Boato de cobra na piscina marcou início do fim do Tamina Park; relembre

Icônico para crianças ‘noventistas’, local funcionou entre 1992 e 2005

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  • Gabriel Moura

Publicado em 17 de março de 2024 às 16:00

Tamina Park
Tamina Park Crédito: Haroldo Abrantes/Arquivo Correio

O rosto melecado com a quantidade exagerada de protetor solar, o braço sufocado pela boia estampada com algum personagem de desenho animado, o clamor por mais uma garrafa de Coca-Cola, o fascínio ao se deparar com o dinossauro gigante, a adrenalina ao deslizar pelos toboáguas... Aberto entre 92 e 2005, o Tamina Park é uma lembrança tão viva para as crianças dos anos 90 e 00 quanto o boato de que o local teria encerrado as atividades após um acidente ofídico.

"Rapaz, ouvi que acharam uma cobra na piscina", começa um. "Pois é. E parece que o bicho mordeu um menino", emenda outro. "Mordeu? Engoliu a criança de dois anos. Só acharam o corpo depois de dias", hiperboliza o terceiro.

Pontos devidamente aumentados ao conto, hora da verdade: não há relatos oficiais, denúncias formais ou casos documentados de que uma cobra foi flagrada se refrescando nas piscinas do icônico parque aquático que funcionava no km 17 da BR-324.

“Você não imagina o trabalho que isso deu para a gente”, relembra Augusto Almeida, antigo administrador do parque que pertencia à Fundação José Carvalho. “Nunca identificamos a fonte desta história, só lembro que a ouvi pela primeira vez em 1998. Quem inventou não tem empatia nenhuma, espalhando desinformação sobre uma instituição séria”, desabafa.

Apesar deste “olha a cobra” ser mentira, o boato foi contemporâneo dos reais motivos que fecharam o Tamina. O princípio de crise já dava as caras em 99, quando a atração passou a vender ingressos por até R$ 5, cortando pela metade a margem de lucro para atrair mais público.

Neste mesmo período, Salvador recebia a primeira unidade do Wet’n Wild fora dos Estados Unidos. Com equipamentos novos, incluindo uma piscina com ondas, o parque gringo virou o queridinho entre os soteropolitanos que não desejavam pegar a BR para dar um ‘tibum’.

Augusto, entretanto, revela que o principal motivo do encerramento foi geográfico. “Tínhamos uma situação de um terreno já totalmente ocupado, onde não podíamos crescer, colocar novas atrações. Como em todo brinquedo, as pessoas enjoam se você não estiver sempre renovando, trazendo novidades. E chegou ao ponto de não termos um público mínimo para manter a infraestrutura funcionando. Era um custo muito alto com energia, mão de obra e tratamento da água das piscinas”, elenca.

Nostalgia

Apesar do investimento de R$ 4,8 milhões e capacidade de receber até quatro mil crianças por dia, o local não tinha fins lucrativos. O objetivo do parque era angariar fundos para financiar o orfanato Lar da Criança Tamina Carvalho, de onde herdou o nome.

As principais atrações do local eram um toboágua de 22 metros, anunciado como o maior da Bahia; piscina olímpica com cascata; ‘nave espacial’ com simulador de realidade virtual; além de outros brinquedos, incluindo o icônico dinossauro que chamava a atenção de quem trafegava pela BR-324.

Mas não são apenas os brinquedos que ocupam as lembranças do estudante Vinícius Evangelista, 26. “Meu avô morava no CIA e a gente passava muito pela frente do parque. Lembro que ele brincava muito sobre me levar pro Tamina, lembro que lá na Ilha de São João, onde morava, era um passeio muito ‘uau’. E eu confirmei com meu pai que a lembrança era real, pois tenho imagens do meu avô que não sei se são verídicas ou sonho, pois ele morreu quando eu tinha seis anos. Sei que acabei guardando o Tamina Park num canto especial do coração por saber que ali tenho memórias reais com ele”, narra.

Os postos se invertem no caso do aposentado José Francisco dos Santos, 75, que levava os netos e outras crianças da rua para o passeio. Já o autônomo Henrique Silva, 31, fazia passeios gratuitos com a escola para o Tamina.

“Atendíamos inúmeros pedidos de instituições, organizações sem fins lucrativos, que pediam um dia para ficar com as crianças no parque, e eles iam, ficavam lá gratuitamente o dia inteiro. Também tinham projetos que eram realizados em parceria com escolas municipais e estaduais. Nestes programas, além de usarem toda a estrutura do Tamina, os jovens participavam de palestras sobre assuntos como gravidez na adolescência”, revela Augusto Almeida.

Com ingressos 30% mais baratos que o Wet e bem localizado para quem vinha do interior, o Tamina também ficou marcado por ser uma opção mais “favela” que “orla”. No auge, era necessário chegar cedo para garantir a entrada.

“Nos meses de outubro era normal a gente fechar o portão e não ter ingresso para vender. Então, muitos meninos ficavam infelizmente no portão lá chorando. Muitas vezes a gente acabava dando ingressos de graça para as crianças voltarem em outro dia”, diz Augusto.

Herdeiro

Após o fechamento em 2005, muitos brinquedos do Tamina Park foram realocados para o Rolf Park, outra atração sem fins lucrativos da Fundação José Carvalho. Localizado a 70 quilômetros de Salvador, em Pojuca, ele é voltado para o público das regiões de Feira de Santana e Alagoinhas, além da capital.

“É um espaço com muitas piscinas, toboáguas e restaurantes. O foco dele é mais ser um parque aquático, pois hoje as crianças se interessam menos por brinquedos mecânicos. Até mesmo os adultos, com esse calor, não tem melhor do que uma piscina para refrescar, curtir com o filho”, propagandeia Augusto.

Atualmente, o espaço está fechado e deve reabrir em setembro, na alta temporada.