diga, no entanto, que foi exatamente o contrário e que o mito da preguiça teria sido engendrado pelos senhores de escravos, com o objetivo de depreciá-los. Parte do mito também foi construída pela literatura e pela música, especialmente por Dorival Caymmi, um mestre da canção que adorava enaltecer sua malemolência e a dos baianos. Independente das explicações, o que parece certo é que o baiano não compactua com a tese liberal burguesa que identifica trabalho com sacrifício e tristeza, e inverte a lógica unindo trabalho e alegria. Agora mesmo, aproxima-se o Carnaval e, longe do que se poderia prever, esse é um tempo de muito trabalho. O Carnaval cria milhares de empregos temporários, viabiliza pequenos negócios, amplia o mercado informal, os pontos de venda, os bicos e os serviços de toda ordem gerando uma enorme rede de geração de emprego e renda que tem como substrato a alegria. A preguiça não brinca Carnaval, pelo contrário, essa época é de muito trabalho, mas trabalho ao som da música e no rastro da alegria.>