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Roberto Midlej
Publicado em 19 de abril de 2023 às 10:10
Parece lenda, mas o fotógrafo Anízio Carvalho, hoje com 93 anos, garante que é verdade: numa madrugada de 1964, ele acordou com um mau pressentimento e desceu o Elevador Lacerda com sua inseparável câmera Rolleiflex. Saiu do elevador e, quando andava pela rua, alguém o parou e perguntou: “Está indo fotografar o incêncio da Feira de Água de Meninos?”. Ele, que não sabia de nada, disse: “Sim estou indo”. E lá tirou a foto que ilustra esta página. >
A foto dessa experiência meio sobrenatural é uma das 46 imagens que estão na exposição Ginga Nagô, somente com fotos de Anízio. A mostra será inaugurada hoje, às 10h, com entrada gratuita, no Museu da ABI - Associação Baiana de Imprensa. A curadoria é do fotojornalista Manu Dias, que já passou por vários jornais e hoje coordena o setor de fotografia da Secretaria de Comunicação do Estado.Manu Dias diz que a ideia da exposição de Anízio partiu da ABI, que pretende realizar em breve mostras de outros fotojornalistas. “Achamos importante homenagear as pessoas em vida e decidimos começar pelo fotógrafo mais velho, que é Anízio”, revela o curador.>
Na exposição, há imagens históricas como a visita de Bobby Kennedy (1925-1968) à Bahia, em 1965, ou os flagras de policiais militares batendo em estudantes durante a ditadura militar. >
Há também imagens importantes do candomblé, como o encontro entre Carybé e Mãe Menininha.>
“O candomblé é a religião de Anízio. Então, tem um documento muito bem realizado de mães e pais de santo”, diz Manu. >
Todas as imagens da exposição são em preto e branco. Originalmente, são fotos quadradas, como a Rolleiflex permitia. Mas, às vezes, Anízio dava um corte horizontal.>
Manu diz que algumas imagens, mesmo que não estivessem em ótimas condições de conservação, precisavam estar na exposição, como a da Feira de Água de Meninos, pela importância histórica. Em alguns casos, foi o próprio curador que fez o tratamento das fotos.>
Manu destaca a importância de trabalhos como os de Anízio para a memória da Bahia e diz que o próximo passo é buscar financiamento para a preservação e recuperação do acervo. Ele destaca também o trabalho de Valter Lesa, da mesma geração de Anízio, e que deve ganhar uma exposição em breve.>
Anízio de Carvalho
Desde os 10 anos de idade, Anízio Circuncisão de Carvalho, nascido em Conceição de Feira, recortava imagens que encontrava nos papéis de jornais e revistas e as guardava. >
Aos 14 anos, trabalhava como pedreiro com o pai, mas aquele não era seu sonho. Disse ao pai então que queria sair de casa. Mas, para isso, lhe foi imposta uma condição:>
“Ele me disse que eu só viria para Salvador se tivesse como me sustentar e ser alguém aqui”, disse Anízio à repórter Emilly Olveira, no CORREIO, em setembro do ano passado.>
Na capital baiana, foi trabalhar como doméstico para a família do fotógrafo Leão Rosemberg. Foi aí que surgiu a oportunidade de trabalhar na fotografia. Não demorou e, em 1957, foi para o Jornal da Bahia, hoje extinto.>
“Trabalhei com Valter Lessa, Domingos Cavalcanti, Aristides Baptista e outros grandes da área”, lembra Anízio, que é casado com Tereza e tem seis filhos.>
Apesar dos 93 anos e com a saúde debilitada, Anízio está lúcido e, segundo Manu Dias, tem uma memória invejável. Hoje, o veterano toma oito remédios para controlar a pressão, aliviar dores na coluna e ajudar a dormir.>
SERVIÇO - Exposição sobre a trajetória de Anízio Carvalho | a partir de quarta (19), 10h, no Museu de Imprensa da ABI (Térreo do Edifício Ranulfo Oliveira (Rua Guedes de Brito, 1 – Praça da Sé) | Gratuito >