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Quando o Natal deixou de ser mágico: minha experiência com a Dezembrite

O ano parece rápido demais e a vida, curta

Publicado em 14 de dezembro de 2025 às 05:00

Faz é tempo que o Natal não tem o mesmo brilho para mim. Quando os shoppings iniciam o movimento de decoração – e começa cada ano mais cedo – sinto o lampejo do desconforto. Árvores artificiais iluminadas, cheias de penduricalhos, corrida às compras, mesas fartas, presentes quase que por obrigação.

Em certos contextos, a figura do Papai Noel desafia valores ou ideologias predominantes (Imagem: Pixel-Shot | Shutterstock)
[Edicase]Em certos contextos, a figura do Papai Noel desafia valores ou ideologias predominantes (Imagem: Pixel-Shot | Shutterstock) Crédito: Imagem: Pixel-Shot | Shutterstock

A minha nora ama esse período e sente falta dos enfeites natalinos na nossa casa. Nem sempre foi assim... Quando criança, eu esperava ansiosamente a chegada do Papai Noel. Lutava contra o sono para ver o “bom velhinho” trazer o presente que tinha suplicado naquela cartinha. Era um misto de felicidade e aborrecimento acordar, na manhã seguinte, e constatar que fui “uma boa menina” e, mais um ano, não consegui ver como ele entrou no meu quarto.

Até o ano em que eu e uma prima vencemos o sono, ficamos deitadas na cama, de olhos fechados e bem acordadas, e vimos meu pai de cueca adentrando na ponta do pé, equilibrando nossos presentes entre as mãos. A decepção rapidamente se transformou em gratidão por aquele homem que, sem rena e trenó, fazia o impossível para realizar meus desejos.

Antes de ser mãe, foi em dezembro que fui atropelada por uma dor embrulhada para presente – surpresa e latente. A Dezembrite se instalou ali. Nos primeiros anos de vida dos meus filhos, eu ainda me esforçava para que eles vivessem a magia do Natal. Montava a árvore por eles, decorava a casa com pisca-pisca. Ensinei a colocarem o sapatinho na janela, a materializar os sonhos em palavras em um bilhete. Sempre gostei mais da representatividade do presépio. Os que tive eram pequenos, mas simbolizavam a grandiosidade do amor que Deus deposita ao redor das famílias.

E antes que me julguem, não tenho problema com o aniversariante. Dezembro é também meu aniversário. Mas, definitivamente, não é um mês fácil para mim. Para alguns é um mês luminoso, farto de convites para celebrar. Para mim - e acredito que para muitas pessoas - dezembro pesa. Pesa como mala no retorno da viagem que a gente demora para esvaziar. Nem devolvemos os itens ao guarda-roupa, e uma nova viagem está prestes a começar.

Dezembrite não é doença. É um estado emocional que faz o ano parecer rápido demais e, a vida, curta. A existência pisca e toda alegria pode se apagar. Basta um instante. É um mal estar silencioso. Você pode estar até sorrindo na foto da confraternização, mas por dentro sente-se ofuscada. Revisa as metas que ficaram pelo caminho, os sonhos que não couberam no calendário, os conflitos silenciados que não sararam, os vazios que continuam sem nome.

Para mim, dezembro não é mais sinônimo só de tristeza. É momento de balanço e reflexão. O que eu fiz desta fatia generosa de tempo? O que quero para os 365 novos dias? Olho para cada luzinha que pisca e o que vejo é reflexo, espelho do meu interior. Hoje corro do consumismo desenfreado; prefiro os desembrulhos internos para me caber melhor na vida que escolho. Arrumo guarda-roupa, armários da cozinha, faxino a casa, a alma. Dou o que já não me serve. Encaro as metas com mais honestidade. E humanidade.

Nem sempre dá para encerrar ciclos com fogos de artifício. A Dezembrite nos lembra que, em muitos momentos, viver cansa. E exige recolhimento. Acolhimento. Mesmo para quem termina o ano se sentindo o pó, olhar para dentro pode ajudar a perceber que, na essência, somos purpurina. Temos brilho até nos tempos mais difíceis. Então, respira fundo para virar a última página do ano, antes de escrever a próxima.

Fernanda Carvalho é jornalista, escritora, autora do Livro A Luz da Maternidade – Relatos de Parto sem Dor conduzidos por Gerson de Barros Mascarenhas