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Miro Palma
Publicado em 28 de setembro de 2016 às 05:00
- Atualizado há 3 anos
Conheci ela na escola. Essa frase pode até parecer romântica se você imaginar um jovem atlético. Mas eu era apenas um garoto cheio de energia que deixava meus pais de cabelos em pé. Eu fazia atividade física. Minha irmã fazia atividade física. Para todos os nossos colegas, ela estava lá, entre uma aula de Matemática e outra de Português. Nunca vou me esquecer do que aprendi naquelas aulas.Quando uns preferiam a prática do atletismo, vôlei, basquete, eu comecei a me apaixonar pelo futebol. Não éramos “galáticos”, mas ela não restringia ninguém por sua habilidade na atividade física. Quando uns se atiravam para o lado, outros trombavam no lado oposto. Não importava, naqueles minutos estávamos imersos nos conceitos e nos princípios passados pelo professor. Foi paixão à primeira vista. Não só pra mim, acho.Desculpe a brincadeira, a paródia do texto viral “Desculpe o transtorno, preciso falar da Clarice”, do colunista da Folha Gregório Duvivier é uma licença poética para mostrar que algo muito importante como a Educação Física na escola merece a mesma atenção – ou até mais – que foi dada à declaração de amor. Precisamos levar esse assunto a sério. Na última quinta-feira, o Ministério da Educação (MEC) divulgou um documento, em forma de medida provisória, enviado ao Congresso, com um plano de reforma para o ensino médio. Nele, as disciplinas de Educação Física, Artes, Filosofia e Sociologia deixam de ser obrigatórias. Fora o fato de o anúncio ter sido feito um mês depois de o Rio de Janeiro ter sediado os Jogos Olímpicos, a polêmica gerada pela exclusão da obrigatoriedade, principalmente da Educação Física e das Artes dos boletins dos alunos, merece a discussão. Tudo bem que o MEC voltou atrás nessa decisão. O secretário de Educação Básica do Ministério da Educação, Rossieli Soares, afirmou, no dia seguinte, que “não está decretado o fim de nenhum conteúdo, de nenhuma disciplina. [...] Todas elas serão obrigatórias na parte da Base Nacional Comum: Artes, Educação Física, Português, Matemática, Física, Química. A Base Nacional Comum será obrigatória a todos”. Mas a repercussão em torno dessa possibilidade, tanto as inúmeras críticas como, também, a comemoração por parte de alguns alunos, precisa de uma reflexão. Um estudo da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) apresentado este ano no Congresso Brasileiro de Cardiologia apontou que, nos últimos 30 anos, a obesidade triplicou entre crianças e adolescentes de 10 a 15 anos. Não é difícil encontrar crianças e adolescentes acima do peso. Só que isso não se resume a um problema estético, o sobrepeso traz também o alto risco de doenças cardiovasculares, hipertensão, diabetes, etc. Essa fórmula só se agrava se esses jovens se tornam adultos com os mesmos hábitos, podendo provocar infarto e acidente vascular cerebral (AVC) antes dos 40 anos. Em um cenário como esse, uma escola com Educação Física se torna ainda mais necessária. Nem sempre dentro de casa existe o estímulo para a atividade física. E com a invasão da tecnologia, conseguir que uma criança ou um adolescente se movimente se tornou uma tarefa árdua. Contudo, se isso é exigido na escola, até mesmo os mais resistentes podem descobrir os benefícios dos exercícios físicos. E esses benefícios não se restringem à saúde. Nas aulas de Educação Física aprendemos, também, valores como o trabalho em equipe, a competição justa, cooperação, disciplina, concentração e companheirismo, isso só pra citar alguns. E com um país que se encantou com os exemplos da Olimpíada do Rio, o estímulo ao esporte nas escolas através da Educação Física deveria ser um dos legados do evento. Miro Palma é subeditor de Esporte e escreve às quartas-feiras.>