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Os mastodontes atacam

Grandes lotes na Orla deveriam dar lugar a projetos capazes de constituírem-se em ícones arquitetônicos

Publicado em 22 de setembro de 2025 às 09:22

Muito se fala em sustentabilidade urbana, cidades compactas, mescla nos usos do solo, mobilidade ativa, resiliência, aproximação, escala humana, qualidade de vida. São atributos que as cidades deveriam, em tese, buscar no presente, para tornarem-se habitats humanos de melhor qualidade.

Numa outra vertente, em diversas cidades do planeta, edifícios icônicos, tornam-se fatores de transformação e impulsionam o desenvolvimento urbano, constituindo-se em referências internacionais numa época em que as cidades – mais do que os países – assumem o protagonismo do desenvolvimento.

Salvador parece ir na contramão dessas tendências, com o seu tecido urbano cada vez mais marcado por construções de grande porte, desprovidas de qualquer valor arquitetônico, como se fossem galpões provisórios, de ocupação temporária, sem qualquer compromisso de natureza urbanística ou estética, mas de propósito duradouro.

Refiro-me aos “atacadões” – nova forma do comércio de abastecimento – que avançam celeremente sobre a cidade. Ocupam lotes extensos, com edificações de grandes volumes, construídas em pré-moldado e geradores de tráfego. Pintados em cores berrantes, violentam a paisagem urbana, agredindo o bom senso e desestruturando o comércio de bairro.

Começaram avançando sobre os bairros populares e as avenidas de vale. Protestei! Mas daí a admitir que esses mastodontes, como os chamei, ocupem literalmente a Orla Marítima da cidade, vai uma grande e intolerável provocação.

Já existia um desses mastodontes na praia de Piatã. Agora, quando é concluída a requalificação da Orla de Pituaçu/Jaguaripe, é outro deles um dos primeiros investimentos privados a acontecer na primeira quadra. Com se não bastasse, o ataque continua, com a implantação de uma outra unidade em frente à praia do Jardim de Alah.

Que estranhos marcos urbanos são esses que Salvador está replicando para afrontar seus habitantes e espantar seus visitantes?

Em uma cidade que se propõe turística, ao invés de resorts pé-na-areia, implantam-se atacadões pé-na-areia. Trata-se de uma disfunção inaceitável, pela inadequada localização e má utilização do solo urbano.

Reúnem todas as características necessárias para não estarem na borda marítima. E por que aí se instalam? A resposta remete à debilidade da economia urbana. Cidade pobre – o sabemos – será que Salvador sequer tem dinamismo econômico para que outras atividades busquem ocupar esses terrenos?

Pelo menos dois setores deveriam ser, obviamente, candidatos à ocupação dessas glebas na beira da praia: a indústria imobiliária e a hotelaria.

Grandes lotes na Orla deveriam dar lugar a projetos diferenciados, capazes de constituírem-se em ícones arquitetônicos, que se tornassem marcos de referência em Salvador, virando atrativos eles mesmos e contribuindo para uma cidade melhor. Mas não é o que acontece.

Como se pode explicar que o mercado imobiliário não veja, nesses lotes de grandes dimensões, a oportunidade para o desenvolvimento de bons projetos habitacionais? Em vez disto, o lobby é para construir espigões sombreando a praia.

Por outro lado, a ocupação da Orla com esses atacadões pé-na-areia, ao invés de resorts, constitui demonstração cabal e indiscutível da fragilidade do turismo como base da economia local. Estes sinais indicam que é preciso reestruturar as políticas públicas para o setor.

No momento em que se iniciam os trabalhos de revisão do PDDU, estes são temas que precisam ser postos em relevo. Arrisco-me a dizer que, mais importante do que a estrutura urbana, no presente, em Salvador, é o fortalecimento da economia urbana que deve presidir os trabalhos.

Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional. Autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento