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Quando o samba enredo da Bahia obteve o vice-campeonato do desfile das Escolas de 1950, no Carnaval do Rio, praticamente não existiam Escolas de Samba estruturadas na terrinha
Nelson Cadena
Publicado em 6 de setembro de 2024 às 05:00
Os cordões de isolamento da Avenida Presidente Vargas mal continham o público na sua empolgação carnavalesca, cenário de um desfile histórico, pela ousadia de uma Escola de Samba ao introduzir elementos da cultura afrodescendente. Protagonizado pela Aprendizes de Lucas, originária do subúrbio cortado pelos trilhos da Estrada de Ferro Leopoldina. O enredo, denominado Uma Festa na Igreja do Bonfim, classificou em segundo lugar no desfile das escolas associadas da Federação Brasileira das Escolas de Samba. Obteve dos jurados 290 pontos, com destaque nos quesitos Harmonia e Mestre-Sala, contra 320 do Império Serrano, tricampeã do Carnaval carioca naquele ano de 1950.
A Escola de Samba Aprendizes de Lucas, fundada em 1932, ostentavas as cores verde e branca na sua bandeira e tinha São Sebastião como seu padroeiro; rivalizava no mesmo subúrbio Leopoldinense com a Escola de Samba Unidos da Capela, exibia bandeira azul e branca e Nossa Senhora da Conceição como protetora. As duas escolas fundiram-se em 1966, e surgiu a União de Lucas.
O grande destaque do desfile exaltando a Bahia foi seu carro alegórico e as alas dos dançarinos do candomblé. Criação dos cenógrafos Otacílio Marques e Manoel Pinto, pai do Walter Pinto que revolucionou os teatros de revista no Brasil. O carro que abria o desfile mostrava o Elevador Lacerda e a Igreja do Bonfim com os sinos badalando. Baianas com pequenas igrejas na cabeça e bonecos brancos no colo, simbolizavam as mães pretas do tempo da escravidão. A segunda parte do cortejo representava uma festa de terreiro com Filhas de Santo dançando e cantando uma música-enredo da autoria de Joacir Santana.
Não achei registros desta música, assim como nenhuma foto do desfile da Escola Aprendizes de Lucas. Compreensível, já que o maior destaque, naqueles idos, ainda eram os desfiles das Grandes Sociedades (a rivalidade entre Tenentes do Diabo, Democráticos e Fenianos), desfiles de Ranchos e de Frevos. Joacir Santana, muitos anos depois compôs, em parceria com Silas de Oliveira, o samba enredo Glória e Graça da Bahia, tema do desfile da Escola Império Serrano, em 1966: “Bahia, Bahia/Terra do Salvador/Iaô, iaô, iaô/Gegê, nagô, gegê, nagô/Saravá, saravá/Yerê, yerê de abê ocutá/Em louvor à rainha do mar/Iemanjá, Iemanjá...”.
Quando o samba enredo da Bahia obteve o vice-campeonato do desfile das Escolas de 1950, no Carnaval do Rio, praticamente não existiam Escolas de Samba estruturadas na terrinha. O que de fato ocorre, a partir de meados da década de 1950, influenciadas pela apoteótica apresentação na cidade, em 1953, da Escola de Samba Estrelas do Mar, da capital do país. Ritmistas do Samba, da Preguiça, Filhos do Tororó, do Tororó, Juventude do Garcia, do Garcia e, já na década de 1960, Diplomatas de Amaralina, foram os principais protagonistas. As três últimas, polarizando as atrações da mídia e da torcida e disputando os prêmios da Sutursa, órgão de turismo da Prefeitura do Salvador.
Nelson Cadena é publicitário e jornalista, escreve às quintas-feiras