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Fernanda Varela
Publicado em 24 de dezembro de 2025 às 16:00
O Natal costuma ser associado a encontros, celebrações e afeto. Para muitas pessoas, porém, essa época do ano também escancara ausências e desperta uma dor silenciosa. Para quem vive o luto, seja recente ou não, as festas podem trazer lembranças intensas, emoções contraditórias e a sensação de não pertencer ao clima coletivo de alegria.>
Ceia de Natal
Segundo a psicóloga clínica e especialista em perdas e luto Nazaré Jacobucci, o Natal tem um peso simbólico importante porque reforça vínculos familiares e memórias afetivas. Quando alguém querido não está mais presente, a data pode se tornar especialmente difícil. A profissional lembra que, além das perdas já vividas, há também famílias que enfrentam mortes justamente nesse período, o que torna o impacto ainda mais delicado.>
De acordo com Nazaré, é comum que pessoas enlutadas se sintam confusas e sobrecarregadas emocionalmente, sem saber como agir, o que sentir ou se conseguirão atravessar as exigências sociais impostas pelas festas de fim de ano. Familiares e amigos também costumam ter dúvidas sobre como apoiar, com receio de dizer algo inadequado ou aumentar o sofrimento.>
Para quem está vivendo o luto, a psicóloga reforça que não existe uma forma certa ou errada de sentir. Cada pessoa reage à perda de maneira única, e o processo não segue um roteiro fixo. Um dos primeiros passos, segundo ela, é aceitar que nem sempre será possível estar bem. O enlutado não precisa corresponder às expectativas de produtividade, alegria ou participação em todos os eventos. Fazer apenas o que for possível já é suficiente.>
Outro ponto importante é o autocuidado. O período de festas favorece excessos, especialmente com alimentação e consumo de álcool, mas o uso dessas estratégias como fuga da dor tende a trazer apenas alívio momentâneo. Manter uma rotina mínima de sono, alimentação e pequenos momentos ao ar livre pode ajudar a atravessar os dias com mais equilíbrio.>
Nazaré destaca ainda a importância de permitir a dor. Sentir tristeza em meio a um ambiente festivo não é sinal de fraqueza, mas uma resposta natural à ruptura de um vínculo significativo. Falar sobre emoções, compartilhar lembranças e reconhecer sentimentos como apatia ou desânimo faz parte do processo. O enlutado não tem a obrigação de esconder sua dor para preservar o bem-estar de outras pessoas.>
Dizer não também é um direito. Recusar convites ou adaptar planos às próprias necessidades é uma forma de cuidado. A psicóloga sugere, inclusive, a criação de rituais simbólicos para lembrar quem partiu, como reservar um momento específico para recordar a pessoa ou até reinventar tradições familiares. Mudar o local da ceia ou optar por um encontro mais simples pode tornar o Natal mais suportável.>
Mesmo em meio ao sofrimento, momentos de leveza podem surgir, e eles não anulam o luto. Sorrir ou sentir alegria por instantes não significa desrespeitar a memória de quem morreu. Para Nazaré, permitir esses momentos é parte da adaptação emocional. A prática da gratidão também pode ajudar a equilibrar a percepção da vida, sem apagar a dor. Pequenos gestos, uma lembrança afetuosa ou uma experiência simples podem trazer algum conforto.>
Para familiares e amigos, a principal orientação é a empatia. A psicóloga ressalta que gestos práticos, como ajudar com tarefas do dia a dia ou convidar o enlutado para um encontro mais acolhedor, podem fazer diferença. Mais do que encontrar palavras perfeitas, estar disponível para ouvir é fundamental. Evitar o contato por medo de não saber o que dizer pode aumentar o isolamento de quem já está sofrendo.>
Nazaré Jacobucci lembra que o Natal nunca mais será exatamente o mesmo após uma perda significativa. Compreender as emoções despertadas por essas datas e buscar uma reorganização emocional faz parte do caminho do luto. A ausência de quem partiu precisa ser assimilada ao mesmo tempo em que se preservam os vínculos com aqueles que seguem presentes, permitindo que novas formas de viver essas celebrações sejam construídas com o tempo.>