ENTENDA

Projeto de lei busca licença menstrual de até três dias para mulheres na Bahia

Solicitação contempla apenas servidoras públicas

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  • Maysa Polcri

Publicado em 30 de abril de 2024 às 06:00

Mulheres lutam para conseguir licença em casos de sintomas graves durante menstruação
Mulheres lutam para conseguir licença em casos de sintomas graves durante menstruação Crédito: Shutterstock

“Já fui trabalhar sentindo dores muito intensas por causa da menstruação. Não faltei por medo, nenhum chefe iria entender o que é passar por isso”. O relato é da publicitária Carol Campos, 23, que tem adenomiose, doença que causa fluxo menstrual intenso e cólicas severas. Para evitar que mulheres como ela tenham que trabalhar sentindo fortes dores, um projeto de lei que tramita na Assembleia Legislativa da Bahia (Alba) prevê a licença menstrual de três dias consecutivos para servidoras públicas.

Se aprovado, o Projeto de Lei 25.275/2024 vai alterar o Estatuto do Servidor Público da Bahia, ao garantir licença de até três dias seguidos, todos os meses, às funcionárias públicas que comprovarem sintomas graves associados ao fluxo menstrual. A proposta foi encaminhada para a Comissão de Constituição e Justiça da Alba no dia 10 de abril, e não há prazo para ser analisada pelos deputados. Não há limite máximo para que isso ocorra.

O médico Alexandre Amaral, especialista em cirurgia ginecológica minimamente invasiva, explica que os principais sintomas são aumento do fluxo menstrual e dor uterina aguda e latejante. Vômitos, enxaquecas e desmaios também podem acontecer. É comum que as pacientes que tenham dores fortes sejam diagnosticadas com doenças, por isso, cada caso deve ser investigado individualmente. 

“Sentir dor incapacitante não é normal. Os sintomas relacionados ao fluxo menstrual costumam estar associados a doenças como endometriose e adenomiose, que causam dor do tipo cólica”, explica o médico. As condições estão relacionadas ao crescimento anormal do endométrio, o tecido que reveste o interior do útero. “Já as pacientes com miomas uterinos [tumores benignos] não costumam sentir dores, mas a condição causa sangramento intenso”, completa.

O avanço da discussão sobre saúde menstrual é comemorado por mulheres que sofrem desde as primeiras menstruações com sintomas graves. “Eu já sofri muito com essas dores, cheguei a desmaiar no colégio quando era mais nova. Depois que coloquei o DIU [dispositivo intrauterino], melhorou, mas não completamente”, conta Carol Campos.

O DIU é um método contraceptivo introduzido dentro da cavidade do útero e que auxilia no controle e diminuição de cólicas menstruais. Ele libera hormônios que impedem que espermatozoides fertilizem os óvulos e, assim, evita a gravidez. “Esse projeto de lei é muito importante e vai ser muito bom se entrar em prática. Minha mãe é servidora pública, tem endometriose e sofre até hoje quando precisa trabalhar sentindo dor”, diz a publicitária.

A menstruação é tratada como uma “relevante questão de saúde pública” no PL 25.275/2024, de autoria da deputada estadual Fátima Nunes (PT). “[...] Garantir que essas mulheres tenham o direito de se ausentar do trabalho quando necessário, sem o receio de sofrerem quaisquer sanções administrativas. É essa a finalidade do presente Projeto de Lei, que visa dar suporte a essa parcela da população ”, pontua o projeto. Não há menção a outras pessoas que menstruam, a exemplo de transgêneros. 

Em março deste ano, o Distrito Federal aprovou uma lei semelhante, que garante a licença de até três dias mediante atestado médico. Essa já é uma realidade em países como Japão, Taiwan e Indonésia. A Espanha foi o primeiro país da Europa a autorizar a licença menstrual, em fevereiro de 2023.

Por outro lado, existe o receio de que a medida, caso aprovada, tenha efeito contrário: dificulte a permanência de mulheres no mercado de trabalho. "As mulheres já enfrentam batalhas para entrar e permanecer no mercado de trabalho por conta das desigualdades de gênero. A licença pode aumentar o preconceito de alguma forma, mas precisamos enfrentar esse tabu através de uma mobilização que conscientize as empresas e os funcionários para que as mulheres não sejam prejudicadas", analisa Darlane Andrade, pesquisadora do  Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher da Universidade Federal da Bahia (Neim/Ufba).