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Publicado em 27 de setembro de 2025 às 17:00
O Setembro Amarelo, campanha nacional de prevenção ao suicídio, ganha ainda mais relevância em um momento em que a saúde mental no ambiente de trabalho ocupa o centro das discussões corporativas. Mundialmente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima a perda de 12 bilhões de dias úteis por ano em razão de depressão e ansiedade, o que representa um impacto econômico anual de US$ 1 trilhão. >
No Brasil, os dados também são alarmantes. A iniciativa SmartLab de Trabalho Decente 2025, coordenada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) no país, registrou entre 2012 e 2024 cerca de 8,8 milhões de acidentes de trabalho e 32 mil mortes de trabalhadores com carteira assinada. O estudo revela ainda que apenas 46% dos municípios brasileiros possuem políticas ou programas estruturados de atendimento a pessoas com transtornos mentais.>
Dentro desse cenário, a Geração Z, que deve representar 27% da força de trabalho mundial até o final de 2025, segundo projeções da Zurich Insurance, enfrenta um paradoxo. Embora sejam nativos digitais e altamente adaptáveis à tecnologia, também lideram os maiores índices de ansiedade e depressão já registrados. Uma pesquisa da Deloitte aponta que 40% desses jovens profissionais relatam viver sob estresse constante, sendo o ambiente laboral um dos principais gatilhos.>
Frente a essa realidade, gestores e líderes passam a ocupar posição estratégica. O ambiente de trabalho é onde as pessoas passam a maior parte do tempo ativo, e é neste contexto que os gestores desempenham um papel fundamental na identificação precoce de questões de saúde mental. Um olhar atento pode fazer toda a diferença na vida de um colaborador. >
Sinais de alerta no ambiente corporativo>
Mudanças comportamentais súbitas devem ser encaradas como um sinal de atenção. Entre os principais indícios estão: dificuldade de concentração, queda abrupta na produtividade, isolamento social, alterações no padrão de comunicação, faltas frequentes, irritabilidade excessiva e fadiga persistente.>
O grande desafio, no entanto, é equilibrar a cobrança por resultados com a construção de um ambiente que promova segurança psicológica e suporte emocional.>
A cultura organizacional exerce papel decisivo nesse processo. Empresas que priorizam o diálogo aberto, implementam políticas de bem-estar e incentivam a busca por apoio profissional conseguem reduzir significativamente os riscos associados ao estresse crônico e ao adoecimento mental. Além disso, programas de treinamento voltados à liderança ajudam gestores a desenvolver empatia, habilidades de escuta ativa e a capacidade de intervir de forma construtiva quando identificam colaboradores em sofrimento.>
Outro aspecto relevante é a incorporação de práticas de autocuidado à rotina corporativa, como pausas programadas, incentivo à atividade física, flexibilidade de horários e campanhas de conscientização sobre saúde psicológica. Essas medidas, além de promoverem o bem-estar individual, fortalecem a retenção de talentos e elevam o engajamento em um mercado de trabalho altamente competitivo. >
Essa atenção deve ser ampliada também aos times remotos, cada vez mais comuns nas empresas, principalmente de tecnologia. No modelo de trabalho distribuído, é papel da liderança garantir proximidade e presença, mesmo à distância. Pequenos gestos, como check-ins regulares, conversas individuais e criação de espaços virtuais de convivência, ajudam a reduzir a sensação de isolamento e fazem com que o colaborador se sinta visto e apoiado.>
A tecnologia também pode atuar como aliada. Ferramentas de análise de dados podem contribuir para identificar padrões comportamentais, desde que utilizadas com ética e sempre em prol do bem-estar humano. Além disso, aplicativos voltados à prática de exercícios, meditação ou qualidade do sono podem ser disponibilizados pelas empresas como forma de apoio complementar aos profissionais.>
O problema, entretanto, não é exclusivo do Brasil. Um estudo da Future Forum, realizado com mais de 10 mil trabalhadores nos Estados Unidos, Reino Unido, Austrália, França, Alemanha e Japão, revelou que 48% dos entrevistados se sentem mentalmente esgotados, sendo a maioria entre 18 e 29 anos. Já no Brasil, segundo a International Stress Management Association (ISMA-BR), 72% dos profissionais relatam níveis elevados de estresse no trabalho, e 32% sofrem de síndrome de burnout.>
Estratégias de prevenção e apoio>
O burnout, ou síndrome do esgotamento profissional, é um dos transtornos mais comuns no ambiente corporativo. Caracterizado por exaustão emocional, despersonalização e queda no senso de realização pessoal, pode evoluir para quadros mais graves quando não tratado adequadamente.>
Para prevenir esses impactos, especialistas defendem que as empresas invistam em políticas estruturadas de saúde mental. Isso inclui treinamento de lideranças, criação de canais de apoio psicológico, flexibilização de rotinas e o incentivo a uma cultura organizacional que valorize o equilíbrio entre vida pessoal e profissional.>
No Brasil, esse movimento ganhou força com a atualização da NR-1, em vigor desde maio de 2025, que passou a exigir a avaliação e a gestão de riscos psicossociais. Desde então, muitas companhias estruturaram programas mais robustos de saúde mental corporativa, com resultados significativos. >
É essencial que as empresas compreendam que investir em saúde mental não é apenas uma questão humanitária, mas também estratégica. Colaboradores com boa saúde mental são mais produtivos, criativos e engajados.>
A implementação de programas de suporte psicológico confidencial também tem se mostrado eficaz. Da mesma forma, abrir espaços de diálogo franco sobre saúde mental ajuda a quebrar estigmas e encoraja profissionais a buscar ajuda.>
76,3% dos colaboradores acreditam que seus líderes afetam diretamente seu bem-estar no trabalho>
A transformação cultural dentro das organizações começa pela liderança. Um levantamento realizado pela Conexa revela que 76,3% dos profissionais acreditam que seus gestores influenciam diretamente no seu bem-estar no trabalho. Entre os sentimentos mais associados à liderança, destaca-se a ansiedade (37,5%), seguida de calma (19,3%), estresse (17,5%), orgulho (16,5%) e inferioridade (9,2%).>
Esses números evidenciam o impacto direto que líderes exercem sobre a saúde mental das equipes, reforçando a importância de desenvolver uma liderança empática e consciente. Gestores que adotam uma postura positiva e apoiadora não apenas reduzem os níveis de ansiedade, mas também estimulam engajamento e fortalecem o vínculo de confiança com seus colaboradores. Ao se mostrarem vulneráveis e abertos a compartilhar suas próprias experiências com saúde mental, criam um ambiente mais seguro para que os profissionais também busquem apoio quando necessário.>
Para consolidar essa mudança cultural, treinamentos direcionados às lideranças, abordando desde a forma adequada de dialogar sobre saúde mental até a decisão de encaminhar um colaborador para ajuda profissional, são investimentos estratégicos. Ao promover esse equilíbrio entre produtividade, inovação e bem-estar, as empresas não apenas respondem ao espírito do Setembro Amarelo, mas transformam a campanha em práticas contínuas capazes de gerar impacto real e duradouro.>
Antonio Muniz é especialista em tecnologia e carreira, autor do livro “Smart Skills: Descubra seus pontos fortes para uma carreira produtiva e feliz”>