O meteoro somos nós, as açucaradas memórias da aurora de minha vida

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  • Da Redação

Publicado em 17 de março de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Absoluta certeza, alguma voz suave me disse logo depois de eu nascer: - De amarga basta a vida, menino recém-chegado! Ouvi e captei. Pelo menos na infância, quando a barra já começa a pesar,  mas ainda não parece pesar tanto, procurei arrancar qualquer travo de amargor do meu caminho – embora – por circunstâncias as quais não quero mais falar a respeito – os dez primeiros anos de minha vida tenham sido devastadores. Ao perceber o fel ao redor, e com a frase que me disseram ao nascer marcada na mente, optei pelo doce – como não?

Fossem doces deliciosos, feitos com zelo e talento por minha mãe – ou, bem mais toscos, inventados por mim, atiçados por minha gulosa gula. Fiz bem. Entorpeci minha boca, minha mente e meu coração, e isso amenizou o peso do mundo selvagem ao redor – sempre selvagem, não importa a idade que se tenha. [Esses aditivos gastronômicos açucarados suavizaram sentimentos de tristeza profunda que marcaram com ferro em brasa a minha psique infantil – e ainda me dá gás para atravessar este rubicão cuja foz ainda não atingi – e vou demorar a atingir – sou duro na queda].

Dos dois ‘doces’  de minha lavra, me viciei no primeiro logo ao sair dos cueiros: empapava pão de sal com colheradas de manteiga,  temperadas com muito açúcar. O segundo eu demorei mais para inventar – o que só foi possível com o advento de velha geladeira Gelomatic, cuja maçaneta dava choques, no modesto lar doce lar dos Souza Menezes.

Fabricava picolés à minha maneira: misturava leite de vaca in natura, devidamente fervido pela zelosa matriarca, com muito açúcar e enfiava em fôrmas de metal no congelador. [Enquanto isso, em festas de aniversário enchia os bolsos de ‘beijos’ – (balinhas de coco ‘fetichizadas’ por embalagens em papéis coloridos com franjinhas!)]. 

Não precisava ser tão voraz. Dulcíssimo paraíso me esperava, concebido por minha mãe – artista multimídia, exímia confeiteira, costureira, bordadeira e cozinheira. Seriam tantos e tão eficazes na tarefa de adocicar a minha psique infantil em pane, que até o momento em que escrevo este texto, sinto os cheiros e sabores dessas iguarias – e essas memórias gastronômicas afetivas amenizam a minha angústia de viver vida provisória, sem queixumes e ‘mimimis’. [A propósito, todas as vidas são provisórias, diria o Conselheiro Acácio].

[Set list dos quindins de ‘minhamãeiá’: 1. Cocada branca. 2. Cocada mole. 3. Doce de leite, ou ambrosia. 4. ‘Creme’, era assim que a gente chamava lá em casa; tinha quem preferisse dizer ´manjar  branco. 5. Banana-real. 6. Fatia-de-parida, ou rabanada. 7. Pavê (aquele mesmo que que todo brasileiro perguntava se era ‘pavê ou pacomê’ antes de comer). O de minha mãe era especial. Por quê? Por que era feito por minha mãe, ora bolas!).

Com tanta gula, aos 10 anos pesava 4 arrobas. Fui rotulado de gorducho pela opinião pública nativa – e eu sofria com isso – mas viver é sofrer – e a vida seguiu sempre a galope – e o que passou, passou. A propósito: 1. ‘O inferno são os outros’. 2. O meteoro somos nós!