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Georgina Maynart
Publicado em 9 de junho de 2019 às 13:00
- Atualizado há 2 anos
Elas chegam a custar até 30% menos do que os peixes considerados nobres. Mas estão se consolidando como negócio promissor, a ponto de registrar um crescimento de produção médio de 11% ao ano no Brasil. Com tanta procura, a tilápia já é a espécie de peixe de água doce mais produzida no Brasil, e representa cerca de 55,4% da produção total de peixes do país, segundo dados do anuário de Peixe BR da Piscicultura, divulgado este mês.>
Na Bahia, a criação de tilápias também segue a tendência nacional. A produção cresceu 150% em 10 anos de acordo com dados da Bahia Pesca. Enquanto em 2009 eram produzidas 10 mil toneladas de tilápia por ano, em 2018 a marca ultrapassou as 24 mil toneladas anuais. Um volume de produção que garante ao estado o quarto lugar entre os cinco maiores produtores do país. A Bahia produziu mais de 24 mil toneladas de tilápias no ano passado. (Foto: Embrapa divulgação) Atualmente, mais de 4 mil produtores desta espécie de peixe atuam no estado. A maioria está concentrada no Sertão do São Francisco e no curso do Rio Paraguaçu, na região central do estado. O município de Glória, na região de Paulo Afonso, é considerado um dos maiores produtores de tilápia do Brasil.>
Considerada a queridinha da vez pelos produtores, a tilápia já representa 83% da produção da piscicultura baiana. As questões climáticas e estratégia de mercado estão entre os principais motivos para o crescimento expressivo do segmento no estado.>
“Se deve à disponibilidade hídrica; 45% do São Francisco corta a Bahia, que tem também grandes reservatórios. Além disso o Nordeste passou por uma grande seca nos últimos anos, e muitos produtores de outros estados migraram para cá para fugir dessa seca”, afirma Eduardo Rodrigues, presidente da Bahia Pesca, orgão de fomento à piscicultura no estado e que costuma oferecer cursos e treinamento para quem quer começar o negócio.>
Outro fator é a crescente procura por proteína animal. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação estima que aumente em até 16% a procura por este tipo de alimento até 2025.>
"O crescimento gera emprego e renda para os produtores, e ajuda toda a cadeia da tilapicultura, proporcionando um ambiente favorável à produção e atraindo ainda mais investimentos para o estado, criando um círculo virtuoso muito importante para nossa economia", completa Rodrigues. Criação de Tilápia em tanques-rede se espalha pela região da Bacia do Paraguaçu. Aquicultura Lago Dourado emprega 30 pessoas. ( Foto: Aquicultura Lago Dourado) Tilápia baiana>
As exportações de tilápias congeladas, refrigeradas ou frescas, renderam à balança comercial brasileira mais de US$ 5,5 milhões no ano passado, de acordo com o Ministério de Comércio Exterior e Serviços. Os produtores brasileiros exportaram mais de 400 mil toneladas, o equivalente a 6,67% da produção mundial. Existem no país cerca de 455 mil unidades de criação deste tipo de peixe. A maioria está concentrada na região Sul, mas tem crescido o número de criatórios nas outras regiões.>
Foi atento a este mercado promissor que o produtor rural Marcus Mascarenhas implantou há 9 anos uma aquicultura. A unidade de produção de tilápia foi instalada na Fazenda Lago Dourado, nas margens do Rio Paraguaçu, no Lago de Pedra do Cavalo, no trecho do município de Cabaceiras do Paraguaçu.>
O negócio começou como uma alternativa experimental para aumentar a renda da fazenda, antes voltada apenas para a criação de gado leiteiro e caprinos.O objetivo era aproveitar as condições climáticas consideradas ideias para a piscicultura, como a temperatura da água entre 25 e 30 graus. Quando a temperatura é muito baixa a tilápia não se desenvolve. Muitas vezes consumida assada e empanada, a tilápia é rica em nutrientes e substâncias como Omêga-3. (Foto: Guabi) De lá para cá, o piscicultor investiu cerca de R$ 3 milhões no negócio e na instalação dos tanques-rede. A produção aumentou de 13 para 60 toneladas por mês. A meta é atingir 100 toneladas mensais até o fim deste ano. A fazenda emprega atualmente 30 funcionários.>
A produção é integrada e conta com estratégias sustentáveis. A água usada no cultivo dos peixes é reaproveitada na irrigação do feno cultivado para os outros animais da fazenda. Já para melhorar a qualidade da água são usados probióticos, espécies de bactérias que consomem as fezes dos peixes. Além da tilápia inteira, a fazenda produz filés, postas e a tilápia espalmada.>
