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Júri simulado reconta trajetória das mulheres na independência

Defensoria Pública apresentou defesas de Joana Angélica, Maria Quitéria e Maria Felipa, acusadas de crime contra a coroa portuguesa em 1823

  • Foto do(a) author(a) Wendel de Novais
  • Wendel de Novais

Publicado em 7 de julho de 2023 às 05:00

A defensora Letícia de Almeida Peçanha representou Maria Felipa no júri Crédito: Arisson Marinho/CORREIO

Antes de serem reconhecidas como as heroínas da Independência do Brasil na Bahia, Joana Angélica, Maria Quitéria e Maria Felipa de Oliveira foram acusadas pelo crime de traição à coroa a portuguesa, em 1823. Nesta quinta-feira (06), durante o júri-simulado da Defensoria Pública do Estado da Bahia, as três tiveram direito à ampla defesa, na presença dos estudantes da escola da DPE-BA, que integra a rede estadual de ensino, e da Escola de Direito da Universidade Federal da Bahia (Ufba), local que sediou o julgamento das heroínas.

Cada uma dessas três mulheres foi representada por uma defensora pública que, em frente a um júri formado por sete das pessoas presentes, sorteadas na hora, puderam recontar as suas histórias muitas vezes apagadas da memória da Independência.

Os detalhes chamaram a atenção de Hana Silva, 17 anos, estudante do Colégio Deputado Manoel Novais. Ela começou a assistir à ação conhecendo muito bem a figura das três heroínas, mas teve acesso a informações que, até então, desconhecia:

"De pouquinho em pouquinho, a gente vai criando a visão de que existiam mulheres heroicas por trás de uma independência contada tantas vezes por homens. Mais do que conhecer os feitos delas, hoje eu vi uma visão diferente. Além do sentido heroico, deu para entender o interesse e o que as moveu para lutar", afirmou Hana, que foi acompanhar o júri-simulado ao lado de colegas e professores, que também aprenderam mais sobre as três personagens.

Se para quem estava na plateia o júri foi uma revelação, as pessoas sorteadas para compor o júri tiveram uma experiência duplamente especial. Foi o caso de Gabriela Miranda, 19, estudante do primeiro semestre de Direito da Ufba. "Além de lembrar o que já conhecia, pude entender as circunstâncias das histórias de protagonismo não só feminino, mas também negro. São coisas apagadas, que voltam a ser apresentadas e ser contadas", disse.

"Eu já tinha um arcabouço sobre isso, mas aqui eu pude vê-las como pessoas por trás das heroínas", completou Gabriela, que teve o papel de anunciar o veredicto do júri, com a absolvição das três heroínas do crime de traidoras da coroa portuguesa. Cada uma por seus motivos, foi fiel à Bahia e ao Brasil independente.

Júri ocorreu na Escola Direito da Ufba, com alunos de escolas públicas e da instituição Crédito: Arisson Marinho/CORREIO

Feitos heroicos

Antes do júri simulado 200 anos depois, os registros históricos dos feitos de Felipa, Quitéria e da mártir Joana Angélica já as havia absolvido. No caso de Maria Felipa, esses registros não se limitam aos documentos e provas materiais de sua presença nas lutas em Itaparica, mas estão ancorados também na oralidade, que lembra quando ela ajudou a impedir que os suprimentos para as tropas portuguesas aquarteladas em Salvador chegassem até o exército inimigo.

Defensora responsável por representar a heroína, Letícia de Almeida Peçanha se sentiu honrada pelo desafio de provar a importância de Felipa, orgulho de Itaparica e da Bahia. "Sendo uma mulher negra, sei que muito da nossa ancestralidade e da nossa história é negada. Ela é mais uma das guerreiras que são desconhecidas. Essa é uma oportunidade de mostrar que ela existiu e que existe através da oralidade, de mim e de tantas outras mulheres negras", declarou Letícia.

O júri simulado era uma atividade extra-curricular da Escola de Direito, sem obrigatoriedade de presença. Mesmo assim, Tainá Marinho, 21, estudante do quarto semestre, fez questão de comparecer. "É uma abordagem diferente, já que remonta a um caso histórico e estamos acostumados a júris de questões mais atuais. Não tinha aula, mas vim para ver a história além do comum, de forma específica e aprofundada", opinou.

Educação em direitos

Defensora geral, Firmiane Venâncio também esteve presente no júri Crédito: Arisson Marinho/CORREIO

A experiência proporcionada aos presentes garantiu dois objetivos: fazer uma memória educativa dos feitos de Joana Angélica, Maria Quitéria e Maria Felipa, e dar o direito de ampla defesa para as três heroínas, explicou a defensora Fernanda Morais, idealizadora do tema em discussão pelo projeto, que é batizado como Júri Simulado - Releitura da História no Direito.

"O projeto concede direito a julgamento justo com ampla defesa e promove educação em direitos humanos. Isso passa pelo reconhecimento da nossa história, do que nos fez chegar aqui. Quando trazemos as três a julgamento, partimos da premissa de que elas são reconhecidas hoje, mas que, na época, foram questionadas", lembra.

No Brasil como um todo, o que ainda resiste como símbolo da independência é o grito de 'Indepedência ou Morte', dado por Dom Pedro de Alcântara, em 7 de setembro de 1822, um ano antes das tropas portuguesas serem derrotadas na Bahia, o que consolidou o início do processo de libertação do Brasil da sua antiga metrópole. Após a Independência, Pedro de Alcântara, que na época era príncipe regente em nome da coroa portuguesa, foi coroado D. Pedro I, imperador do Brasil.

"Depois de muito tempo é que a gente consegue posicioná-las [as heroínas baianas] de maneira adequada, como responsáveis por garantir a independência de uma vez por todas. Nossa ideia é mostrar como funciona um julgamento, falando de direitos fundamentais e ampla defesa; e contar a nossa história, que é tão fundamental", completou Fernanda Morais.

Defensora geral, Firmiane Venâncio também esteve presente no júri e destacou como o projeto reforça um dos importantes papéis da Defensoria junto à sociedade. "A Defensoria tem uma função de promoção dos direitos humanos. E promover isso é, sobretudo, conhecer a história das pessoas que construíram o sistema democrático. De forma estratégica e criativa, levamos esse conhecimento dentro de uma estrutura também centenária, como o júri", fala.

Essa é a 11ª edição do projeto Júri Simulado - Releitura da História no Direito. Nas edições anteriores, Zumbi dos Palmares, Luísa Mahin e a Lei Áurea foram alguns dos temas colocados em pauta.