“Agora estamos nos preparando para inaugurar uma unidade para produção de salgados, como quibe, coxinha e bolinho de tilápia, além de hambúrguer e de linguiça. Estamos também em fase de implantação de uma fábrica de produção de farinha e óleo de peixe a partir das vísceras e carcaças. A próxima etapa é aproveitar o óleo para a produção de biodiesel, gerando resíduo quase zero”, completa o piscicultor. Criação moderna inclui reaproveitamento da água para irrigação em outras partes da fazenda. (Foto: Aquicultura Lago Dourado) Tecnologia>
As tilápias estão se destacando tanto no mercado que muitas empresas passaram a investir no segmento, e estão desenvolvendo linhas de produtos específicos para melhorar a produção deste tipo de peixe.>
As inovações envolvem desde técnicas na área de genética até a nutrição dos peixes. São tecnologias que fazem os animais crescerem mais rápido, produzirem mais carnes, pouca gordura e mais aminoácidos essenciais e minerais.>
Uma das novidades mais recentes é a linha de produtos da empresa Guabi, que usa microminerais orgânicos, com enzimas digestivas que ajudam a combater doenças. O pacote Gen, contém um blend de aditivos naturais que promete proteger os animais contra microtoxinas.>
“Essa é a aquacultura do futuro. A pesquisa desenvolveu enzimas que melhoram a digestão de vários nutrientes. Ou seja, desta maneira os animais aproveitam melhor a ração, crescem mais rapidamente, mais saudáveis e excretam menos, diminuindo os impactos ambientais”, afirma João Manoel Cordeiro Alves, gerente de produtos para Aquacultura da Guabi. Empresas usam ingredientes orgânicos na ração para melhorar qualidade da produção. (Foto: Guabi) Acreditando no potencial nordestino para produção de peixes, a empresa mantem dois centros de distribuição localizados na região.>
“As altas temperaturas no Nordeste são muito bem-vindas para a produção de tilápias. Apenas em algumas regiões passa dos limites, mas por períodos curtos. De maneira geral, a temperatura não é um problema para produzir tilápias no Nordeste brasileiro. Desde que haja água é possível produzir peixes e camarões. Mas quanto mais água de boa qualidade, mais baixo será o custo de produção. Há vários sistemas modernos de produção, que usam menos recursos naturais”, acrescenta Alves.>
Produção de Couro>
A tilápia está literalmente na moda. Muitos estilistas e artesãos passaram a usar a pele do peixe na montagem de bolsas, cintos, carteiras e sapatos. Além de serem de fácil manuseio, as peles são consideradas benéficas para o meio ambiente.>
“A pele de peixe, quando descartada de maneira incorreta, causa dano para o meio ambiente, porque geralmente as pessoas jogam no rio ou em qualquer outro lugar. Reutilizando, nós resolvemos o problema”, justifica a zootecnista Amanda Hock, autora de um manual de curtimento. Ela mantem o curtume Inpele junto com a família no interior de São Paulo. A empresa, com mais de 90 anos no mercado, inseriu a tilápia no portfólio há 15 anos.>
No Brasil, a pele de uma tilápia de um quilo chega a ser vendida por até R$ 7 a unidade. Já no mercado internacional, principalmente chinês, os preços variam de US$ 2 a US$ 4 .>
“A única dificuldade em utilizar a tilápia é que o descarne dela ainda é manual enquanto os outros peixes já possuem máquinas de descarne. Mas os produtores estão entendendo que é possível ganhar dinheiro com o reaproveitamento destas peles”, completa. Couro de uma tilápia de 1 kg chega a custar US$ 7 no mercado internacional. (Foto: Curtume Inpele) Tratamento para queimaduras>
No Ceará, desde 2017, as peles de tilápia ganham um outro destino. São direcionadas para um banco de pele do Instituto de Apoio ao Queimado (IAQ). A ação faz parte de um projeto mantido em parceria com a Universidade Federal do Ceará.>
O primeiro banco de pele animal do Brasil utiliza a pele de tilápia como curativo natural de queimados. Depois de esterilizadas, elas passam por um tratamento semelhante aos usados em bancos de pele humana. Segundo os pesquisadores, a pele do peixe é rica em proteína colágeno tipo 1, que ajuda a cicatrização.>
"A pele da tilápia faz exatamente o que gostaríamos, que é aderir ao leito da ferida, bloqueando essa ferida do meio externo e, com isso, evitando contaminação, além de evitar perda de líquido", revela o médico Edmar Maciel Lima Junior, coordenador da pesquisa.>
A técnica vem sendo aperfeiçoada, mas os cientistas brasileiros já garantiram a patente no Brasil e em outros países. Além de ajudar a diminuir a dor durante a recuperação, a técnica vem ajudando a reduzirem até 57% os custos nos tratamentos mantidos através do SUS.>